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Renato Rabelo: estratégia para 2010 é o caminho do plebiscito

Em reunião do Comitê Central realizada neste final de semana em São Paulo, o presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, fez uma detalhada análise da conjuntura nacional e internacional e apontou os desafios que estão postos para o compo popular e progressista, particularmente para os comunistas neste ano de 2010, ano de eleições gerais no país.

Segundo Renato Rabelo, para avançar na análise política da atual conjuntura, deve ser considerado um contexto mais amplo, nacional e internacional. É preciso destacar os diversos aspectos, no quadro político e econômico mundial, que afetam a situação nacional, e que foram mencionados por Renato.

Cenário da crise econômica mundial

Tendo em vista a conjuntura econômica do cenário de crise financeira mundial, disse ele, deve-se analisar a realidade dos países ricos e dos países emergentes, assim chamados. No caso dos países ricos, nota-se a aceleração do declínio progressivo dos Estados Unidos de sua posição hegemônica no sistema de poder mundial e — por outro lado — a relativa ascensão da China. Em perspectiva, disse o dirigente partidário, a retomada será lenta e duvidosa nos países centrais. O caminho se apresenta longo para retomar a situação pré-crise nestes países.

As intervenções estatais nos países ricos chegaram à casa dos trilhões de dólares, resultando em dívidas e déficits fabulosos. Somente os EUA deverão atingir a cifra de 1,53 trilhão de dólares de déficit em 2010, volume que já foi consagrado no orçamento deste ano do governo Barack Obama. A situação de vários países europeus — como Portugal e Grécia, entre outros — vêm abalando a confiança das Bolsas de Valores em todo o mundo. Os índices de desemprego chegam aos dois dígitos dos EUA e na Europa Unida também. A Espanha chegou ao nível de 18% de desemprego da força de trabalho. Detroit, o antigo centro mundial da indústria americana de automóveis, agora com inúmeras fábricas desativadas, simboliza a situação da deterioração econômica evidente.

Países emergentes

Em relação aos chamados países emergentes, como a Índia, o Brasil, a Federação Russa e a China – a situação mais favorável é a da República Popular da China, com um crescimento extraordinário de 8,7% e que pode crescer ao patamar de dois dígitos em 2010. A Rússia teve um encolhimento, mas tem condições de voltar a crescer. O processo de transição entre China e EUA — em se tratando da luta pela hegemonia — se dá de forma contraditória, não de maneira pacífica, mas com muitas tensões, pois os EUA não vão abandonar sua posição hegemônica espontaneamente. A China pode chegar à posição de segunda economia do mundo, suplantando o Japão, e é atualmente o maior exportador mundial. Neste começo de ano a indústria automobilística da China suplantou a produção de carros norte-americana. Entretanto, divergências comerciais, como a que ocorreu com a empresa americana Google, o encontro previsto de Obama e Dalai Lama, a venda de armas americanas a Taiwan, no valor de 6 bilhões e 400 milhões de dólares, são fatores de crescentes tensões. Quem sai da crise mais rapidamente, fica numa posição relativa melhor.

No cenário latino-americano, é preciso registrar a vitória da direita no Chile, um sopro de vida para a direita no continente. Existem problemas econômicos na Argentina, e a Venezuela enfrenta várias dificuldades de desabastecimento, apagões de energia elétrica, industrialização fragilizada etc. A tragédia dos terremotos no Haiti resultou na desorganização do país, provocou mais de 200 mil mortos, e o imperialismo entra em cena para se insinuar nesta situação e tentar tirar proveito do caos criado. Cerca de 11 mil homens das Forças Armadas dos EUA foram mobilizados, para intervir no país atingido pela catástrofe, passando a controlar o aeroporto da capital, contrapondo-se ao comando brasileiro na condução das tropas sob a bandeira da ONU.

A crise no Brasil

Renato, nesta fase do debate político, insistiu que a crise atingiu o Brasil, interrompendo uma trajetória de crescimento de seu PIB. Grandes empresas e bancos, envolvidos com grandes e arriscadas operações de derivativos, foram socorridos ou se fundiram para não quebrarem oficialmente. Tal foi o caso do Banco Votorantim, do Unibanco, da Sadia, da Aracruz Celulose. O país enfrentou também dificuldades de financiamento. O saldo da Balança Comercial caiu muito, as remessas de rendas aumentaram, resultando em déficit nas transações correntes em 2008 e 2009. Dólares especulativos passaram a inundar o país, o câmbio se valorizou muito. O governo foi obrigado a vender parte de suas reservas internacionais para ajudar os exportadores em dificuldades. Com a taxa Selic estável em 8,75%, o Brasil continua a ter os juros reais mais altos do mundo. Isto dificulta o investimento e o crescimento.

Porém, continuou Renato em sua exposição, o governo Lula agiu no sentido anti-cíclico, impedindo que a crise fizesse estragos maiores. O documento de autoria de Nelson Barbosa, secretário de política econômica do Ministério da Fazenda, “Counter-cyclical policy in Brazil: 2008-2009”, sistematiza o conjunto destas medidas dividindo-as em três grupos. Algumas de caráter emergencial adotadas durante a crise e as novas medidas de caráter estrutural que estão em curso.

No primeiro bloco, Barbosa arrola aquelas oriundas de um “papel mais ativo do Estado na promoção do desenvolvimento econômico e na redução da desigualdade de renda”. Seriam elas: 1) os mecanismos de proteção social, especialmente o Bolsa-Família, programa que mesmo durante a crise teve aumento no aporte de recursos alcançando 9,3% do PIB e que, com isso, garantiu que não se reduzisse significativamente o consumo privado; 2) o crescimento contínuo do salário-mínimo; 3) o crescimento do investimento público desde 2006, especialmente na infra-estrutura, que ganhou forma com o PAC; 4) uma nova política industrial e 5) uma reestruturação geral das principais carreiras do serviço público, feita em acordo com as Centrais Sindicais.

Entre as medidas temporárias, num segundo bloco, Barbosa destaca a pronta resposta do governo para fornecer liquidez em moeda doméstica e estrangeira, visando conter a especulação contra o Real e oferecer facilidades temporárias de crédito ao setor exportador. As intervenções do BC relativas ao câmbio externo atingiram o volume de US$ 72 bilhões. Internamente, houve redução dos depósitos compulsórios. O Tesouro Nacional aportou recursos de vulto ao BNDES, ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica. Com muita relutância do BC, as taxas de juros reais foram reduzidas durante a crise para 5% ao ano, depois de quatro meses da quebra do Lehman Brothers. Registro necessário deve ser feito de que o “BC havia elevado sua taxa anual de juros para 13,75% em 10 de setembro de 2008 a exatos cinco dias antes do colapso dos mercados financeiros mundiais”.

Um terceiro conjunto de iniciativas foi tomado relativas à renúncia fiscal para estimular as vendas e a produção. Por fim, Barbosa se refere às novas medidas de caráter estrutural adotadas durante a crise, que continuariam a ser aplicadas, tais como: 10 redução do importo de renda com a introdução de duas novas categorias intermediárias de renda; 2) o programa “Minha Casa, Minha Vida”, que visa construir um milhão de moradias para famílias pobres e de renda média.

Como resultado de todas estas medidas, finalizou Renato, em 2009 o PIB (que ainda não foi anunciado) não deverá variar em relação a 2008. Pode-se dizer que, relativamente aos países de capitalismo desenvolvido, bem como em relação a vários outros em desenvolvimento (México e Venezuela, por exemplo) o resultado brasileiro foi razoável. Para 2010, oficialmente se espera um crescimento na ordem dos 5%, retomando rapidamente a rota anterior à crise.

Projeto político de Serra é neoliberal

Para sua transformação numa grande e influente nação, próspera, justa e solidária, o Brasil precisa ter pelo menos 20 anos de desenvolvimento contínuo e o aprofundamento de uma linha e condução democrática e progressista com amplo respaldo popular e lideranças populares reconhecidas. Segundo o pensamento de Renato — do ponto de vista histórico — com os dois mandatos presidenciais de Lula, de maneira insólita, o Brasil começa a reunir condições de esboçar objetivamente um novo projeto nacional de desenvolvimento. A força da liderança nacional de Lula e a dimensão da sua liderança internacional — com o protagonismo do Brasil na cena mundial – faz com que a elite conservadora faça de tudo para tentar barrar a continuidade do projeto e das forças lideradas por Lula. Ela reage a um projeto que lhe é estranho, comandado por forças que não são da sua confiança.

O projeto político de Serra, em última instância, estará comprometido com forças políticas e sociais que sustentaram o governo inaugurado pelas duas gestões de Fernando Henrique Cardoso na década de 1990. Vem a ser um projeto restritivo ao progresso social e à ampliação da democracia, anti-estatal, sendo que a posição dos tucanos na política externa é de subserviência aos interesses norte americanos e europeus. Um divisor de águas é saliente, conclui Renato: a direita pretende criminalizar o movimento social, usando a polícia e não diálogo.

A questão da integração continental – para esses setores conservadores — é inviável, uma demagogia. Vão continuar a lutar para reduzir o papel do Estado nacional. Essa é a linha da base política do PSDB (partido estruturante da direita), o DEM e o PPS. Além disso, a direita conta com grande estrutura política na grande mídia (que faz uma opção aberta pró-Serra). A base social principal em grandes camadas médias da população, sobretudo no sul e sudeste do país, grandes empresários, banqueiros e novos agentes financeiros.

Por isso Renato Rabelo insistiu que a estratégia correta da campanha presidencial deva ser o caminho do plebiscito — comparar este governo com último tucano (FHC) que dirigiu o país e explorar o desejo de continuidade. São dois modelos antagônicos entre o campo de Lula e os tucanos. Diluir este fato é ajudar a direita. Os setores conservadores vão fazer tudo para impedir esta polarização. Renato conclamou a direção a reunir forças políticas e sociais, democráticas e progressistas, fortalecendo um núcleo de esquerda, em torno da liderança de Lula (oportunidade histórica para perseguir grandes transformações), considerando principalmente sua proposta de candidatura sucessora.

Ao cabo da reunião foi aprovado o documento relativo ao projeto eleitoral do PCdoB para a campanha de 2010 (clique aqui para ler).

Foram aprovadas também algumas moções, entre elas a alusiva às comemorações dos 100 anos do 8 de Março (Dia Internacional das Mulheres). Leia aqui

De São Paulo,
Pedro de Oliveira

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Atualizada dia 08/02 às 15h57