O euro é a moeda preferida dos traficantes

O euro se tornou a moeda preferida dos traficantes de cocaína latino-americanos, à medida que cresce a popularidade da droga entre os europeus e aumenta o valor da moeda frente ao dólar, disse uma alta funcionária americana de combate às drogas na quinta-

Karen Tandy, a chefe da Drug Enforcement Administration (DEA, a agência americana de combate às drogas), disse que o apetite europeu por drogas está cada vez mais sendo saciado pelo oeste da África, que despontou com velocidade alarmante como um grande centro de distribuição de cocaína, heroína e drogas sintéticas vindas de todas as partes do mundo.



Em uma entrevista em Madri, onde participava de uma conferência internacional antinarcóticos realizada pela agência americana e pelo governo espanhol, Karen e outros funcionários da agência disseram que os traficantes de cocaína desviaram sua atenção do mercado americano para a Europa, que está tomada por uma febre de cocaína semelhante à vivenciada na América do Norte nos anos 80.



“O euro substituiu o dólar no Hemisfério Ocidental como a moeda preferencial entre os traficantes, o que é uma mudança extraordinária”, ela disse. “À medida que decresceu drasticamente o uso de cocaína nos Estados Unidos, o mercado europeu cresceu.”



Os traficantes são atraídos pelos maiores lucros nas ruas européias, onde o quilo da cocaína é vendido por cerca de US$ 50 mil, em comparação a US$ 30 mil nos Estados Unidos, disseram as autoridades. Donald Semesky, chefe de operações financeiras da agência americana, disse que 90% dos 1,7 bilhões de euros — equivalente a US$ 2,3 bilhões — registrados como tendo entrado nos Estados Unidos em 2005 vieram pela América Latina, onde os cartéis das drogas lavam o produto das vendas européias.



Espanha e Portugal estão entre os principais portões de entrada das drogas na Europa, daí a decisão de realizar a Conferência Internacional de Combate às Drogas em Madri neste ano. As autoridades dos dois países apreenderam 70 toneladas de cocaína em 2006, quase a mesma quantidade apreendida em toda a Europa em 2004, segundo números da ONU. A Espanha se tornou uma líder européia em lavagem de dinheiro e é onde se encontram cerca de 25% de todas as notas de 500 euros — conhecidas localmente como “Bin Ladens” — da zona do euro, segundo dados publicados no ano passado pelo banco central espanhol.



Karen disse que o papel do oeste da África no comércio de cocaína latino-americana, heroína asiática e de substâncias químicas chinesas usadas na produção de drogas sintéticas é uma preocupação que está crescendo e que inchou nos últimos três anos. A agência antidrogas americana respondeu treinando mais de 1.000 autoridades de manutenção da lei na África no ano passado, disseram os funcionários americanos.



“Eu obviamente estou preocupada com a África e nossa capacidade de passar à frente de tal curva como uma comunidade mundial de combate às drogas”, disse Karen, acrescentando que a proximidade da região com a América Latina e Europa, assim como seus governos fracos, a tornam um local “lógico” tanto para o tráfico e armazenamento de drogas quanto para o reabastecimento de barcos e aviões.



Russell Benson, o diretor regional da agência para Europa e Ásia, disse que os cartéis latino-americanos se estabeleceram em países como Nigéria,
Guiné-Bissau, Guiné e Gana, onde trabalham ao lado dos sindicatos africanos do narcotráfico.



Semesky, o chefe de operações financeiras da agência, disse que os traficantes estão cada vez mais usando rotas e métodos que usavam para contrabandear drogas para a Europa e os Estados Unidos para retirar o dinheiro do continente, às vezes em grandes quantidades. Isto evita os sistemas financeiros que deixam um rastro de papel, ele disse, e o oeste da África também se tornou um centro de distribuição de dinheiro para a América Latina.



A apreensão de 5,4 milhões de euros em dinheiro a bordo de um vôo fretado espanhol ajudou a levar as autoridades até Hugo Bernal, um importante narcotraficante colombiano preso em março, ele disse.



Karen e Benson disseram que a agência não tem evidências que sugiram que os traficantes no oeste e norte da África trabalhem com as redes que transportam milhares de imigrantes ilegais da região a cada ano ou com os “grupos extremistas islâmicos” que possuem bases no norte da África. Mas Karen disse ser lógico que haver elos na região entre o comércio de drogas e os “grupos terroristas”. “Eu acho que não é preciso olhar além dos atentados aos trens de Madri, onde houve troca de haxixe pelos explosivos que foram usados nos atentados e alguns dos envolvidos eram do norte da África”, ela disse. Os ataques de 11 de março de 2004 mataram 191 pessoas.



Um sinal do alcance dos narcotraficantes africanos, disseram as autoridades da agência na quinta-feira, é a presença de células de tráfico nigerianas em Cabul. O Afeganistão produz cerca de 90% do ópio do mundo, a base para a heroína.



“Em Cabul, há células de nigerianos e isto indica o grau de sofisticação e entrincheiramento no mercado, o que reforça ainda mais a preocupação que temos com a África”, disse Karen.



A produção de ópio afegão continua aumentando apesar do programa internacional multibilionário que visa coibir a produção. A produção atingiu 6.100 toneladas no ano passado — o suficiente para produzir 610 toneladas de heroína — segundo dados publicados pelos Estados Unidos. Karen disse que ocorreu um excesso de produção em comparação à demanda estimada de heroína do mercado, sugerindo que os produtores de ópio ou traficantes estavam estocando a droga.