Mais de 20 viaturas da PM atiram contra greve em Betim

Para impedir a continuidade de uma greve de metalúrgicos iniciada no dia 15 na empresa Jabil do Brasil (fabricante de componentes eletrônicos sediada nos Estados Unidos), às 14 horas do sábado (17), vinte uma viaturas da polícia militar dispararam tiros c

Assustados com a violência, a maioria dos trabalhadores preferiu entrar para a fábrica localizada na cidade de Betim (MG), enfraquecendo a greve. “A empresa se valeu da intimidação aos trabalhadores, aliada à forte repressão mobilizada em seu favor para reprimir o movimento”, disse Rocha. Um dia antes do episódio, através de suas chefias, a empresa fez contato com cada um dos trabalhadores para ameaçá-los de demissão caso não interrompessem a greve.


 


Problemas
 


A greve iniciada pelos trabalhadores do primeiro turno da Jabil, na manhã da última quinta-feira (15), já se anunciava há pelo menos dois anos, segundo uma das grevistas. “Há muito tempo o pessoal está revoltado com as condições de trabalho. Isso não é de hoje”, disse o presidente do sindicato.
 


A insatisfação latente nos últimos meses atingiu seu ápice entre os trabalhadores do primeiro turno, depois que um antigo gerente de produção foi substituído para dar lugar a outro, acusado de desrespeito e discriminação por várias trabalhadoras. Até aquele momento, elas, que representam cerca de 90% dos 1.620 empregados da fábrica, só admitiam voltar ao trabalho depois que o gerente fosse demitido.


 


A este problema, somaram-se pelo menos outros quatro. Primeiro, a jornada aos sábados que obrigava trabalhadores a permanecerem na fábrica até às 22h20. Segundo, o trabalho aos domingos, que, aos poucos, está se tornando rotina. Terceiro, as diferenças de salário entre funcionários que cumprem funções idênticas e, quarto, o fato de terceirizados trabalharem na atividade-fim da empresa, a lei vem sendo descumprida há muito tempo.
 


A “gota d’água” veio na última quarta-feira (14), quando os trabalhadores foram informados que receberiam, no máximo, 55% do salário nominal como primeira parcela da PLR (Participação nos Lucros ou Resultados), em alguns setores, o percentual não ultrapassaria 32%. O acordo foi assinado em 19 de novembro do ano passado, quando a empresa ainda estava instalada em Contagem.
 


A Jabil alega que os trabalhadores não cumpriram as metas previstas no acordo. Na véspera do pagamento, entretanto, em contato telefônico com o sindicato, um deles deu uma explicação para o não cumprimento. “Uma das metas era praticar o 5S. Mas o ritmo de produção está nos impedindo de cumpri-la”. No dia seguinte, a fábrica parou.
 


Propostas rejeitadas
 


Logo que foi deflagrada a greve, a Jabil quis negociar, mas se dispôs apenas a pagar 60% do valor da primeira parcela da PLR e a tratar dos outros problemas somente em uma reunião marcada para a terça-feira (20) seguinte. A proposta foi rejeitada sob vaias dos trabalhadores do primeiro turno. Em seguida, numa nova negociação, a empresa propôs aumentar o valor da primeira parcela para 80%, desde que os trabalhadores aceitassem que 20% da segunda fossem descontados em setembro. Nova rejeição. Na multidão que se formou na portaria da fábrica, trabalhadores também pediam “a cabeça de João Batista”, referindo-se ao atual gerente.
 


O Sindicato propôs, então, à Jabil pagar o valor integral da primeira parcela. A proposta foi descartada pela empresa, que fez mais: recuou da oferta de 80%, que ela própria havia feito anteriormente. “A Jabil ‘pagou para ver’. E viu”, diz Marcelino da Rocha.
 


Mesmo debaixo de forte calor na portaria da fábrica, os trabalhadores decidiram, então, esperar pelo segundo turno, para votar a continuidade da greve. O movimento ganhou força, e, mais tarde, com a chegada do terceiro turno, a adesão foi quase completa.
           
 


Pressão
 


Com a greve decretada, foi marcada uma reunião para o dia seguinte, na Subdelegacia do Trabalho de Betim. Na manhã de sexta-feira (16), o primeiro turno, mais uma vez, decidiu não entrar, à espera da negociação. O Sindicato, por sua vez, foi proibido de permanecer nas imediações da fábrica, uma espécie de “condomínio fechado” que pertence a Jabil e a outras três empresas (Usiminas Mecânica, Stolla e Usifast).
 


Os negociadores da empresa preferiram não comparecer à reunião, abandonando a negociação. Na troca de turnos, os especiais foram conduzidos até o pátio da empresa, onde vários trabalhadores foram pressionados a entrar na fábrica. Muitos não resistiram à pressão. Cerca de metade deles, porém, preferiu permanecer em greve.
 


Paralelo a isso, a Polícia Militar foi chamada a interferir no movimento. Horas antes da troca de turnos da noite, 16 viaturas foram postadas nas proximidades da fábrica, para intimidar trabalhadores e dirigentes sindicais. Mais uma vez, os metalúrgicos se dividiram.
 


O cansaço e as intimidações fizeram com que, na manhã de sábado (17), muitos dos que haviam iniciado a greve dois dias antes retornassem ao trabalho. A PM, mais uma vez, estava lá. Foram poucos os que resistiram. Horas depois, durante outra troca de turnos, já eram 21 viaturas nas imediações da fábrica. O “cenário de guerra” estava montado para a violência que seu viu dali por diante.
 
 


Repercussão
 


“Betim é, hoje, a cidade mais violenta de Minas, onde muitas pessoas carecem do apoio da Polícia Militar quando precisam. Mas para perseguir dirigentes sindicais e trabalhadores, ela está à disposição. Não podemos aceitar isso”, afirmou a deputada federal Maria do Carmo Lara (PT), que participou da assembléia do último domingo. Ela disse que, esta semana, fará um pronunciamento na Câmara dos Deputados, em Brasília, para denunciar o episódio. “Eu e a deputada Jô Moraes, do PCdoB”.
 


O vereador de Betim Geraldo Pimenta (PCdoB) informou que, há três anos, a Câmara Municipal aprovou um projeto que destinou a Jabil um terreno para a instalação de uma unidade própria, além de outros incentivos. E sugeriu aos dirigentes sindicais levarem à frente “um projeto de lei de iniciativa popular que peça a revogação dos benefícios concedidos à empresa”.
 


O presidente do Sindicato dos Vigilantes de Minas Gerais, Edílson Silva, lembrou que “na Pedreira Prado Lopes, favela da capital mineira conhecida pelo alto grau de violência, a Polícia Militar não sobe, enquanto põe viaturas à disposição de empresas privadas”, citando como exemplo uma greve recente da categoria, quando dirigentes sindicais foram impedidos de conversar com os vigilantes em diversas agências bancárias da capital.
 


Edmundo Vieira, que há três décadas está ligado à trajetória de organização dos metalúrgicos de Betim, contou que “nestes 30 anos nunca havia ouvido um tiro em portaria de fábrica”. “Não foi uma simples repressão”, disse. “O que aconteceu foi fruto de truculência, despreparo e conivência com os interesses da empresa. Enfim, um absurdo”, conclui Marcelino da Rocha.


 


Para manifestar solidariedade aos metalúrgicos de Betim, Igarapé e São Joaquim de Bicas e, em particular, aos metalúrgicos da Jabil do Brasil, envie mensagem para o endereço eletrônico [email protected].