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Gato não põe ovo: por que a mídia critica o filme sobre Lula?

As reportagens que buscam mostrar que o filme Lula, o Filho do Brasil não é fiel ao livro que o gerou (embora tanto o livro quanto o roteiro do filme sejam obra da mesma pessoa, Denise Paraná, profunda conhecedora do presidente) têm um problema congênito: livro é livro, filme é filme.

Por Carlos Brickmann, no Observatório da Imprensa

Os Dez Mandamentos não são apenas uma versão filmada de parte da Bíblia; são uma recriação, com novos diálogos, com novas cenas, com cenas cortadas. À Noite Sonhamos é uma biografia romanceada de Frederic Chopin, mas não é, cena a cena, o retrato de sua vida.

Scarface é a vida de Al Capone, mas não exatamente como ela foi. Imaginemos: Al Capone se levanta, vai ao banheiro, toma banho, penteia os cabelos, escova os dentes, vai ao gabinete da ministra chamar o Alfredo, troca o pijama pela roupa de trabalho, verifica se as armas estão lubrificadas e municiadas, e isso todo santo dia. Não há espectador que aguente. E filme não pode durar o dia inteiro.

Reclamar que o filme não conta que Lula, então presidente do sindicato, demorou alguns dias para devolver os documentos de Mariza Letícia, pois estava interessado em encontrá-la mais vezes, ou omitir conversas com autoridades, ou modificar nome e personalidade do presidente anterior do sindicato, tudo isso é licença cinematográfica.

É como, nos filmes de faroeste, o armamento do mocinho, que dispara dezenas de tiros sem necessidade de recarga. É como, em Casablanca, o momento em que os franceses desafiam os oficiais alemães cantando a Marselhesa e ninguém é fuzilado.

O filme pode ser bom, pode ser ruim. Mas deve ser avaliado como filme, não como documentário, não como retrato fiel da realidade até os mínimos detalhes. Ovo não tem pelo. Ou, para buscar um ditado mais recente, gato não põe ovo.