Crise aérea: Congresso debate controle militar da aviação

A atual crise no setor aéreo brasileiro acentuou a polêmica sobre o controle militar do tráfego na aviação civil, que chegou ao Congresso na última quarta-feira (6/12), após mais um dia tumultuado por atrasos e cancelamento de vôos.

Rebatendo a reivindicação de deputados da oposição e de empresas aéreas, o presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), descartou nesta quinta-feira (7/12) colocar em votação uma lei pela desmilitarização imediata do controle do tráfego aéreo.


 


“Eu acho precipitado encontrar atalhos ou diagnósticos fáceis para a crise. Atribuir à natureza militar da atividade a razão da crise é muito fácil e simples”, disse.


 


O sistema de controle do tráfego aéreo no Brasil é misto, situação sem paralelo em nenhuma outra nação do mundo. Exceto no Brasil e em Bangladesh, a responsabilidade pela aviação civil cabe a agências ou estruturas de governo civis.


 


Entulho da ditadura


 


No Brasil, a ditadura militar substituiu em 1969 o Departamento de Aeronáutica Civil, já subordinado desde 1941 ao Ministério da Aeronáutica, pelo antigo Departamento de Aviação Civil, composto inteiramente por militares da Aeronáutica e que, ao longo dos anos, também absorveu trabalhadores civis em seus serviços.


 


Respeitado mundialmente por seus indíces altos de segurança na aviação, o mais grave acidente da história da aviação no Brasil provocou a discussão do trabalho dos controladores de vôos, pessoas que são responsáveis pela monitoração e organização do tráfego aéreo civil do país.


 


Embora a função de controlador de vôo também seja desempenhada por alguns civis, a estrutura é toda militar. Os controladores civis são obrigados a respeitar a disciplina imposta pela Aeronáutica, sem direito a greves e questionamento de ordens superiores.


 


A natureza da função e a reivindicação dos profissionais por planos de carreira e melhores salários abriram um debate sobre a desmilitarização do setor, já que o governo não pode aumentar o rendimento da categoria sem reajustar todo o serviço militar brasileiro. A função, desempenhada por sargentos, tem como salário inicial cerca de R$ 1,1 mil reais mensais, salário idêntico para todos os sargentos da Aeronáutica em todo o Brasil.


 


O presidente da Associação de Controladores do Tráfego Aéreo do Rio de Janeiro, Jorge Nunes Oliveira, defendeu a desmilitarização. “A Aeronáutica continuaria sendo responsável pela defesa aérea, mas não quer abrir mão disso”, afirmou.


 


Promessa de “mais generosidade”


 


Os recursos da União destinados ao setor são, segundo ele, um dos motivos dessa resistência. O orçamento de 2006 previa um total de 530,24 milhões de reais somente para operação, manutenção e modernização do sistema de controle do espaço aéreo. O montante ficou mais enxuto na proposta do governo para 2007, antes da crise, atingindo 489 milhões de reais.


 


O relator da peça orçamentária no Congresso, senador Valdir Raupp (PMDB-RO), prometeu ser mais generoso e deve indicar novas receitas para garantir valores maiores.


 


Desde o fim de outubro, os passageiros têm enfrentado constantes atrasos e cancelamentos de vôos nos principais aeroportos do país. A crise foi desencadeada pela operação-padrão dos controladores por melhores condições de trabalho, após o acidente com o Boeing da Gol que matou 154 pessoas.


 


No início de novembro, a situação ficou ainda mais problemática, sem controladores suficientes para atender a demanda de decolagens. Cerca de 20 controladores foram afastados de suas funções em seguida ao acidente, por motivos de investigação.


 


Insinuações de boicote


 


Na última terça-feira, uma nova onda de atrasos e cancelamentos foi atribuída a uma pane no sistema de comunicação. Nos aeroportos, no entanto, a informação dada aos passageiros era de que as operações haviam entrado em ritmo lento em caráter de protesto. Não se ouviu falar em problema nos equipamentos.


 


“Claro que foi um boicote. Temos que desmilitarizar esse processo: primeiro, porque não podemos dar aumento geral (a todo o serviço militar brasileiro); segundo, porque temos que ampliar o número de controladores civis”, defendeu o deputado Carlito Merss (PT-SC).


 


Grupos que representam os controladores civis repudiaram as insinuações de boicote. Câmara e Senado anunciaram comissões parlamentares para atuar junto ao Ministério da Defesa e ao Comando da Aeronáutica. Uma audiência pública com todos os representantes do setor, inicialmente marcada para esta tarde, foi adiada para a próxima quarta-feira a pedido do ministro da Defesa, Waldir Pires.


 


Medidas drásticas


 


Aldo Rebelo havia cobrado quarta-feira do  governo a adoção de medidas “drásticas” para resolver a crise. “O governo deve adotar medidas drásticas para resolver a crise, porque o País não pode mais sustentar essa situação”, declarou.


 


“O assunto já assumiu certa gravidade. A paralisia quase completa da aviação comercial atrapalha a vida do brasileiro, da economia, do País e das instituições”, acrescentou. O deputado defendeu a permanência do ministro da Defesa, Waldir Pires, no cargo.


 


A demissão de Pires fora pedida, mais cedo, em sessão do plenário da Câmara, pelo líder do PFL, deputado Rodrigo Maia (RJ). “O ministro Waldir Pires é capaz, tem experiência e está à altura de enfrentar esse desafio”, afirmou o presidente da Câmara.