Sem categoria

Comunidade SL comemora derrota da Microsoft no Brasil

Não deu para a Microsoft. Depois de meses de discussões e reuniões marcadas por bate-boca, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) decidiu reprovar a adoção do sistema defendido pela companhia, o Open XML, sugerido como padrão de comunicação

''Os padrões abertos nos documentos digitais permitem que o conhecimento circule sob diversas formas: computadores, celulares, editores de texto de diversos fornecedores. Para isso foi criado um padrão aberto e livre, chamado ODF. A Microsoft tentou, abruptamente, emplacar seu padrão com diversas inconsistências técnicas, as quais só seriam resolvidas com seus softwares proprietários (Word, Excel, etc). Nossa luta para que a ABNT rejeitasse a proposta fui justamente considerar que trabalhar com liberdade, com os princípios do software livre, só faria bem ao Brasil.'' comemorou Fabrício Solagna, membro da Comunidade SL e da Direção Nacional da UJS (União da Juventude Socialista).


 


A decisão do diretor de normalização da ABNT, Eugenio Guilherme Tolstoy De Simone, foi enviada ontem ao grupo de técnicos que participaram das discussões, depois de uma tumultuada reunião realizada na última terça-feira, no Rio de Janeiro. ''(…) O voto do Brasil que está sendo enviado pela ABNT à ISO é de desaprovação pelas razões técnicas apontadas (…)'', informou o diretor da ABNT.


 


Não é uma questão meramente técnica. Agora que está definido, o voto de reprovação do Brasil segue para a ISO (sigla para Organização Internacional para Padronização), que tem coletado opiniões de vários países para definir se a proposta da Microsoft pode ou não ser uma linguagem padrão. A postura da ABNT será mais um elemento de avaliação para a decisão da ISO.


 


Efeito dominó


 


O interesse em ter o reconhecimento da ISO não se restringe à publicidade com selos de qualidade. Se a linguagem de programação é considerada um padrão pela ISO, ela passa a ser exigida, por exemplo, pela Organização Mundial do Comércio (OMC), quando esta for legislar sobre que normas técnicas vigorará entre países. Daí tanto barulho.


 


O objetivo da Microsoft é dar à sua proposta tecnológica o status já alcançado pelo padrão rival ODF, que já foi reconhecido pela ISO e tem apoio total de empresas como Google, IBM e Sun Microsystems, além de toda a comunidade de desenvolvedores de sistemas. Do lado do Open XML fazem coro à Microsoft empresas como Intel e HP.


 


Vários países do mundo estão se posicionando a respeito do assunto. Uma das preocupações, por exemplo, é a de garantir que daqui a 20 anos os sistemas em uso sejam capazes de abrir qualquer documento de texto escrito na década de 90. No Brasil, a discussão foi marcada por polêmicas e acusações, uma celeuma que, no último momento, também envolveu a mão do governo.


 


Problemas técnicos


 


Na última segunda-feira, um dia antes da reunião final sobre o tema, o diretor de normalização da ABNT, Eugenio Guilherme Tolstoy De Simone, foi até Brasília. O encontro foi articulado pelo deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP). No Itamaraty, o diretor da ABNT se encontrou com representantes dos ministérios da Defesa, Ciência e Tecnologia, Planejamento, Casa Civil e Desenvolvimento, além do Serpro. ''O governo consolidou a sua opinião e deixou claro que seu voto era contra o Open XML'', disse ao jornal Valor Econômico uma fonte que participou do encontro.


 


Na reunião do dia seguinte, no Rio, não se chegou a um consenso. ''Foi tumultuado. Houve momentos em que os técnicos tiveram que se ausentar da sala de discussão'', diz diretor de novas tecnologias aplicadas da IBM Brasil, Cezar Taurion, que participou do encontro.


 


O imbróglio resultou na apresentação de um documento com 63 restrições ao Open XML, entre elas as que reclamavam da inclusão de códigos fechados no sistema, o que impossibilita conhecer exatamente seu funcionamento. ''Ficou claro que todos concordaram que havia problema técnicos'', comenta Luiz Fernando Maluf, executivo da Sun.


 


Decisão lógica


 


Para o presidente da integradora de software L3, Leandro Lopes, que representou a Associação Internacional de Parceiros Microsoft (IAMCP), faltou maturidade. ''A discussão não foi técnica. Virou um palanque, uma confusão generalizada, é uma pena.''


 


Segundo Cesar Taurion, da IBM, ''a decisão foi lógica''. Todos viram que havia problemas técnicos e concordaram nisso, diz o executivo. ''Não é uma questão de vitória. Nós brigamos por padrões abertos, o mundo dos sistemas proprietários está morrendo.''


 


A resistência da Microsoft em apoiar o padrão aberto ODF reside no argumento de que se trata de uma linguagem limitada, incapaz de alcançar as especificidades de seus sistemas, principalmente os antigos. Procurada pela reportagem, a Microsoft Brasil ressaltou, por meio de nota, que ''os comentários técnicos que foram objeto de consenso (…) devem contribuir para o aperfeiçoamento do padrão Open XML.''


 


Rabo entre as pernas


 


Segundo a companhia, ''o fato de ter havido consenso técnico representa efetivamente uma oportunidade de evolução da norma, como parte do processo natural de elaboração de qualquer norma técnica.'' A empresa informa ainda que continuará a trabalhar em sua alternativa ao ODF. ''O Open XML reconhece versões anteriores de formatos de documentos, permite a conversão dos documentos em ODF e vice-versa, sem que haja uma dependência a um único fornecedor para ambos os padrões.''


 


Na última semana, o Comitê Internacional para Padrões de Tecnologia da Informação (Incits), dos Estados Unidos, rejeitou a proposta da companhia. A mesma postura foi adotada por instituições do Canadá, Índia e Japão.


 


Mobilização


 


Além da verificação de falhas técnicas no Open XML, a mobilização levada a cabo por toda a Comunidade de Software livre, também pesou. Através da campanha ''Não é aberto, não é XML, não é padrão,é Office Open XML – não apóio'' organizações de todo o Brasil participaram ativamente das reuniões da ABNT.


 


Logo que a proposta fast-track (formato que a Microsoft pediu a análise, em caráter de urgência de 3 meses) da Microsoft foi para a análise da ISO , a Comunidade de Software Livre lançou sua campanha mundialmente.


 


Na medida que a análise do documento de seis mil páginas foi passando pelos países signatários, a campanha foi tomando corpo. No Brasil, diversos atores, desde a esfera federal, como o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados), e da sociedade civil, como a Associação Software Livre.org, se mobilizaram e enviaram representantes para as reuniões técnicas. Hackers também particparam e gastaram horas analisando tecnicamente o documento, apontando as inconsistências em paralo ao trabalho de análise da ABNT. 


 


O movimento, apesar de não ter uma articulação central, contou com a contribuição de todos: blogueiros, hackers, técnicos, ativistas e governo.


 


Leia também:


Microsoft admite que prometeu ''incentivos'' em troca de votos pró OpenXML