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Estatuto da Igualdade Racial reacende debate sobre cotas 

Com a nova lei em vigor, o Executivo poderá criar sistema de cotas por meio de medida administrativa, o que provoca controvérsia no Congresso. Segundo ONG, quase 67% das instituições públicas de ensino superior do país já adotam políticas de inclusão.

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O Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/10), que entrou em vigor nesta quarta-feira (20), reacende a polêmica em torno das políticas de cotas. Um dos pontos mais discutidos da nova lei é o que obriga o governo federal a adotar ações afirmativas, sem a necessidade de passar pelo Legislativo.

Desde junho o ministro da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Eloi Ferreira de Araujo, manifesta a intenção de instituir sistemas de cotas por meio de medida administrativa. A iniciativa já encontra resistência no Congresso.

O senador Demóstenes Torres (DEM-GO), relator no Senado do Projeto de Lei 73/99, que institui cotas sociais e raciais nas universidades federais, sustenta que a adoção dessa política por meio administrativo representa uma ofensa ao Legislativo.

Contrário às cotas raciais, o DEM já ajuizou três ações no Supremo Tribunal Federal questionando a constitucionalidade dessas medidas. De acordo com o DEM, a discriminação positiva de negros "promove a ofensa arbitrária ao princípio da igualdade", além de instituir o "racismo de Estado" na sociedade brasileira.

Já o deputado Carlos Abicalil (PT-MT), que relatou o PL 73/99 na Câmara, afirma que a resistência à adoção de cotas decorre "sobretudo do preconceito e do fato de que políticas de inclusão alteram privilégios de determinadas categorias".

O diretor-executivo da Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), Frei David Raimundo Santos, defende que a iniciativa parta do Executivo. Para ele, ao aprovar o Estatuto da Igualdade Racial, deputados e senadores abriram mão de decidir sobre ações afirmativas.

O estatuto criou o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), responsável pelas ações afirmativas. Os estados, o Distrito Federal e os municípios podem aderir ao sistema. "A partir de agora, qualquer prefeito do Brasil por criar política de cotas", comemora Frei David.

Bônus

Apesar da controvérsia, a adoção de ações afirmativas já é uma realidade consolidada no País. Levantamento da Educafro mostra que 158 (66,9%) das 236 instituições públicas de ensino superior (Censo 2008) contam com algum tipo de política de inclusão. Saiba como está a política de cotas em cada estado brasileiro.

A maioria das instituições, 32,9%, utiliza a modalidade de bônus social e racial. É o caso, por exemplo, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que adiciona 30 pontos à nota de alunos egressos da rede pública. Caso esse candidato também se declare preto, pardo ou indígena, recebe 10 pontos adicionais.

De acordo com o coordenador-executivo da Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp, Renato Hyuda de Luna Pedrosa, o método tem apresentado bons resultados. Segundo ele, o percentual de alunos de escolas públicas aumentou de 29% para 32% nos cinco primeiros anos de adoção da medida (de 2005 a 2009), enquanto o de pretos e pardos passou de 11% para 15%.

Nos cursos de maior prestígio, como Medicina, Engenharias e Ciências Econômicas, o impacto foi ainda maior, conforme o coordenador. Em Medicina, a participação de estudantes da rede pública chegou a 30% – cinco anos antes era de 10%. Quanto a pretos e pardos, passou de 6% para 14%.

Cotas

A segunda modalidade de inclusão mais adotada pelas instituições é a de cotas raciais e sociais, usada por 31% delas. No Rio de Janeiro, o sistema foi instituído por lei estadual e é obrigatório em todas as instituições mantidas pelo estado.

A lei fluminense destina 20% das vagas a alunos de escola pública, 20% a negros e 5% a portadores de deficiência, indígenas e filhos de policiais mortos em serviço. Os beneficiários precisam ainda comprovar renda familiar mensal de até R$ 630 por pessoa.

Em terceiro lugar na preferência das instituições estão as cotas sociais, instituídas em 17,7% das instituições públicas de ensino superior. Foi a modalidade escolhida pela Universidade Federal Fluminense (UFF), que destina 20% das vagas a alunos de escola pública.

Críticas

Para Frei David, as cotas sociais, quando desassociadas da questão racial, tiveram efeito contrário ao esperado. Segundo ele, na UFF, "de cada dez cotistas, nove são brancos de classe média".

O mesmo problema teria ocorrido na Universidade de São Paulo (USP). A instituição aumenta, de 3% a 12%, a nota do vestibular dos candidatos do ensino público. Mas, de acordo com Frei David, o número de brancos pobres e de negros na universidade diminuiu. "O reitor já decidiu, inclusive, criar uma comissão para mudar o método", adiantou.

As instituições que decidiram usar apenas cotas raciais representam 13,3% do total. Uma delas é a Universidade de Brasília (UnB), que destina 20% das vagas a negros e 10 vagas para indígenas.

Fonte: Câmara dos Deputados