Os desafios dos Mestres

Os mestres da cultura enfrentam os mais diferentes problemas: das questões financeiras a obstáculos para repassarem seus conhecimentos para a comunidade.

Apesar do intercâmbio de cultura na troca dos saberes populares de vários recantos do país em Limoeiro do Norte, mestres reclamam que o reconhecimento é mais “oficial”, político, de “cima para baixo” e nem sempre envolve a comunidade no reconhecimento da arte de um seu representante, além do “estrelato” gerado pelo evento. Nesse “encontro de solitários”, muitas vezes reconhecimento e manutenção da tradição e políticas públicas de promoção cultural não andam juntos.


 


No Ceará ou Bahia, Brasil ou qualquer outro canto do mundo, ser mestre da cultura tem lá todas as vantagens, mas se elogio não enche barriga, ser conhecido mestre dos saberes não é sinônimo de reconhecimento de sua arte pelas camadas da sociedade, nem mesmo aquela que gerou o mestre. Apesar da valoração midiática e política, com homenagens públicas encomendadas por prefeitos, vereadores e mesmo produtores culturais, muitos mantenedores dos saberes tradicionais são alegres por natureza, mas a tristeza bate quando o assunto é “e amanhã, o que a gente poderá fazer?”.


 


Quando sobem no Palco Mestre ou Palco dos Brincantes (tablado), os mestres da cultura apresentam-se para os visitantes; mas quando estão cara a cara, nas rodas improvisadas entre quatro paredes, rola a troca de saberes – e luta. Daí todo mestre é aprendiz. Divididos nas categorias de mãos, corpo, sagrado, sabores, oralidade e sons, as rodas vivas ficam quadradas de tanta gente em busca de um espaço. Mas a lotação é comum nas salas em que os mestres cantam e/ou dançam. Na roda das mãos, que reúne as artesãs falando de seu trabalho quase não há curiosos: “porque é muito chato ficar só ouvindo falar de como trabalham com o barro, bom é quem toca alguma coisa”, comenta a estudante adolescente Lucinda Sousa.


 


O desconhecimento do trabalho dos mestres é outra preocupação. A louceira Lúcia Pequeno, artesã do barro de Limoeiro, trabalha no mesmo ramo com toda a família. Suas peças já foram levadas para o exterior e exibida em exposições de arte, “mas as pessoas só querem pagar uma ‘mixaria’ pelo nosso trabalho. Acham bonito e tudo, mas qual é o valor?”, indaga a artesã. Na comunidade de Córrego de Areia, onde mora a família Pequeno, difícil é encontrar “mãos novas” que queiram seguir a arte. Se é pelo pouco tempo de existência do projeto Mestres do Mundo, agora Tesouros Vivos, a transmissão do saber para as outras gerações – além do que já fazem os mestres – é uma lacuna a ser resolvida.


 


“Dificuldade existe de tudo que é jeito, mas quando a gente vem com uma missão para fazer não tem jeito; com sofrimento, mas faz”, comenta dona Odete Martins, mestre da medicina popular de Canindé, que, “sem poder financeiramente” fabricou até pequenas cartilhas datilografadas para espalhar suas receitas médicas naturais. “A própria comunidade sergipana não conhece o nosso trabalho”, confessa a mestre da cultura Maurelina Santos, natural de Sergipe e que “dança de tudo”, afirma.


 


“O que botar eu danço, pode ser langa, samba de coco, samba de pareia, taieira, parafuso, guerreiro, reisado, são 21 anos desenvolvendo esse trabalho de manter a nossa cultura, ensino à juventude da capital nossas danças, mas até mesmo nas comunidades onde isso nasce é difícil ver acontecer”, lamenta Mestra Maurelina, que trabalha no “Centro de Criatividade”, da Secretaria de Cultura de Sergipe. Na edição de ontem, a dramista mestre da cultura Terezinha Lima, então tesouro vivo da cultura disse que depois de sair nos jornais até o prefeito municipal ofereceu ajuda. Mal começou o terceiro encontro, mas o medo dos mestres é que já “cesse a euforia”, acabe o evento e o vento leve o apoio, a admiração e reconhecimento conquistado pelo menos até agora.


 


 


Os ´tesouros´ selecionados


 


Aprovados no edital dos Mestres da Cultura 2006/2007, agora chamados ´Tesouros Vivos´ ´ segundo a Secult para poder contemplar não só pessoas, mas grupos culturais nos próximos editais. São eles:


Teresinha Lima dos Santos (dramista- Beberibe),


Silvano Veras Dávila (luthier de rabeca – Irauçuba);


Maria do Horto (cantora de benditos – Juazeiro do Norte);


Maria de Castro Firmeza (bordados e culinária – Fortaleza);


Maria Assunção Gonçalves (renda e culinária – Juazeiro do Norte);


Moisés Cardoso dos Santos (dança do coco – Trairi);


Vicente Chagas (reisado de caretas – guaramiranga);


Sebastião Cosmo (reisado de congo – Juazeiro do Norte);


João Lucas Evangelista (sineiro – Canindé) e


Maria Odete Martins Uchoa (medicina popular – Canindé).


 


 


Fonte: Diário do Nordeste