Para líder sandinista, militância garantiu vitória de Ortega

Durante o 23º Congresso do Partido Comunista do Chile, o Vermelho entrevistou Orlando Gómez, membro da Frente Sandinista de Libertação Nacional, deputado do Parlamento Centro-Americano (Parlacea) e, no âmbito do parlamento, presidente do

Quais fatores políticos, sociais levaram os sandinistas a retomar o governo da Nicarágua depois de largo tempo?
Após 16 anos de governo neoliberal, quando o povo pôde, digamos, (viver) as políticas postas em prática pelo governo articulado de liberais e conservadores, chegou um momento em que o povo nicaragüense estava vivendo uma situação bastante sacrificada e angustiante, com muito desemprego. Uma situação em que aproximadamente 1,5 milhão de nicaragüenses estavam literalmente passando fome. Pessoas vivendo com menos de US$ 1 ao dia, pessoas sem acesso à educação, aos serviços de saúde. Ao longo de 16 anos foi criado um cenário de exclusão, isto é, as pessoas excluídas das escolas, das faculdades, do sistema de saúde, sem trabalho. Portanto, uma situação desesperadora. Então por que chegamos a ganhar as eleições de 5 de novembro passado? Porque desenhamos uma estratégia que apregoava em primeiro lugar a reconciliação e a unidade do povo nicaragüense. Essa foi nossa mensagem principal. Nossa mensagem de campanha foi “Reconciliação e unidade do povo nicaragüense para criar um ambiente de paz”. E sobre a base desse ambiente de paz poder tomar iniciativa de governo que permita, digamos, combater esses flagelos. Então, as pessoas compreenderam que de alguma maneira os outros, quer dizer, os adversários da frente sandinista, ofereciam uma continuidade das políticas neoliberais aplicadas durante 16 anos e optaram, portanto, pela opção que oferecia não apenas reconciliação, unidade e paz, mas sim a possibilidade de um outro caminho, de uma situação alternativa ao que vinha sofrendo o povo nicaragüense – produto dessas políticas neoliberais.
Portanto, isso foi o determinante e, obviamente, a base organizativa do partido, a mobilização de seus militantes. Nós fizemos uma campanha chamada “Visita casa por casa”. Cada militante da Frente se organizou em equipes regionais e assim foram feitas jornadas de visitas, de casa em casa nos bairros aconselhando as pessoas, convencendo as pessoas e, além disso, informando as pessoas em relação ao nosso programa de governo. Tudo isso deu resultado positivo e nós alcançamos a vitória em 5 de novembro passado.



Quais pontos, além desses dois principais, você destacaria do programa com o qual o Ortega foi eleito presidente da Nicarágua?
No meu entender, deve-se ressaltar, sobretudo, primeiro, a necessidade de combater a fome. Inclusive, num dado momento chegamos a usar o mesmo lema de Lula: o Fome Zero. E, segundo, a geração de empregos. Para isso, pensamos na criação de um banco de fomento que dê financiamento aos pequenos e médios agricultores, à pequena e média empresa porque, comprovadamente, são os que geram os maiores números de empregos no país. No entanto, atualmente, porque as taxas (…) muito altas e porque os bancos atuais do sistema financeiro não priorizam a esses setores. Por isso, esse estado de cuidados. Pelo nosso entendimento, fomentando, favorecendo o acesso desses setores a financiamentos – pequenos e médios agricultores, pequena e média empresa – poderemos reativar grande parte da produtividade do país. E isso implica geração de empregos. Havendo empregos haverá demanda e, então, isso cria uma dinâmica de mercado interno que, esperamos, melhore pelo menos no primeiro ano de governo. Ao final do primeiro ano de governo acreditamos que já observaremos sensíveis mudanças na atual situação – que é muito difícil – econômica do país.



Que forças políticas a frente sandinista agrega e que conjunto de forças  a campanha de Ortega conseguiu aglutinar?
Constituímos a chamada “Grande Aliança Unida, a Nicarágua Triunfa”, tendo como núcleo principal, digamos, a base partidária da frente sandinista. E sobre essa base vamos aglutinando setores da resistência nicaragüense, ou seja, setores que participaram da contra-revolução e agora se constituíram em partido político. Nós os atraímos e firmamos acordos, sobretudo em função de tirar o medo das pessoas. Porque as pessoas diziam “se voto na Frente e ela ganha as eleições, logo em seguida estoura uma guerra”. Mas, quando os que firmam acordos de paz, digamos, nesse contexto eleitoral, são aqueles que combateram e empunharam armas no passado isso traz uma mensagem de reconciliação….



Com o intuito também de isolar os candidatos da direita…
Exatamente. Isso determinou o discurso agressivo da direita, o discurso do medo em relação a ocorrer uma guerra com os sandinistas. Isso a neutralizou totalmente. Portanto, também abrimos pontes de aliança com personalidades de setores, como a democracia cristã. Por exemplo, ganhamos em nossas listas de deputados lugares pertencentes a partidos conservadores, da democracia cristã, dos étnicos. Fizemos uma aliança grande, pois agrega setores representativos de toda a sociedade. Isso também, digamos, fez a base votante da frente sandinista ampliar-se. E, desse modo, pudemos alcançar a vitória.



Qual é participação dos comunistas na Frente?
A frente congrega comunistas, socialistas, cristãos, católicos, evangélicos etc. É uma frente ampla. Há um programa que une, que aglutina todas as forças. Por isso falamos de Unidade, sem muita discussão, unidade em função de grandes linhas estratégicas. Por exemplo, reativar a produção, gerar empregos. Sem questionar os discursos ideológicos. É a prática em função de melhorar a situação do povo e isso permite-nos nos unir. Então, foi nessa direção que trabalhamos. Por isso, foi criada a chamada “Grande Aliança Unida, a Nicarágua Triunfa!”, para reconciliação e trabalho.



Sobre projeto de integração latino-americano que o presidente Chávez defende, o Lula defende, como o programa de Ortega trata esse tema?
Estamos ligados, digamos, a esse princípio da integração latino-americana. Isto é, se pensarmos na canção, de anos atrás, de Ricardo Arjonas, cantor centro-americano, que diz “o norte que foi sul”. Agora o nosso norte está sendo o sul. A América Central tem seu acordo firmado com os Estados Unidos um tratado de livre comércio. No entanto, nós temos de aproveitar isso que já está criado. Vamos trabalhar também em relação à alternativa bolivariana para os povos, bem como com o Mercosul. Temos grandes planos de trabalho para com o governo Lula poder fazer programas de cooperação muito importantes. Igualmente com Cuba, com Venezuela. E já estão em prática, porque milhares de nicaragüenses já podem tratar algumas enfermidades dos olhos em Caracas e em Havana. Já alfabetizamos grande quantidade de nicaragüenses com o método cubano “Sim, eu, posso!”. Tudo em função de elevar o bem-estar e o nível de vida do povo nicaragüense.



Tradução: Maria Lucília Ruy