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Dirigente do PC passa em revista a rebelião dos jovens gregos

Em entrevista ao programa, In Orbit, da rádio AM venezuelana YVKE Mundo, o dirigente  Partido Comunista da Grécia Babis Angurakis comenta a rebelião da juventude grega: ''O crescimento deste movime

In Orbit:  Assistindo aos principais meios de comunicação é quase impossível compreender o que se passa na Grécia, porque pintam a situação como se milhares de anarquistas tinham saído subitamente às ruas para semear o caos. Quais são realmente os componentes desta crise?

Babis Angurakis: É verdade. Essa sensação não é apenas internacional, a mesma coisa acontece na Grécia. Existe uma clara tentativa por parte dos principais meios de comunicação e dos partidos políticos da burguesia na Grécia de dar a impressão de que todo o problema são os ataques com coquetéis molotov contra as lojas, nada mais. A idéia é que todo o protesto é só contra o policial isolado que assassinou um jovem há pouco mais de uma semana.

A realidade é completamente diferente. Esta forma de cobrir os eventos responde ao desejo de evitar a profunda consciência política e o desenvolvimento de um grande movimento antiimperialista, necessário em nosso país. Como essas forças, a mídia eo governo, não podiam ignorar o conflito social e o confronto social, tentam dar a impressão de que tudo não passa de grupos anarquistas, ataques a lojas e bancos.

A verdade é que os grupos que estão gerando vandalismo em Atenas, não têm nenhuma relação com o movimento dos anarquistas, comunistas, ou antiimperialistas. São grupos bem conhecidos na Grécia há muitos anos: em todas as grandes manifestações e antiimperialistas – e temos várias todo ano, diante da embaixada os EUA, com milhares de pessoas –, em todas estas manifestações esses grupos usam coquetéis molotov, e se indispõem com o povo.

É o que acontece agora em Atenas. A novidade é que eles estão recebendo uma enorme cobertura internacional, por diferentes motivos. Na França, por exemplo, como se sabe, o governo reacionário de direita enfrenta uma enorme mobilização estudantil contra a privatização das escolas. O mesmo é verdade para a Alemanha, Itália e Espanha. E dado que o movimento na Grécia tem uma longa tradição de luta contra a privatização da educação, estamos convencidos de que vários governos de direita na Europa têm medo de qu os protestos na Grécia sejam apoiados por movimentos semelhantes em seus países.

Esta é a explicação, e repito, há uma tentativa de ocultar a natureza do movimento, que é antiimperialista, são as demandas sociais. Toda essa ação busca isolar o movimento juvenil do movimento operário, exatamente contra o que o nosso partido está lutando. Naturalmente, rejeitamos qualquer ato de destruição e condenamos o vandalismo. O que dizemos é que o movimento deve permanecer ligado à classe trabalhadora.

In Orbit: É impressionante ver pessoas tão jovens, de 15, 16 anos, nas ruas, lutando, com um discurso político, com reivindicações. A frase que mais repetem é que eles não vêem futuro.

Angurakis: Não é só que eles não vêem futuro, esse é um problema geral em toda a Europa, Oriental e Ocidental. Acreditamos que a diferença na Grécia é que temos um movimento juvenil que tem organizado grandes batalhas no passado recente, com exigências muito avançadas quanto à educação. O crescimento deste movimento é um grande perigo para o governo da Grécia e também para os países europeus, e assim tentam dar a impressão de que não é realmente um movimento social e político, mas outra coisa. Por outro lado, você tem razão: os jovens têm medo do futuro; mas sabem que a única solução para o problema deles é a luta política e a organização antiimperialista.

In Orbit:  Desde os anos 90, o movimento trabalhista na Europa, as centrais sindicais e partidos de esquerda se enfraqueceram, entraram na defensiva, perdendo cada vez mais terreno. Como é o movimento operário grego atual e como se articula com os estudantes?

Angurakis: É verdade, mas isso não é uma situação geral, ou digamos que há exceções. Na Grécia, em Portugal, temos sindicatos e partidos comunistas da classe bastante fortes. Acreditamos que isso ajuda muito o movimento juvenil.

O fato é que nos principais países europeus havia um consenso entre a social-democracia e os governos de direita, em implementar medidas muito antipopulares, principalmente as do chamado Tratado de Maastricht. Por isso os sindicatos e partidos de esquerda perderam credibilidade e não conseguem responder a esses graves ataques que estão acontecendo hoje na Europa.

No nosso país é diferente. É verdade que a maior parte do movimento sindical, controlada pelos sociais-democratas, porque tivemos um governo social-democrata durante 20 anos, tentou criar a mesma situação aqui, com a colaboração de outros partidos da esquerda européia, visando evitar a luta de classe e qualquer ação contra a política dominante.

Nosso partido lutou contra estas políticas por muitos anos, com os camponeses, estudantes, a classe operária… tentando mobilizar as pessoas. Pensamos que agora estamos obtendo alguns resultados positivos neste sentido e que é exatamente isso que assusta a classe dominante na Grécia e na Europa, em Portugal, Grécia, Espanha, mas também na Itália, novos setores da classe operária saem às nas ruas e se reencontram com a luta de classe, o que pode ser muito perigoso para a classe dominante na Europa, devido à crise econômica.

In Orbit:  A crise econômica tem impacto na sociedade grega, na taxa de desemprego, etc?

Angurakis: Sim, especialmente porque gera incertezas sobre o futuro. A Grécia teve nos últimos cinco ou seis anos um crescimento bastante elevado do produto interno bruto, cerca de 4%. Hoje está claro que o próximo ano será inferior a 1%. Em segundo lugar, a taxa de desemprego tradicionalmente têm tido elevada, mas no futuro as coisas serão muito piores, especialmente entre os universitários.

In Orbit: Você vê aí algo parecido co movimento de maio de 1968 na Europa?

Angurakis: Não, não penso assim. As coisas são completamente diferentes. Quero dizer, há muitos aspectos diferentes.

O mais importante é que maio de 68 foi um movimento otimista. Já agora o grande problema da nova geração na Europa – e esta é a explicação da violência na Grécia, Itália, Espanha e outros países –, é que ela tem a certeza de que sua vida será muito pior que a dos seus pais. É isso que torna as pessoas tão desesperadas. E, evidentemente, outra diferença é que agora os sindicatos nem sequer apóiam a luta dos jovens, porque eles ajudaram a implementar as políticas governamentais dos países europeus, de modo a que os jovens estão buscando novas formas de organização. E o último elemento, que achamos muito importante, é que qualquer pessoa que desafie o sistema, questionando o capitalismo e buscando novos caminhos, é tachado mais ou menos de terrorista, de criminoso. Este é o resultado de uma enorme campanha anticomunista que a Europa enfrenta nesta fase e que torna as coisas muito diferentes do que eram em 68.

In Orbit: Em uma situação tão explosiva quanto a um, e tendo em conta o grande número de trabalhadores imigrantes na Europa, como você acredita que é possível evitar uma onda de racismo e do fascismo, que é o recurso do capitalismo quando está desesperado?

Angurakis: Você está certo. Existem tais tentativas de jogar a culpa de todos os problemas nos imigrantes. Mas o interessante, e talvez esta seja uma lição da história, em Atenas, é que nesta luta que estamos vivendo ninguém tem questionado os imigrantes, apesar de termos um número muito elevado de trabalhadores estrangeiros: nos últimos 10 anos chegaram à Grécia mais de um milhão de trabalhadores estrangeiros, 10% da população da Grécia. E existem forças racistas e fascistas, mas, na presente crise ninguém usa este argumento.

Na Grécia, a tarefa que assumimos no Partido Comunista foi organizar os imigrantes nos sindicatos. É um caminho muito difícil, mas colhemos alguns sucessos, e pensamos que ele é a única solução para evitar esse perigo de que você fala.

In Orbit:  Você acredita que é possível que esta crise social e econômica, resulte em uma crise política? O primeiro-ministro Costas Caramanlis até pediu desculpas por casos de corrupção no governo dele…

Angurakis: Parabéns! Você está muito bem informado sobre o que se passa na Grécia. Em qualquer caso, deve saber que o problema os social-democratas não são uma alternativa; por isso não há muito apoio para a demanda de George Papandreou, o líder social-democrata, que está pede novas eleições.

Em todo caso, esta situação já abalou o governo, existem sondagens de opinião que confirmam isto.

Por outro lado, temos de ser realistas. Esse jeito do governo tentar gerir a crise, pintando uma grande ameaça para o país, pode levar algumas pessoas para posições mais conservadoras. Isso ocorreu dois anos atrás, quando tivemos grandes incêndios e pensámos que o governo perderia a maioria, jea que a direita não resolveu o problema: tivemos eleições mas o partido da direita voltou a ganhar. Por isso é demasiado cedo para tirar conclusões sobre se o governo de direita vai perder a maioria ou não.

In Orbit:  Nas eleições parlamentares de 2007 o PC da Grécia teve mais de 8% dos votos, o que é muito para um Partido Comunista sozinho. Você vê a possibilidade de chegar a um ponto de ruptura do bipartidarismo na Grécia?

Angurakis: O sistema bipartidário está esfrangalhado, esta é uma realidade. Os votos dos dois principais partidos, o da direita e o social-democrata, não são suficientes para governar Grécia.

A questão é como construir um forte movimento antiimperialista  e anticapitalista, que garanta que, quando ocorram as eleições, os votos não retornem aos dois principais partidos. Para nós, não é apenas uma questão de quebrar o sistema bipartidário, porque, em geral, se olharmos para a Europa, você verá que todos os partidos políticos tradicionais, neoliberais, conservadores e social-democratas estão perdendo influência sobre o povo, e é por isso que temos uma fraquíssima participação nas eleições.

O problema é saber como construir uma ampla maioria em favor de mudanças radicais, anticapitalistas, com um sentido popular e antiimperialista, como é o caso da Venezuela, por exemplo. Porque pensamos que só com estas políticas se pode resolver os problemas colocados pela juventude e da classe trabalhadora. Eu diria que, sem se impor condições à União Européia, ao capital monopolista e às grandes empresas capitalistas, nenhuma das demandas pode ser resolvida e a situação vai continuar.

In Orbit: Imagine que o Partido Comunista ganhe uma eleição amanhã e chegue ao poder. O que faria mudar a situação? Qual seria a agenda de um governo comunista na Grécia?

Angurakis: Faz muito tempo que lutamos e dizemos às pessoas que, para resolver os problemas, precisamos de uma economia apoiada numa base social. Uma economia que tem determinados objetivos e prioridades, como educação, saúde, progresso social.

Mas, para ter uma economia como esta, temos de socializar os meios de produção. Se você não toca no grande monopólio, nada é possível. Estamos lutando pela socialização dos grandes meios de produção, peloo controle popular sobre eles, a fim de ter os recursos necessários para lançar o programa social de que o povo e o país necessitam. E, claro, achamos que vamos enfrentar um grande ataque da parte da União Européia e dos  imperialismo dos Estados Unidos. Nosso povo deve estar preparado para isso. É por isso acho que precisamos de novas formas de organização e novas alianças políticas, que nos permitam enfrentar uma situação semelhante.

In Orbit: O que a Grécia, berço da democracia, pensa sobre a qualidade democrática da Venezuela, e sobre a integração latino-americana, a proposta de uma moeda única, tendo em conta a experiência da Europa?

Angurakis: Cabe ao povo venezuelano decidir o que é melhor para seu país. Mas posso dizer-lhe agora que o grau de democracia na Venezuela é muito superior ao presente na Grécia capitalista. E, acreditem-me, por isso, o grau de democracia não é uma questão de quantos partidos políticos existem. A questão principal é saber se o padrão de vida da maioria melhora ou piora, este é o último critério.

Para falar da Grécia Antiga e do país onde a democracia nasceu, era exatamente esse o critério para julgar qualquer governo na Grécia antiga: se a maioria vivia melhor ou pior, nada mais.

No que diz respeito à Grécia, tivemos a monarquia a junta militar, a república presidencial. A diferença do sistema político é e em que medida a classe trabalhadora e os jovens podem realmente participar na tomada de decisões que afetam suas vidas.

Temos certeza de que as forças do progresso socialista na Venezuela vão encontrar a melhor solução para continuar, digo-o abertamente, o processo da revolução bolivariana, que é muito importante, não só para a América Latina, é muito importante aqui na Europa. Se as coisas estão se mexendo um pouco na Europa, isso também se deve ao fato de que a experiência da Venezuela é inspiradora para muitas pessoas aqui.

No que diz respeito à integração, são coisas completamente diferentes [do cenário europeu]. Por isso que nos congratulamos com o que acontece na América Latina em termos de integração regional. Porque ali nossa impressão é que se trata de uma cooperação em bases igualitárias, onde todos os países têm os mesmos deveres e direitos.

Não é este o caso da chamada ''integração européia'' . Aqui na Europa temos dois ou três grandes países que ditam as condições a todos os demais, e isso é considerado normal. Porque esta é uma integração ditada pelos interesses do grande capital monopolista e das grandes empresas. Essa é a grande diferença entre o processo de integração europeu e o que está acontecendo na América Latina. Em segundo lugar, esperamos que a integração latino-americana irá servir às necessidades da sociedade. Na Europa, esta integração serve apenas às grandes empresas, e seu resultado está se vendo agora na Grécia e noutros países.

Tomado de http://www.rebelion.org