Adeus, povo: SP terá cinemas com ingresso a mais de R$ 40

Chega ao Brasil no ano que vem a nova moda no mundo do cinema – salas “exclusivas”. São exclusivas para quem tem muito dinheiro e disposição de pagar por serviços sofisticados, que transformem a saída para ver um filme em algo mais glamouroso e, obviam

As salas VIP (“conceito” já aplicado em países como os EUA e o México) têm entrada, área de espera e banheiros exclusivos para clientes, mesmo que se localizem em shoppings, como é o caso dos três exemplares dessa novidade que a Cinemark abrirá em São Paulo, em 2007 – no Shopping Paulista, cujas obras de expansão e remodelagem para deixá-lo luxuoso têm previsão de término no terceiro trimestre.


 


Os poucos lugares – entre 60 e 80 por sala – serão todos numerados, e os ingressos poderão ser comprados antecipadamente, por internet, celular ou nos terminais de auto-atendimento no cinema.


 


Champanhe
Mas haverá também funcionários disponíveis na bilheteria, para vender o ingresso e já anotar o pedido de drinques e comidinhas que poderão ser servidos durante a projeção. O espectador VIP, contudo, não é obrigado a decidir antes do início do filme entre o champanhe, a cerveja e o capuccino (alguns itens que estarão disponíveis no menu), já que o serviço de bar funcionará sem interrupções, durante a sessão.


 


O trajeto que o garçom deverá fazer na sala, para servir os espectadores sem atrapalhar a visão do filme, é um dos aspectos em estudo no projeto. É absolutamente certo, porém, que filme e quitutes serão degustados não exatamente numa poltrona, mas num tipo de chaise-longue, item indispensável nas novas salas.


 


O conforto e a capacidade de reclinação dos assentos é semelhante ao das poltronas de primeira classe nos aviões. Ou seja, o espectador pode deitar-se. O fato de haver menos lugares no cinema não indica que as telas serão pequenas. Afinal, essas salas são destinadas a um consumidor altamente exigente.


 


“Não adianta fazer de conta que é VIP, porque o público percebe (a fraude)“, afirma Valmir Fernandes, presidente da Cinemark, rede líder no Brasil. O executivo diz que o espectador de sua sala VIP irá comparar o padrão de conforto e serviços oferecidos com o que a Cinemark já adota hoje em seus complexos dos shoppings Iguatemi e no recém-inaugurado Eldorado, onde há inclusive área wi-fi gratuita.


 


“Para ser VIPs, as novas salas terão de oferecer algo realmente diferenciado”, conclui Fernandes. O modelo da Cinemark no Eldorado, mais sofisticado do grupo hoje, passará a ser adotado em toda a rede no ano que vem. Os demais complexos já existentes serão “repaginados”, informa Fernandes, para se igualar ao novo padrão.


 


O ingresso na sala Golden Class, Premium ou VIP (o nome ainda não está definido) custará “no mínimo o dobro do valor mais alto cobrado hoje (R$ 21)“, informa o executivo. Mas, em se tratando de mercado de luxo, dinheiro não é problema. É precisamente a meta de aumentar a lucratividade dos cinemas que está por trás da moda de salas elitizadas.


 


A “concentração dos cinemas no público de alto poder aquisitivo é, infelizmente, a tendência”, segundo Luiz Gonzaga De Luca, diretor de relações institucionais do grupo Severiano Ribeiro, número dois no mercado de salas no Brasil.


 


Serviços caros
A equação que conduz ao espectador endinheirado é simples: “Cada vez a gente ganha menos em bilheteria e mais em serviços. Cada vez mais os serviços terão de ser mais caros”, enuncia De Luca.


 


Aplicando sua própria fórmula, o grupo Severiano Ribeiro inaugura na próxima quinta o Kinoplex Leblon, com quatro salas no bairro da zona sul carioca. O complexo não tem o padrão das salas VIP que a Cinemark trará a São Paulo, mas está conformado para atender “o público de maior renda da região”, como afirma De Luca.


 


Um exemplo da elitização é o fato de que os ingressos serão vendidos com lugares marcados “em todas as salas, em todas as sessões”. Pode parecer um detalhe desprezível, mas o procedimento indica a aposta num público inverso ao das salas populares, guiadas pela idéia de que cinema é “hábito de impulso”.


 


Ou seja, até aqui, a aposta dos exibidores era num tipo de público que decide ir ver um filme sem necessariamente programar-se previamente para isso. Agora, o fundamento é tornar os cinemas uma oferta de entretenimento mais elaborada.


 


Por isso, ao lado das salas Kinoplex Leblon haverá um bar com cem lugares e amplo cardápio. A expectativa é que o espectador freqüente o lugar e gaste tempo e dinheiro ali, além de ver um filme.


 


Se De Luca fala abertamente sobre a tendência à elitização, Fernandes evita tratar a questão assim. O executivo da Cinemark define o espectador de alto poder aquisitivo como “um nicho” de mercado “que se interessa por exclusividade e sofisticação”, mas diz que, sozinha, essa fatia “não resolve o problema do cinema, que tem de buscar aumento de público”.


 


Adhemar Oliveira, sócio do Espaço Unibanco e da rede Unibanco Arteplex, que se prepara para abrir uma sala Imax (formato gigante para exibição em 3D) em setembro de 2007, em São Paulo, diz que “não se trata de elitizar, mas de diferenciar” e que “sala diferenciada cada um inventa a sua”.


 


A de Oliveira deve ser a Sala 10, no complexo do Shopping Bourbon, que ele construirá ao lado do Imax. A diferença da Sala 10 sobre as demais ele esconde: “Pensei em fazer uma bossa”. Uma bossa exclusiva.


 


O pendor das salas pelo público da elite econômica reverbera no perfil da programação. Os filmes deixam de ser direcionados ao espectador adolescente, para tentar atrair um gosto adulto e mais refinado. Se as salas VIP da Cinemark estivessem em funcionamento hoje, exibiriam Cassino Royale, O Diabo Veste Prada e Um Bom Ano, segundo exemplifica Fernandes.