Os miraculosos e calculados planos do casal Clinton

Duas novas biografias não-autorizadas ajudam a reforçar percepção negativa de 40% dos eleitores americanos sobre a senadora e ex-primeira-dama Hillary Clinton. Uma das obras sustenta que ela e o marido, Bill Clinton, fizeram um “pacto secreto de ambição”

Os livros – que acabam de chegar às livrarias dos Estados Unidos – aparecem num momento em que Hillary tenta confirmar seu favoritismo entre os democratas e ganhar a indicação para concorrer à Casa Branca em 2008. O comando de sua campanha montou “Estado-Maior” para minimizar efeitos, conforme relata a Folha de S.Paulo deste domingo (10). O jornal teve acesso às duas biografias e traz curiosidades desfavoráveis à senadora.


 


O “pacto secreto”, por exemplo, teria sido feito no começo de seu namoro com Bill, no início dos anos 70. Já em 1992, o então ex-governador, enquanto empacotava as últimas coisas para assumir seu novo posto em Washington, chegou a pensar em se divorciar para ficar com uma milionária do Arkansas. Anos antes, Hillary cogitara disputar com o marido o governo daquele Estado como retaliação por uma de suas infidelidades.


 


Extensas e bem pesquisadas, as duas biografias podem afetar a disputa no Partido Democrata e prejudicar Hillary, senadora em segundo mandato pelo Estado de Nova York. Segundo as últimas pesquisas de intenção de voto, está pelo menos dez pontos percentuais à frente do segundo colocado de seu partido, o senador negro Barack Obama (Illinois).


 


Mas pesquisa do Instituto Gallup feita nos últimos dias mostra que 40% dos eleitores têm uma imagem negativa da senadora, ante 58% dos que a vêem de forma positiva. Entre os cinco principais motivos citados pelos ouvidos estão “eu simplesmente não confio nela”, “acho que ela é uma oportunista” e “ela muda muito de opinião” em temas importantes.


 


Os números são melhores do que os do ano passado (52% e 45%, respectivamente), mas ainda estão longe dos do auge do escândalo Monica Lewinski, em 1999, momento em que a mulher traída mereceu a melhor porcentagem de simpatia do país até hoje, 66%, um número que a futura política nunca repetiu na carreira.


 


O contra-ataque


 


Foi pensando nesses índices que a democrata montou uma seção em seu comando de campanha ocupada exclusivamente em identificar os “agressores” de sua imagem e tentar fazer valer – ou pelo menos ser ouvida – a versão da senadora. As faces mais evidentes são de Philippe Reines, porta-voz no Senado, e Howard Wolfson, seu equivalente da campanha.


 


Os dois terão muito trabalho. A começar pelo estrago feito pelos detalhes do suposto “pacto” em Her Way -The Hopes and Ambitions of Hillary Rodham Clinton (À Sua Maneira – A Esperança e as Ambições de Hillary Rodham Clinton), escrito pelos jornalistas Jeff Gerth e Don Van Natta Jr.
“Nos primeiros dias de seu romance”, escrevem os autores, Hillary e Bill “fizeram um pacto secreto de ambição, cujos detalhes e importância permaneceram secretos nesses anos todos”. O acordo, batizado pelo casal de “Projeto 20 Anos”, previa inicialmente que os dois protagonizassem uma “revolução” no Partido Democrata.


 


Depois que Bill foi eleito para o primeiro de seus dois mandatos como presidente, em 1992, o pacto seria “ampliado” pelo casal e preveria então oito anos de presidência para ele e oito anos para ela. Gerth trabalhou no New York Times até 2006; Natta Jr. ainda é da equipe.


 


Antes mesmo de as biografias críticas chegarem ao público, na semana passada, o comando da campanha mostrou as armas. “Fontes anônimas” vazaram a blogs simpáticos à senadora que um dos autores de Her Way, Jeff Gerth, é marido de uma assessora de um candidato nanico democrata, o senador Chris Dodd (menos de 1% de nas pesquisas).


 


Então, uma das testemunhas-chave do tal “pacto” entre Hillary e o marido, o historiador Taylor Branch, resolveu vir a público desdizer o que havia dito aos autores. Ainda assim, Gerth afirmou que a informação continuava valendo, pois ele a confirmara também com o ex-chefe de gabinete de Bill Clinton, que teria ouvido a expressão “Projeto 20 Anos” do próprio presidente, no AirForce One, em 1996.


 


Críticos em dúvida


 


Mesmo resenhistas isentos, como Robert Dallek, reclamaram do que consideraram ser um tom excessivamente crítico. “O livro é quase uniformemente negativo”, escreveu o historiador especializado em presidentes norte-americanos, que acaba de lançar o livro Nixon and Kissinger, sobre a complexa relação do republicano e seu secretário de Estado.


 


Como exemplo, Dallek cita a crítica feita ao excesso de ambição da senadora. É uma qualidade desejável num presidente, argumenta o historiador, e não um defeito, como querem os autores. Esse excesso, pergunta ele, retoricamente, faz o casal Clinton “diferente de qualquer outra pessoa na política, incluindo Lincoln e Roosevelt?”.


 


O problema, acredita Carl Bernstein – autor da outra biografia -, reside na relação de Hillary com a imprensa norte-americana. Para o jornalista, que junto de Bob Woodward ganharia o Pulitzer pela série de denúncias que ajudaram a derrubar Richard Nixon em 1974, a senadora deveria parar de ver os jornalistas “como um bloco único”.


 


São as questões “de cama” do casal Clinton que Bernstein trata com minúcia em seu A Woman in Charge – The Life of Hillary Rodham Clinton (Uma Mulher no Comando – A Vida de Hillary Rodham Clinton”, Knopf). A senadora se recusou a falar com o jornalista, apesar de ambos se conhecerem socialmente.


 


Em entrevista à ABC News, ele diria que, se pudesse fazer apenas uma pergunta à senadora, seria “por que você não quis falar comigo?”. “Ela odeia a imprensa”, disse. E deveria superar isso “porque é tolo e imaturo”.


 


Infidelidade


 


Bernstein passou oito anos trabalhando na biografia, que resultou num cartapácio de 628 páginas. Falou com 200 pessoas, muitas próximas ao casal, mas suas duas principais fontes são Betsy Wright, ex-chefe de gabinete de Bill durante o período no Arkansas, e Diane Blair, amiga íntima de Hillary morta em 2000, que planejava um livro ela própria.


 


Ele desmonta o conceito de que Hillary seria uma “Lady Macbeth” contemporânea, governando o país por trás da cadeira do marido. “Era mais uma co-presidência”, escreve. Entre as revelações, a de que Bill pensava em se divorciar da mulher já em 1989 ou 1990 -ela o impediu e o ameaçou.


 


“Hillary se casou com Bill Clinton já sabendo que as chances de ele ser fiel eram menores do que as de ele virar presidente dos Estados Unidos”, escreve Bernstein. Segundo o jornalista, a senadora contratou investigadores para desqualificar depoimentos de mulheres que ela sabia serem ex-amantes de Bill.


 


Hillary foi a primeira primeira-dama a concorrer a um cargo político, derrotando o candidato republicano em 2000. Ela entrou no Senado no mesmo mês em que o marido deixou a Presidência, em janeiro de 2001. Em seu último dia na Casa Branca, passou por um longo corredor nos braços do marido.


 


Da Redação, com informações da Folha de S.Paulo