Evo propõe Justiça indígena independente na Bolívia

O governo boliviano apresentou nesta semana um projeto de lei que legaliza a chamada Justiça comunitária, deixando-a livre da interferência do Poder Judiciário, acusado anteontem (2/1) pelo presidente Evo Morales, durante discurso em plena Suprema Corte d

O projeto de lei, que ainda precisa ser aprovado pelo Congresso, prevê que as decisões coletivas tomadas por autoridades indígenas e camponesas “sejam de ordem pública e de cumprimento obrigatório”.



Segundo nota do governo, as decisões obedecerão às “normas internas” e “práticas tradicionais para os membros dos povos indígenas originários e das comunidades camponesas e não poderão ser submetidas posteriormente a nenhuma autoridade judicial nem administrativa”.



O projeto de lei prevê a implementação da Justiça comunitária seis meses após sua aprovação pelo Congresso e veta a pena de morte, mas não o castigo físico.



A regulamentação está prevista na Constituição boliviana, que concede a povos indígenas e a comunidades camponesas o direito à administração de uma Justiça própria.



A medida deve afetar sobretudo comunidades indígenas do altiplano e da região amazônica, que já possuem mecanismos tradicionais de Justiça, o que em alguns casos inclui castigo físico e até linchamento. A população indígena representa cerca de 60% da Bolívia.



“A nós nos preocupa há bastante tempo o tema do linchamento, que tem vários casos na Bolívia, inclusive de prefeitos”, disse o presidente da Suprema Corte boliviana, Héctor Sandóval.



“Sempre que há justiça pelas próprias mãos, é necessário fazer uma análise sobre o porquê da delinqüência, que tem muitas causas, como as econômicas, mas sem dúvida tem a ver também com a falta da Justiça nos níveis mais desprotegidos. A Justiça comunitária é um tema que tem de ser analisado dentro da política penal do Estado”, afirmou Sandóval.



Críticas e nomeações
Enquanto impulsiona a Justiça comunitária, Morales provocou um mal-estar com a Suprema Corte ao afirmar, em discurso de inauguração do Ano Judicial, que “a Justiça é vista com medo, como terror, mas também como negócio”. Dirigindo-se aos magistrados, disse: “Todos (vocês) são produto do loteamento político dos governos anteriores”.



Na semana passada, o governo nomeou quatro juízes interinos para a Suprema Corte, que tem 12 magistrados, sob a alegação de que o Congresso está demorando muito para completar as vagas.



As nomeações foram consideradas “um atentado à democracia” pela oposição, que exige a renúncia dos magistrados nomeados. Pela Constituição boliviana, um novo juiz da Suprema Corte tem de ser aprovado por dois terços do Congresso.