George Câmara: Leis que "pegam" e leis que "não pegam"

Não é raro ouvirmos as pessoas falarem sobre leis que funcionam e outras que não. Isso não se restringe apenas a uma ou outra Câmara Municipal ou Assembléia Legislativa pelo país afora, mas é uma questão comum a todas as Casas Legislativas brasileiras. Muita gente fala de determinadas leis que “pegam” e de outras que “não pegam”. Tal situação não isenta nem mesmo o Congresso Nacional, incluindo o Senado e a Câmara dos Deputados.

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Festejamos quando a sociedade sai beneficiada com a aprovação de determinadas leis de elevado alcance social, cuja aplicação traz inquestionáveis benefícios à coletividade. Porém é lamentável quando uma boa lei não alcança o seu objetivo no contexto da vida em sociedade, ou seja, “não sai do papel”. Aí temos a sensação de que toda a luta pela sua aprovação foi em vão e que não adianta fazer esforço para elaborar boas leis, pois na prática não funcionam.

Por que será que ocorre tal fenômeno, no mundo legislativo? A culpa é dos legisladores, do Poder Executivo, de alguma outra instituição ou mesmo da sociedade?

Muitas vezes, o que chama a atenção e causa perplexidade nas pessoas é quando uma determinada lei criada, por exemplo, com o objetivo de coibir determinados abusos contra a população envolvida, não tem aplicação prática. Mesmo quando é elaborada por iniciativa do Poder Legislativo e sancionada integralmente pelo Executivo, sem maiores conflitos.

São inúmeros os casos: proibição do abuso dos bancos contra os clientes que procuram os seus serviços e enfrentam filas intermináveis, em tempo excessivamente longo, sem o devido conforto sequer para o atendimento às necessidades fisiológicas. Desemprego para os bancários, desrespeito para a população.

Ou mesmo quanto à proibição de cobranças das famosas cauções ilegais, pelos hospitais da rede privada, nos momentos mais difíceis da vida das pessoas, quando alguém da família necessita de um atendimento urgente ou emergencial. Vida e morte se confundem com mercadoria, onde prevalece o completo desprezo à dignidade humana.

Ou ainda quando as empresas permissionárias do sistema de transporte coletivo desrespeitam a legislação no que se refere aos direitos dos usuários, nos seus mais variados segmentos: idosos, portadores de deficiência, pessoas em situação de diferentes graus de vulnerabilidade.

A relação de situações que ilustrariam esse raciocínio é interminável, mas um ponto é comum a todos os exemplos: em casos dessa natureza: a impressão que fica é de absoluta impotência diante dos abusos do poder econômico contra o público usuário dos respectivos serviços.

Que fazer diante de tais impasses? Evidentemente, não existe solução mágica. Porém está na própria sociedade a saída diante desses abusos cada vez mais freqüentes. Quando a população está consciente de seu papel e se organiza para cobrar seus direitos, não apenas consegue a aprovação de boas leis, mas assegura a sua efetiva aplicação.

Dessa forma, ultrapassamos os limites da democracia representativa e avançamos, com a nossa participação, no terreno da democracia direta. Responsabilidade não se transfere, mas se compartilha e se cobra.

Em nenhuma sociedade um credor recebe uma dívida sem a devida cobrança. Com a dívida social se dá o mesmo. Ou nos organizamos para cobrar nossos direitos ou jamais teremos boas leis. Ou pior: jamais teremos o efetivo cumprimento delas. Quando o assunto é a dignidade humana, não basta torcer: é preciso entrar em campo e lutar para conquistar o respeito.

 

George Câmara, petroleiro, advogado e vereador em Natal pelo PCdoB [email protected]