Deputado Chico Lopes: 70 anos, grandes lições e novos desafios

“Nunca achei que já fiz muito, sempre acho que muito mais temos por fazer”. Com essa certeza, o deputado federal Chico Lopes (PCdoB) chega aos 70 anos reafirmando a honra e a responsabilidade de representar em Brasília, o povo cearense, e de lutar pela continuidade de um projeto popular para o País.

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Em entrevista, Lopes fala sobre o reconhecimento público nesta ocasião marcante – que será celebrada na próxima quinta, 20/8, com uma festa no Náutico Atlético Cearense, em Fortaleza, com direito à presença da Velha Guarda da Escola Vila Isabel. Passa em revista sentimentos, histórias e lições destes 70 anos de vida – em grande parte, dedicados ao trabalho, à educação e à militância política –, relembra momentos importantes, como a resistência à ditadura militar, fala sobre seu dia-a-dia de luta entre Brasília e Fortaleza, a grande identificação popular e os projetos e perspectivas para o futuro. Confira:

Você é conhecido por gostar de comemorar reservadamente seu aniversário, geralmente em casa. Como você se sente chegando aos 70 anos e, desta vez, tendo uma comemoração pública, no Náutico Atlético Cearense, por iniciativa de um grande grupo de amigos?

Me sinto muito honrado e quero agradecer a iniciativa de alguns companheiros do PCdoB e da sociedade em fazer essa homenagem aos 70 anos. É a primeira vez que vou comemorar assim de público um aniversário. Fui muito homenageado quando professor, quando os alunos, no meu aniversário, levavam bolo pra sala de aula, faziam aquela festa toda. Geralmente era assim, no local de trabalho. Agora, eu mesmo, sempre preferi ficar mais reservado, em casa. O estatuto me dava direito, né? (risos)… Agora, este ano vai ser diferente. Estou muito feliz, mas não sei, sinceramente, como vou reagir a isso, tantos amigos reunidos, as pessoas lotando o Náutico, onde por muito tempo na minha vida eu nem podia entrar, porque era um clube de elite de Fortaleza. Então, por muito tempo, eu nunca poderia nem imaginar isso. De modo que estou muito feliz, porque é um reconhecimento, uma gentileza das pessoas que convivem há muito tempo comigo. Quero aproveitar e convidar a todos que possam ir, para que não deixem de estar presentes. Já que é pra ter festa, eu quero ver gente.

Muitas pessoas se surpreendem ao receber o convite para a sua festa: “Ah, o Chico Lopes já vai fazer 70 anos… Nem parece…”

É uma gentileza das pessoas (risos)… Mas, falando sério, eu sou a favor das férias, como direito trabalhista, da aposentadoria, luto muito pelos aposentados, mas eu mesmo, durante boa parte da minha vida, abri mão de tirar férias. Durante 30 anos de trabalho na Prefeitura de Fortaleza, eu passei 10 sem tirar férias. Nunca tirei licença-prêmio. Férias, pra mim ,quando dá 15 dias, eu tô doente, se não voltar a fazer alguma coisa. O organismo da gente se acostuma com o trabalho, com o movimento. Acho que, mesmo após a aposentadoria, as pessoas que querem continuar fazendo alguma atividade se beneficiam disso. Infelizmente, fazer isso por vontade própria não é a regra no Brasil, porque a previdência neste País, depois de Fernando Henrique Cardoso, a pessoa se aposenta com 10 salários mínimos e depois de uns dois anos já ta recebendo só cinco salários. O servidor público antes tinha aposentadoria com valor integral, hoje luta por melhores condições de vida.

Volta a trabalhar pela sobrevivência, não por opção…

Exatamente. Por necessidade, como meio de complementar o seu salário. Não deveria ser assim. As pessoas deveriam ter o direito de optar por seguir em uma atividade, pela saúde, pelo bem-estar físico e mental, pela continuidade de uma vida em que elas se sintam produtivas. A minha rotina tem sido assim, de muito trabalho, desde os nove anos de idade. E o trabalho sempre me faz bem.

Mas não é uma tarefa fácil, essa de representar o povo em Brasília, lutar por melhores condições de vida para a população, por mais recursos para o Estado, por leis mais justas e sintonizadas com a realidade do povo… Há momentos em que, diante das dificuldades, ameaça surgir uma certa sensação de cansaço, de dúvida se vale a pena continuar nessa luta?

Não, de jeito nenhum. Claro que tem horas muito difíceis, mas nunca, nunca pensei em desistir. Nunca achei que já fiz muito, sempre acho que muito mais temos por fazer. A vida familiar já traz pra gente uma série de responsabilidades – claro, junto com muitas alegrias –, mas traz preocupações. Só por isso, você nunca poderia pensar em parar. Ainda mais quando você tem uma tarefa política muito grande, muito forte, exigente, de corresponder à expectativa de tantas pessoas que vêem em você o seu representante, contam com você pra ser a voz delas em Brasília. Quando eu era mais jovem, já cheguei a pensar que com uns 60 anos, por aí, iria me aposentar. Me aposentei antes disso, porque comecei a trabalhar muito cedo, já com nove anos. Com 12 já era empregado da Prefeitura. Mas aí entrei pra luta política, pro magistério, e essa luta continuou muito além do que eu podia imaginar naquela época. Hoje eu sinto que essa luta faz parte da minha vida, de um modo que eu não saberia, talvez, viver sem isso. E vejo que tem muito mais a fazer, muito mais ainda pela frente.

O que você diria que sabe hoje, aos 70 anos, que não sabia antes?

Primeiro de tudo, eu nunca pensei que chegava nem aos 50 anos. É muito tempo, né? Mas não sei se saberia assim, dizer exatamente o quê. Mas tem coisas que a gente aprende. Aprende a ter mais paciência, a reagir de maneira diferente a outras situações. A ter uma compreensão melhor das coisas. Eu tenho uma compreensão, por exemplo, que a minha vida é hoje. O ontem foi ontem. Quem dirige olhando pro retrovisor termina batendo no carro da frente, amassando o seu carro e o de outro. Então, o momento é agora.

Que lições você considera mais importantes, nesse tempo todo?

Acho que a forma de você tratar as pessoas. O modo como você se dirige às pessoas, o fato de você se preocupar com o outro. Eram coisas que a gente aprendia desde cedo, como lições básicas. Quando eu era mais jovem, o relacionamento com as pessoas mais idosas, com pai e mãe, era completamente diferente, né? Por exemplo, essa formação eu tive com a minha mãe, que não era pessoa de poucas letras, era de letra nenhuma. Mas sempre nos ensinou a lição da honestidade. Se eu chegasse em casa com alguma coisa nova, ela me perguntava logo onde eu tinha achado, quem tinha me dado, reforçava esse valor da honestidade. Isso me marcou muito na minha vida, a honestidade, o cuidado com o que é meu e o que é dos outros. Assim como o respeito aos mais velhos, a gentileza de dar lugar a um idoso ou a uma mulher no ônibus. Hoje estranho que o cavalheirismo tenha desaparecido. Acho que se pode respeitar as pessoas, viver todo mundo com direitos iguais, mas sem ter de por isso deixar de ser gentil. A igualdade pode acontecer, sem que pra isso você precise perder a questão da educação, do respeito pelas pessoas mais frágeis. Então, é por aí, são essas coisas que a gente aprende. Se eu pudesse voltar a minha vida de novo, não me arrependeria de nada do que aconteceu. Tudo foi muito bom, mesmo tendo sido preso politicamente e tudo, passado por algumas coisas complicadas, mas não posso reclamar. E quem diz que seria mais maduro, tomaria decisões melhores, se pudesse voltar no tempo, eu não concordo com isso não. Porque cada momento é uma realidade que a gente vive.

Você citou a prisão, na ditadura militar, um período em que você chegou a enfrentar a tortura. Era uma época em que muitos jovens se viam tão envolvidos na luta, na resistência, enfrentando um perigo tão grande, que dificilmente imaginavam viver para chegar aos 70 anos, por exemplo…

É verdade. Havia um clima muito forte de resistência nessa época. Ou você se colocava contra a ditadura ou se tornava um alienado. Como nós nunca quisemos ter essa pecha de alienados, nos colocamos nesse embate, porque a repressão foi tirando todas as alternativas. Se a gente lembrar que Frei Tito, por exemplo, morreu aos 28 anos, em conseqüências de todas as torturas que sofreu nas mãos dos militares. Uma pessoa com 28 anos ser morta por uma ditadura militar, isso é um total e completo absurdo! O que foi que essa pessoa conseguiu viver? E tudo que essa pessoa deixou de fazer! Como também deixaram outras pessoas, de até menos idade, que foram mortas pelo regime. Então, essa é uma página da história que não deve ser esquecida. Deve-se lutar para que o jovem não tenha necessidade de colocar sua vida em risco, como a minha geração colocou. Mas hoje fico às vezes chateado quando vejo pessoas reclamando dos jovens, dizendo que os jovens de hoje não fazem nada. Acho que os jovens estão lutando sim, da sua maneira, alguns mais engajados politicamente, outros na luta pela sobrevivência, mas cada um fazendo sua parte, tenho certeza, querendo um país melhor. Nós, adultos, temos que criar as condições pra essa juventude ir mais longe.

Você é reconhecido por muita gente como um político diferente, identificado com as pessoas simples, capaz de falar a língua do povo, se comunicar de uma forma muito direta e sincera com as pessoas, passando uma verdade. A que você atribui essa característica identificada pelas pessoas?

Acho que isso acontece porque a política, pra mim, sempre foi um instrumento de militância, de luta, de busca de melhores condições de vida pras pessoas. Acho que a forma sincera de buscar isso, ao longo da minha vida, é percebida pelas pessoas. A política nunca foi um projeto pessoal, embora eu me sinta muito feliz de ter sido vereador, deputado estadual e de estar aqui, como deputado federal, em Brasília, no Congresso Nacional, onde nunca pensei passar nem na porta. Mas, se isso me dá muita felicidade, dá sempre muita responsabilidade também. Nunca perdi de vista que, em todos esses mandatos, eu continuo a ser um servidor do povo. Do gari ao ministro do STF, todos somos pagos pelo contribuinte, então todos somos servidores públicos. O importante não somos nós, e sim o povo a quem a gente serve.

E quanto ao futuro? Nesse momento de comemoração, é possível antever os próximos passos, no campo pessoal, na trajetória política? Estão colocadas possibilidades de candidatura ao Senado ou novamente à Câmara dos Deputados, além do desafio da continuidade do projeto popular no Governo Federal…

No campo pessoal, é seguir próximo da família, dos amigos, compartilhando alegrias como essa, destes 70 anos. No campo político, meu projeto é sempre coletivo. Se o meu partido entender que a realidade é propícia para uma candidatura ao Senado, meu nome está à disposição. Se entender que o melhor é uma candidatura novamente a deputado federal, da mesma forma. Sei que isso vai depender de uma série de fatores. Agora, acho que o projeto do presidente Lula tem que continuar, porque cada vez que se analisa a realidade brasileira se tem mais certeza da importância desse governo. Estamos aqui lutando na CPI da ANEEL, por exemplo, devido à entrega do patrimônio do nosso País a estrangeiros pelo PSDB, que agora quer voltar, para implantar a política das elites, sem nenhum respeito pelo povo brasileiro. Essa é uma preocupação, de o projeto do Ceará continuar e o projeto nacional também, mas de forma mais avançada. O governo Lula não pode dar margem a uma tentativa de volta dos conservadores, que quebraram esse País várias vezes e ainda querem voltar. Essa é uma preocupação que eu tenho, de não ver isso acontecer, e sim do governo continuar avançando pra melhorar a vida do povo.

Fonte: Ass. Imprensa – Dep. Fed. Chico Lopes – PCdoB-CE