Ex-guerrilheira contesta livro que fala em 'adultério' no Araguaia

Luzia Reis Ribeiro é uma das poucas militantes comunistas ainda vivas que participou da Guerrilha do Araguaia, onde atuou sob os codinomes de Lúcia e Baianainha. Em carta, ela contesta informações contidas no livro ''A Lei da Selva'' a respeito da mort

Luzia Reis Ribeiro é uma das poucas militantes comunistas ainda vivas que participou da Guerrilha do Araguaia, onde atuou sob os codinomes de Lúcia e Baianainha. Ela participava do chamado Grupo Esperancinha, do Destacamento C.


 


Ao tomar conhecimento do conteúdo de recente publicação que aborda a história da Guerrilha, Luzia protestou. Em carta enviada a amigos e à qual o Vermelho teve acesso (clique aqui para ler a íntegra), a ex-guerrilheira reclama que ''é preciso que apresentem as provas do que escrevem, uma vez que relatam fatos distorcidos, possivelmente fruto da imaginação de alguns''.


 


A ex-guerrilheira refere-se ao livro ''A lei da selva – estratégias, imaginário e discurso dos militares sobre a Guerrilha do Araguaia'', de Hugo Studart. O livro, editado pela Geração Editorial, tem 386 páginas e foi lançado em março de 2006.


 


O livro apresenta uma interpretação distorcida do episódio histórico ocorrido entre 1972 e 1975 na região do rio Araguaia e busca apontar tanto os militares quanto os dirigentes do PCdoB como responsáveis pelas mortes de dezenas de guerrilheiros. Oriundo da grande imprensa e sem nenhuma sintonia com os ideais políticos que motivaram a Guerrilha, o autor, Hugo Studart, construiu a argumentação de seu livro apoiado basicamente em depoimentos e informações de fontes militares. Ele próprio pertence a uma família de linhagem militar que vem desde o Império.


 


Em sua carta, Luzia contesta especialmente a versão do livro sobre os episódios que envolvem relacionamentos conjungais entre guerrilheiros.


 


Ela cita, por exemplo, o caso do guerrilheiro Mundico (Rosalindo Cruz) que, segundo a distorcida versão  do livro, teria sido ''justiçado'' pelos próprios companheiros por ter se envolvido num relacionamento amoroso que contrariava as ''regras'' do movimento guerrilheiro.


 


Segundo Luzia, que conviveu com Mundico durante a Guerrilha, esta versão é uma mentira. Ela lembra, em sua carta, que a morte de Rosalindo Cruz, ''segundo o relatório do Ministério do Exercito, ocorreu em 16 de agosto de 1973 em combate com as forças de “segurança”, isto é dos agentes descaracterizados e não pelas forças regulares do Exército, período da Operação Sucuri''.


 


''Referindo-se aos justiçamentos contidos no Regulamento da Guerrilha, não existe registro dessa ocorrência em caso de ''adultério'', mas de  pistoleiros que estavam a serviço das Forças Armadas por livre vontade para matar os guerrilheiros'', diz Luzia.


 


Segundo ela, ''é de estranhar, o que consta do livro Lei da Selva, uma vez que nós mulheres éramos livres para escolher com qual companheiro quiséssemos nos relacionar, mesmo as casadas anteriormente. Não havia promiscuidade, portanto, o comportamento tido como adultério não existia em nosso meio, podia sair de um casamento para outro relacionamento, sem repressão nem a intromissão da Comissão Militar'', relata.


 


Luzia cita também o caso dos guerrilheiros Áurea e Ari que, segundo o livro de Studart, também se envolveram num triângulo amoroso. Neste caso também, Luzia protesta: ''O autor do  referido livro não apresenta nenhuma prova , escreve apenas o que teria dito um morto, o Ivan, que não pode ser questionado. São afirmações falsas.''


 


Para Luzia, ''a verdadeira  história da resistência do Araguaia um dia fará parte das pesquisas acadêmicas do povo brasileiro e será respeitado o idealismo daqueles que deram suas vidas pela liberdade e pelo sonho de uma nova sociedade com justiça social''.


 


Ela finaliza a carta cobrando informações sobre onde estão  enterrados os mortos da Guerrilha do Araguaia. ''Os familiares querem as ossadas de seus filhos que deram a vida, na soma de outras formas de luta, para que hoje possamos viver a paz e a construção da democracia''.


 


Para ler a íntegra da carta de Luzia, clique aqui.


 


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