Emir Sader: Travar e destravar

Por Emir Sader, no Blog do Emir*
Lula colocou o tema de destravar o Brasil. Parece claro, mas há pelo menos dois diagnósticos sobre quais são as travas que obstaculizam o desenvolvimento do Brasil. Conforme as travas que definamos, teremos dois países

Quando a economia brasileira esgotou seu mais longo ciclo de crescimento, o diagnóstico que triunfou falava de travas. As travas seriam as regulamentações estatais, que impediam a livre circulação dos capitais, tanto dentro do Brasil, quanto na entrada e na saída de capitais, que tornariam muito cara a contratação da força de trabalho, entre outras travas. O governo FHC tratou de destravar a economia, na sua versão.



Vendeu a preço de banana o patrimônio público no processo de privatizações – o maior caso de corrupção da história brasileira. Ao mesmo tempo, facilitou a livre circulação de capitais e se deu o maior processo de transferência de capitais do setor produtivo ao especulativo, atraído por taxas de juros estratosféricas. Ao mesmo tempo favoreceu a entrada e a saída de capitais do país, com a chegada maciça de capitais especulativos, atraídos por essas taxas de juros.



A precarização dos contratos de trabalho – chamado eufemisticamente de “informalização” e de “flexibilização” das relações laborais -, ao invés de aumentar as contratações, produziu a situação em que a maioria dos brasileiros não tem mais carteira de trabalho, foram expropriados de seus direitos elementares, ao mesmo tempo que se elevou ao invés de diminuir o desemprego.



FHC considerava que o Estado deveria retrair-se para dar lugar mais ainda ao mercado – na educação e na saúde -, assim na falta de capacidade de controle e de regulamentação estatal. Os direitos sociais da população pioraram, o Estado ficou ainda mais impotente – de que a crise dos controladores aéreos é apenas um exemplo mais recente – e o Brasil ficou pior.



O Brasil ficou muito mais travado do que antes. Destravaram-se obstáculos para os grandes capitais. Travou-se o crescimento da economia e os direitos sociais. Travou-se a capacidade do Estado de fomentar o desenvolvimento e de redistribuir renda, assim de realizar prestações sociais. A herança recebida pelo governo Lula foi a de um país travado pela hegemonia do capital financeiro, pela precarização do mundo do trabalho, pelo desmonte do Estado, pela detetioriação dos direitos sociais e do nível de emprego.



Mas há outro diagnóstico das travas que sofre o Brasil. A livre circulação do capital financeiro – que não paga imposto para investir na Bolsa de Valores, que entra e sai do país impunemente -, a falta de investimento estatal, a ausência de garantias do direito de emprego, o achatamento produzido pelo monopólio privado dos meios de comunicação e de cultura, a concentração de renda, o pagamento das taxas de juros mais altas do mundo, assim como de um superávit fiscal superior até mesmo ao solicitado pelo FMI – são algumas das principais travas que realmente enfrenta o Brasil.



O segundo mandato de Lula pode favorecer ainda mais a livre circulação de capitais, dando continuidade a que os bancos sigam ganhando mais do que nunca, que os capitais se dirijam para a especulação e não para a produção, que os trabalhadores tenham cada vez menos empregos e menos direitos. Ou pode fazer com que o Estado se transforme em um instrumento de desenvolvimento econômico e social, redistribuindo renda e elevando o nível de emprego, fomentando a diversidade cultural e a democratização dos meios de comunicação.



Conforme o diagnóstico que o segundo governo Lula faça das travas, será esse governo: de prioridade para os bancos ou de prioridade para os pobres.



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