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Rodrigo Vianna: Folha diz que fumou mas não tragou a “ditabranda”

A presença de Dilma na festa (?!) da Folha foi o aspecto mais comentado pelos internautas nas observações sobre o aniversário de 90 anos do jornal. Eu estava em Buenos Aires, e lá a notícia foi outra. Numa nota de pé de página, o jornal La Nacion trouxe, na terça-feira, informação de que desconfiei a princípio: Folha admite que apoiou a ditadura.

Por Rodrigo Vianna, no blog Escrevinhador

Achei que os argentinos não tinham entendido direito o assunto, até porque a nota fazia referência também ao fato de a Folha chamar a ditadura de “ditabranda”… Mas leio no blog do Eduardo Guimarães que a Folha admitiu mesmo o apoio à ditadura.

Admitiu daquele jeito dela. Disse que apoiou o golpe (mas, veja bem, quase toda grande imprensa apoiou)… Disse que carros do jornal “teriam” sido usados por agentes da repressão (mas, veja bem, “a direção da Folha sempre negou ter conhecimento do uso de seus carros para tais fins”).

A Folha lembrou-me um pouco o Bill Clinton, ao ser perguntado se tinha experimentado maconha na juventude: “sim, fumei, mas não traguei”. Ou, pra ser mais escrachado, a Folha lembrou-me da frase do roqueiro Lobão, que meus filhos adolescentes adoram citar: “peidei, mas não fui eu”.

Melhor não dizer mais nada. Fiquem com a narrativa “oficial” publicada pelo jornal.

A Folha apoiou o golpe militar de 1964, como praticamente toda a grande imprensa brasileira. Não participou da conspiração contra o presidente João Goulart, como fez o Estado (de S. Paulo), mas apoiou editorialmente a ditadura, limitando-se a veicular críticas raras e pontuais.

Confrontado por manifestações de rua e pela deflagração de guerrilhas urbanas, o regime endureceu ainda mais em dezembro de 1968, com a decretação do AI-5. O jornal submeteu-se à censura, acatando as proibições, ao contrário do que fizeram o Estado, a revista Veja e o carioca Jornal do Brasil, que não aceitaram a imposição e enfrentaram a censura prévia, denunciando com artifícios editoriais a ação dos censores.

As tensões características dos chamados “anos de chumbo” marcaram esta fase do Grupo Folha. A partir de 1969, a Folha da Tarde alinhou-se ao esquema de repressão à luta armada, publicando manchetes que exaltavam as operações militares.

A entrega da Redação da Folha da Tarde a jornalistas entusiasmados com a linha dura militar (vários deles eram policiais) foi uma reação da empresa à atuação clandestina, na Redação, de militantes da ALN (Ação Libertadora Nacional), de Carlos Marighella, um dos ‘terroristas’ mais procurados do país, morto em São Paulo no final de 1969.

Em 1971, a ALN incendiou três veículos do jornal e ameaçou assassinar seus proprietários. Os atentados seriam uma reação ao apoio da Folha da Tarde à repressão contra a luta armada.

Segundo relato depois divulgado por militantes presos na época, caminhonetes de entrega do jornal teriam sido usadas por agentes da repressão, para acompanhar sob disfarce a movimentação de guerrilheiros. A direção da Folha sempre negou ter conhecimento do uso de seus carros para tais fins.