PM-SP dá show de cassetetes e tiros na Virada Cultural

Por Marcelo Buraco*
A partir das 18 horas deste sábado (5), acontecia na Praça da Sé o evento de maior público da Virada Cultural de São Paulo. Cerca de 50 mil pessoas lotaram a Praça da Sé. A apresentação mais aguardada era a do grupo de Rap Racionais

A multidão esperou pacientemente o Racionais, que só entrou no palco as 4 horas de domingo. Quando o grupo chegou o público cantava uníssono as letras do grupo. Como o espaço era pouco, havia gente em árvores, postes de iluminação, bancas de jornais e até nas sacadas dos prédios vizinhos.

Som baixo, telões pifados; e a PM entra em cena

Dois detalhes: o som estava muito baixo, pois as torres de caixas eram poucas para tanta gente; e os dois telões montados na praça não funcionavam.

Quando o grupo se preparava para cantar a segunda letra, aconteceu um tumulto do lado direito da Praça. A Polícia Militar resolveu tirar quem subira em árvores, bancas de jornais e sacadas dos prédios; a maneira encontrada foi descer o cacetete.

Jovens começaram a despencar de onde estavam. O público revoltadoxingava os PMs, que eram em torno de 30 no meio daquela multidão. A tropa passou a abrir um clarão no público com os cacetes. Começou o corre-corre.

A polícia saca as armas

Quando a maioria não tinha mais para onde correr, começou a revidar com socos e garrafas. Os policiais ficaram acuados. Alguns chegaram a sacar as armas como forma de intimidar. Deu para ouvir estampidos de tiro. E o tumulto foi maior.

Os Racionais pediram para o público se acalmar e os policiais se retirarem, deixando que as coisas voltassem ao normal. Disseram que iriam continuar com a música para se restabelecer a atividade cultural.

Mas a tropa manteve a formação em quadrado no meio do público. E o que se viu foi o aumento gradativo do contigente, para 130 a 150 policiais.  A PM, tentando tomar o espaço central da praça, foi acuando o público para as beiradas. Recomeçou a confusão.

Neste momento a PM começa utilizar balas de borracha contra o público, que revida com o que encontra pela frente.

Mano Brown avisa que o show acabou

Logo a tropa de choque entra em ação, disparando bombas, balas de borracha, gás lacrimogêneo, numa exorbitante seqüência. Desce o cacete em todos que encontra pela frente. Então vocalista do grupo Racionais, Mano Brown, pede para as pessoas irem pras suas casas, que o show estava encerrado; aconselha que tomem cuidado e sigam em grupos.

Chegam mais carros de policia, que correm pelas ruas do entorno da  praça e sobem nas calçadas. A multidão na Sé apedreja as viaturas, e corre para outros locais do Centro Velho onde aconteciam eventos musicais da Virada. Como estes públicos também eram essencialmente de jovens, a policia passa a persegui-los pelas ruas estreitas, com bombas e balas. Quando encontrava grupos dispersos, batia muito e chutava os jovens caídos no chão.

A batalha campal se estende

A batalha campal se estendia agora desde a Praça da Sé até as ruas que dão acesso ao calçadão da São Bento. A multidão se revoltava com a truculência da PM e sua tropa de choque:  Corria desesperadamente nas ruas  e calçadões. Pessoas gritavam  tentando encontrar amigos e parentes, mulheres e crianças choravam por terem se perdido. Confesso nunca ter visto algo tão brutal, mesmo já tendo presenciado outros tumultos em shows.

A batalha da Virada Cultural foi promovida pelo próprio governo estadual. E superou os limites do absurdo em truculência. Por todo o Centro Velho de São Paulo, da Praça da Sé até o Vale do Anhagabaú, pessoas tentavam fugir entre os carros de polícia que aceleravam e davam rodopios no intuito de intimidar. Atrás deles vinha a tropa de choque da PM. O público dos eventos que aconteciam no Vale do Anhagabaú e Bulevard da São João não entendia nada do que estava acontecendo e passava a se espremer ou a correr também.

Que os feridos se manifestem

Este foi o saldo triste da Virada Cultural de São Paulo: pretendeu apresentar a diversidade, mas não soube entende-la nem respeitá-la.

É preciso apurar os fatos, punir os autores da pancadaria, contar os feridos. Que todos os espancados pela PM se manifestem, para que possamos dar a dimensão exata do ocorrido e denunciar o despreparo selvagem da PM-SP.

A organização da Virada Cultural deve um pedido formal de desculpas ao público e aos grupos que se apresentavam. Assim como a PM precisa se retratar.

Fatos como este nao podem voltar a acontecer.

* Membro-fundador da posse Negroatividade de Santo André, colaborador do Hip Hop a Lápis