Partidos Políticos: Quem ''mama nas tetas'' do governo?

Em dez anos, o Fundo Partidário distribuiu 813,9 milhões; os partidos grandes ficaram com 68% do total, enquanto os demais com apenas 32%. Nesse período, o PCdoB teve 0,6% do total, uma quantia mais de 26 vezes menor do que aquela recebi

Um certo Fernando Rodrigues, que escreve habitualmente na Folha de S. Paulo, onde se distingue por defender teses conservadoras e antidemocráticas, bem ao gosto das elites dominantes, insinuou, em artigo publicado hoje (''O custo Brasil'') que os pequenos partidos, que tomaram a iniciativa de contestar a no STF constitucionalidade da cláusula de barreira instituída pela lei 9096/95, vivem às custas de dinheiro público. ''Não ocorreu a nenhum juiz que pode surgir algum dia no Brasil um partido decente pela força dos eleitores, mas sem mamar nas tetas do governo'', registrou ele.


 



Ele é um destes jornalistas que confundem a verdade dos fatos com sua própria vontade, desconsiderando os dados do próprio TSE a respeito da distribuição dos recursos do Fundo Partidário. São informações públicas e que podem ser consultadas na página eletrônica daquele tribunal, onde constam os valores distribuídos aos partidos desde 1994. O endereço eletrônico da página é http://www.tse.gov.br/partidos/fundo_partidario/distribuicao.html, e ela pode ser consultada por qualquer cidadão interessado na forma como aquele dinheiro é distribuído aos partidos políticos.


 



A consulta instrutiva sobre quem é mesmo que ''mama nas tetas do governo''. Nos últimos dez anos (entre 1997 e outubro de 2006), o TSE distribuiu 813,9 milhões de reais para os partidos políticos. Os chamados partidos grandes (PMDB, PT, PSDB e PFL) ficaram com 68% daquele valor, abocanhando a quantia de 553,5 milhões de reais nesse período. O PT foi o que mais ganhou, ficando com 143 milhões de reais; foi seguido pelo PSDB, com 140,4 milhões; depois pelo PFL, com 135 milhões; finalmente, pelo PMDB, com 134,6 milhões.



 


Considerando apenas os partidos que ficaram com mais de 5% dos recursos do Fundo Partidário, além destes quatro grandes, outros que receberam valores consideráveis nestes dez anos foram o PPB (que, em 2005, se transformou no PP), 91,7 milhões de reais; o PDT (que superou 5% dos recursos somente depois de 2001), 35,7 milhões; o PTB (que superou aquela marca em 2001, 2002, 2004 e 2005), 23,4 milhões; o PSB (que esteve entre os grandes recebedores apenas em 2003, 2004 e 2005), 19,4 milhões; e o PL (que superou os 5% dos recursos do Fundo Partidário somente em 2004 e 2005), 12,7 milhões.



 


Os demais partidos dividiram entre si 32% do Fundo Partidário distribuído nestes dez anos (260,4 milhões), menos da metade do que aquelas agremiações felizardas receberam.


 



Entre os pequenos, o PCdoB é um exemplo dessa distribuição desigual: em dez anos, recebeu 5 milhões de reais, ou apenas 0,6% do total do fundo partidário. Isto é, os quatro partidos grandes tiveram, cada um deles, recursos mais de 27 vezes superiores.
Se considerarmos apenas o ano de 2006 (até o mês de outubro), a distribuição foi semelhante: PT, PSDB, PFL, PMDB, PP e PDT tiveram com 67% do total dos recursos distribuídos, cabendo aos demais partidos a fatia de 33%; ao PCdoB coube apenas 0,7% do total.


 



A direita não gosta da distribuição de recursos do Fundo Partidário, da mesma forma como tem esgares ao ouvir falar em financiamento público de campanhas eleitorais. Afinal, estas são medidas democratizantes, que limitam a ação do poder econômico nas eleições e estabelecem condições mínimas de igualdade entre os partidos que disputam os pleitos. E mesmo uma regra como a que instituiu o Fundo Partidário é considerada pelos dirigentes e analistas da direita como uma inaceitável distribuição de recursos do cidadão, como eles gostam de alegar, embora o critério usado, de ''mercado eleitoral'', seja caro à direita: a distribuição dos recursos é feita de acordo com o número de votos que o partido teve nas eleições, favorecendo assim àqueles que, em um determinado momento, são hegemônicos, tem mais votos e, assim, mais dinheiro do Fundo Partidário.


 



É isto a que a direita dá o nome de errado (que revela sua forma privatista de pensar a política e defender o predomínio da classe dominante) de ''mamar nas tetas do governo'', sem ressalvar que os partidos grandes (e, entre eles, os dois principais da direita, o PSDB e o PFL) é que mamam exageradamente mais que os outros, enquanto os pequenos e mais carentes de recursos, conseguem abocanhar apenas algumas gotas.


 



É uma realidade que um comentarista de um jornal como a Folha de S. Paulo deveria levar em conta em sua investida contra o STF e os partidos pequenos, quando reagiu contra a declaração de inconstitucionalidade da cláusula de barreira. Mas isto só seria possível se aquele escriba estivesse de fato interessado em compreender verdadeiramente o processo político e suas vicissitudes, e não apenas em produzir má propaganda política, disfarçada sob um alegado interesse naquilo que chama de ''aprimoramento da democracia'' e que não passa de uma defesa velada dos interesses do poder econômico.