Governo perde uma na Câmara, oposição outra no Senado

Por Franklin Martins, no iG
Dois fatos ocorridos ontem no Congresso mostram que estão em curso simultaneamente vários processos de acomodação de terreno que ainda não foram claramente entendidos pelas forças políticas.  Nem o governo, nem a oposiç

Na Câmara, uma surpresa para o governo: o pefelista Aroldo Cedraz derrotou com facilidade o petista Paulo Delgado na disputa por uma vaga do Tribunal de Contas da União. No Senado, uma surpresa para a oposição: PSDB e PFL marcharam separados na votação da medida provisória sobre o reajuste das aposentadorias. Resultado: a emenda que propunha o índice de 16,67% foi derrubada com folga.



Os otimistas no governo dirão – e têm alguma dose de razão – que as votações para vagas no TCU não expressam necessariamente a correlação de forças política no parlamento. Nessas decisões, mais do que as orientações dos partidos, tendem a predominar fatores como a simpatia e o trânsito pessoal dos candidatos entre os seus colegas. Cedraz é um deputado que navega com facilidade entre os seus pares, especialmente no baixo clero. Já Delgado pertence àquela nata do parlamento que freqüenta com mais desembaraço as páginas dos jornais do que as rodinhas de deputados. Na hora da caça ao voto, isso faz diferença.



No entanto, Delgado não foi candidato de si mesmo. Lançado inicialmente pelo PT, ele terminou convertendo-se em candidato da base governista depois de suplantar, numa prévia interna, nomes do PMDB e do PTB. Era o franco favorito no plenário, mas acabou colhendo apenas 148 votos contra 172 de Cedraz. Como o PSDB também apresentou candidato, dispersando em alguma medida as forças da oposição, a grande votação do pefelista deve-se provavelmente ao fato de que, por debaixo do pano, ele colheu muitos apoios na base governista. Ou seja, na prévia interna, o PT teria vencido, mas não convencido seus aliados, que deram o troco no plenário.



Parlamentares experientes avaliam que boa parte da base governista teria aproveitado a disputa de ontem para mandar um recado sobre a eleição do próximo da Câmara: por maior que seja sua bancada, o PT não pode pretender impor o nome do deputado Arlindo Chinaglia à base governista. Ou ele é aceito efetivamente pela maioria, ou pode ser cristianizado no plenário – mais ou menos como ocorreu com Delgado ontem.



Enquanto os governistas dividiam-se na Câmara, no Senado o racha deu-se na oposição. Pela primeira vez em quase quatro anos, PSDB e PFL não votaram juntos numa questão importante. O PFL apoiou em peso a emenda que elevava o índice de reajuste das aposentadorias para 16,67%, enquanto o PSDB liberou os integrantes de sua bancada. Mas o líder Artur Virgílio fez questão de subir à tribuna para dizer que era contra a aprovação da emenda, porque ela afetaria o equilíbrio das contas públicas e o ajuste fiscal. Garantiu que continuará fazendo uma oposição intransigente a Lula, mas com viés programático. De uma forma educada, disse que não contassem com ele para a guerrilha parlamentar, na base do “quanto pior, melhor”. Alguns pefelistas, em particular o senador Antônio Carlos Magalhães, ficaram irritadíssimos com Virgílio.



Embora os dois partidos tenham tido o cuidado de não transformar a divergência de ontem numa confrontação e tenham se preocupado em deixar claro que a aliança entre eles está acima de discrepâncias ocasionais, o fato é que, tanto no PSDB como no PFL, existe o sentimento de que, daqui para frente, a oposição terá de encontrar um novo ponto de equilíbrio para a ação conjunta. A unidade granítica entre os dois partidos dos últimos três ou quatro anos está em xeque (a esse respeito, ler a coluna “PSDB e PFL vão ter de discutir sua relação”, do dia 30 de novembro).