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Sangria de Serra põe tucanos e mídia em estado de alerta

Ainda que tarde a anunciar publicamente sua candidatura à Presidência da República, o governador José Serra (PSDB-SP) segue em movimentação, junto a seu partido, para viabilizar uma campanha competitiva contra a ministra da Casa Civil e pré-candidata petista, Dilma Rousseff. Não faltam temores entre os aliados serristas, que já admitem Dilma como favorita na disputa para suceder o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Por André Cintra

Nos veículos da grande mídia — todos favoráveis a Serra, mas atordoados com a tática eleitoral do tucano —, circulam cada vez mais notícias sobre os bastidores da campanha oposicionista. A abordagem não esconde uma e outra preocupação.

O sempre rabugento Gaudêncio Torquato dá sua bronca na página 2 (a mais conservadora) de O Estado de S.Paulo: “Os olhos de Serra parecem embaçados por densa fumaça pré-eleitoral, que o tem deixado entre a cruz e a caldeirinha, na dúvida entre manter a tática defensiva, prevenindo-se contra a derrota, ou ir logo à ofensiva e, assim, evitar aproximação do adversário. Hesitar, como se sabe, é um grave erro na guerra. Guerreiro bom vence combates não cometendo erros”.

Da leitura de Toquato, depreende-se que, não bastassem os “olhos embaçados”, Serra fatalmente sofrerá com sua desastrosa imagem pessoal, que vai além da falta de carisma. Há todo um jeito esnobe em Serra que talvez Machado de Assim definiria de “fumos fidalgos”, como fez ao caracterizar seu Dom Casmurro. Mas Gaudêncio Torquato e o Estadão são mais explícitos: “O jeitão professoral do governador não ajuda. Não passa emoção. Apesar da sólida argumentação que fundamenta seus pontos de vista, ele parece o mestre que não gosta de ser contrariado”.

Tem mais: “A índole serrista é pouco afeita ao chiste. Sua comunicação é descendente, dele para os outros. Projeta a estampa de São Paulo, estado com a maior força eleitoral e poderio econômico. Ao lado da imagem de fortaleza inexpugnável, São Paulo passa também a ideia de cadeira presidencial perpétua. Posição bastante questionada”.

“Candidato clandestino”

A chiadeira do Estadão vaza para a página 3 — reservada aos editoriais afinadíssimos à fina flor do conservadorismo. Enfileira-se ali um bom punhado de recados do jornal ao governador paulista. “É sabido que Serra quer ser presidente desde criancinha. Mas a relutância em assumir a sua legítima aspiração, pela qual trabalha em surdina, já faz com que se diga que ele não tem medo do poder — tem medo do voto”, provoca o editorial.

“Por enquanto não há quem entenda o que ele tem a ganhar se comportando como candidato clandestino — que apenas em conversas reservadas admite a candidatura, revelando aos privilegiados interlocutores o mais clamoroso segredo de polichinelo da sucessão presidencial”, acrescenta o Estadão, que ainda empareda Serra: “A esta altura, ou ele disputa o Planalto ou sai da vida pública”.

O leitor tucano que passar para O Globo tampouco terá alívio. Merval Pereira, em sua coluna, avisa que a candidatura Dilma, além de ter mais apelo social, pode ter também a preferência do mercado. O motivo da preocupação atenderia pelo nome de Henrique Meirelles, presidente do Banco Central. Segundo o colunista de O Globo, Meirelles “vem mandando sinais aos investidores internacionais sobre ‘o risco Serra’”.

Na coluna “Panorama Político”, mais drama: “A oposição está tensa com os últimos movimentos no entorno do governador Aécio Neves. Avaliam que não são espontâneas manifestações como as de que Minas não ficará a reboque de São Paulo ou da claque gritando ‘Aécio presidente’. Os aliados do mineiro reiteram que ele se retirou da sucessão. Mas líderes da oposição interpretam os últimos fatos como uma tentativa para empurrar José Serra para fora do tatame presidencial”.

Força-tarefa

É preciso passar pelas páginas da Folha de S.Paulo para ter algum alívio ante tamanhas adversidades. “O PSDB de São Paulo decidiu antecipar, para o fim deste mês, as inserções na TV que seriam em junho. No último Datafolha, o tucano caiu de 41% para 38% na Região Sudeste, enquanto Dilma subiu de 19% para 24%”, registra a Folha. “Essa mobilização serviria de antídoto para o impacto das enchentes no estado e para as crises enfrentadas pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), como o anúncio do aumento do IPTU e das tarifas de ônibus e a recente cassação (atualmente suspensa).”

O jornal paulista informa que a prioridade das prioridades tucanas é impedir que a candidatura Serra se desidrate em seu principal reduto — São Paulo. É justamente no estado governado desde 1995 pelo PSDB que o staff serrista preparou uma “força-tarefa” para “estancar a queda do potencial candidato” e “fazê-lo superar Dilma em até 4 milhões de votos”. A missão ficará a cargo de um grupo de 47 coordenadores regionais.

Uma revista semanal divulga uma meta mais ambiciosa: “A intenção dos tucanos é conseguir, em outubro, uma frente acima de 5 milhões de votos sobre Dilma em território paulista. Eles fazem esse cálculo com base no resultado eleitoral do primeiro turno de 2006. Há quatro anos, Geraldo Alckmin (PSDB) obteve 11,9 milhões de votos em São Paulo. Lula ficou com 8 milhões. Agora, como Dilma não é Lula e não tem uma história política no estado, a expectativa do PSDB é ampliar essa distância sobre o PT na sucessão presidencial deste ano”.

Milhão a milhão pode até fazer uma eleição. Mas a ousada conta do tucanato omite que nas mesmas eleições 2006, depois que o golpismo da mídia foi esvaziado, a vantagem do presidenciável do PSDB despencou. No 2º turno, Alckmin encolheu, Lula se recuperou, e a dianteira foi reduzida para pouco mais de 1 milhão de votos. Seja como for, os tucanos já fazem suas as palavras de Janio de Freitas na Folha deste domingo (7): “Se candidato, José Serra terá muito trabalho para reverter os males de sua tática até aqui.”