Governo busca evitar CPI midiática e descontrolada

Escaldado com as desastrosas experiências das CPIs dos Correios e dos Bingos, esta última apelidada de ''CPI do Fim do Mundo'', o governo busca articular sua base no Congresso para garantir que a CPI dos Aeroportos, a ser instalada dentro de algumas seman

Cláudio Gonzalez,
com agências


 


O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quarta-feira (25), por unanimidade, em favor da instalação da CPI dos Aeroportos na Cãmara dos Deputados, como exigia a oposição. A decisão é definitiva, não cabe recurso nem protelamentos regimentais. Assim, nos próximos dias, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), precisa mandar publicar no Diário do Congresso o pedido de criação da CPI.


 


Depois disso, o regimento determina prazo de 48 horas para que os líderes partidários indiquem os membros da comissão. Feito isso, os deputados fazem uma reunião, provavelmente na segunda semana de maio, para a escolha do presidente da comissão e a indicação do relator.



No meio deste processo, haverá uma forte disputa entre a base do governo e a oposição pelo controle dos principais postos da Comissão.


 


O regimento da Câmara favorece os governistas pois estabelece que os sete partidos da base aliada que atuaram juntos para eleger o deputado Arlindo Chinaglia à presidência da Câmara –no extinto blocão– poderão indicar 12 dos 24 membros titulares da comissão. PSB, PDT e PCdoB, que também compõem a base aliada, ainda terão direito a indicar três integrantes da comissão –o que configura ampla maioria de membros da base. Ainda pelo regimento, os partidos de oposição (PPS, PSDB e PFL) indicarão apenas sete integrantes. O PSOL e o PV também poderão indicar um deputado cada.


 


Na quinta-feira (19) da semana passada, em reunião do conselho político no Palácio do Planalto, o presidente Lula já havia alertado os líderes e presidentes de partidos da base aliada que o governo precisa se preparar para enfrentar a CPI.


 


Nos bastidores, o PT trabalha para ficar com a relatoria da Comissão. O cargo é considerado mais importante que a própria presidência da comissão, uma vez que cabe ao relator dar o parecer final sobre as investigações. Segundo especulações da imprensa, o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) é cotado para assumir a relatoria da CPI.


 


A oposição vai tentar assumir a presidência da CPI. Os indicados devem ser os deputados Otávio Leite (PSDB-RJ) e Vanderlei Macris (PSDB-SP), signatários do requerimento que pediu a abertura da CPI. Entretanto, por estar em minoria, a oposição vai depender da boa vontade do governo.


 


Ontem, a ''candidatura'' de Macris para um dos postos da Comissão acabou sendo arranhada por um episódio constrangedor: Macris acompanhava no plenário do Supremo o julgamento do mandado de segurança pela CPI do aeroportos e se empolgou ao final quando por unanimidade o STF determinou a instalação imediata da CPI. Levantou e ainda com a sessão em curso aplaudiu sozinho os ministros do STF. Levou um pito no tribunal, da ministra Ellen Gracie, que lhe disse que não é permitida manifestação dentro do plenário.


 


A ocupação dos postos centrais da Comissão, porém, não garantem nem ao governo nem à oposição o controle sobre os rumos das investigações. Na CPI Mista dos Correios, por exemplo, tanto o presidente [senador Delcídio Amaral, (PT-MS)] quanto o relator [deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR)] eram da base do governo, mas sucumbiram à pressão da mídia e acabaram atuando na CPI, sobretudo na fase final, ao lado da oposição. Já a CPI dos Bingos, totalmente dominada pela oposição, concluiu seus trabalhos com um relatório pífio, que não chegou a incomodar o governo.


 



CPI midiática


 



O líder do governo na Câmara, deputado José Múcio (PTB-PE), ao ser informado sobre a decisão do STF a favor da CPI dos Aeroportos, deixou claro que o esforço da base aliada será restringir o foco das investigações. ''Precisamos saber o objeto da CPI. Não vamos esperar que será um festival de elogios. Mas as denúncias precisam ter fundamentação. O grande problema é dar ouvido à denunciantes que só querem luzes. A CPI não deve se tornar palanque'', afirmou o líder.


 


Outra preocupação da base governista é com o uso político da CPI pelos meios de comunicação.


 


O fato é que a mídia usou e abusou do denuncismo durante a crise política de 2005-2006. As CPIs daquele período serviram de instrumento para legitimar uma cobertura ''jornalística'' pautada por sucessivos ''escândalos'' montados sem provas nem substância, com o claro objetivo de criar um clima de histeria coletiva que fazia lembrar a história das ''bruxas de Salém''. A influência da mídia era tão forte que um grupo de parlamentares que atuava na CPI chegou a ser chamado de ''bancada do holofote''.  Mas no final das contas, foi a mídia quem saiu chamuscada do episódio, sem conseguir convencer a opinião pública de que estava retratando o ''governo mais corrupto da história''. Tanto não convenceu que o presidente foi reeleito com ampla margem de votos.


 


Agora, teme-se que a nova CPI sirva novamente de palco para que a imprensa conservadora tente uma revanche, ressuscitando o denuncismo moralista que vingou na última crise política e ofuscando as pautas positivas que o governo está tentando construir com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e outros projetos de grande impacto.


 


Para se precaver, a base do governo já estuda propostas para evitar a ''espetacularização'' das CPIs. Uma das idéias já apresentadas determina que os depoimentos de testemunhas não devem ultrapassar três horas.


 


O apelo midiático da nova CPI começa pelo próprio ''apelido'' da Comissão. Setores da imprensa conservadora convencionaram chamá-la de ''CPI do Apagão Aéreo''. Com isso, esperam, simbolicamente, comparar a atual crise no serviço de tráfego aéreo com o apagão energético ocorrido durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Ingenuamente, a própria Agência Brasil, vinculada ao governo federal, acabou se rendendo e utilizando o termo marotamente adotado pela mídia oposicionista. O Vermelho optou pela adoção do termo CPI dos Aeroportos.


 


Ao comentar sobre outro assunto da conjuntura –as operações da PF que resultaram na prisão de integrante do poder judiciário– o jurista Dalmo Dallari sintetizou o problema das CPIs midiáticas. Segundo ele, as últimas CPIs nã produziram os efeitos desejados porque são ''processos mal feitos''. ''Não respeitavam o direito de defesa, suposição era tomada como prova. Claro, o processo acaba'', avalia o jurista.


 


No caso da CPI dos Aeroportos, que será criada na Câmara e pode também ser criada no Senado, a esperança do governo é que os ''processos'' sejam bem feitos, mas fiquem restritos ao fato que as gerou, ou seja, a crise no tráfego aéreo.


 


O núcleo dirigente do PSDB, ao que tudo indica, desta vez não fará muito esforço para ampliar o leque das investigações. Resta saber se o restante da oposição (DEM, PPS, PSOL e mídia) terá força suficiente para ressuscitar a CPI de birutas que quase levou ao colapso o primeiro mandato do governo Lula. E se a base aliada, em tempos de composição do segundo escalão, saberá atuar de forma unida e fiel ao segundo mandato do governo Lula.