Aborto malfeito mata 68 mil mulheres ao ano; Brasil reage

Além de dados brasileiros, foram analisadas informações de outros 12 países, incluindo Egito, Uganda, Chile, Colômbia, Guatemala, Peru e México.

Abortos realizados em condições precárias nos países em desenvolvimento matam 68 mil mulheres por ano, de acordo com pesquisa de cientistas do Instituto Guttmacher, de Nova York. A prática faz ainda com que pelo menos 5 milhões de outras mulheres sejam hospitalizadas com infecções e outras complicações em países da América Latina, Caribe, África e Ásia, estima o estudo, publicado na revista científica Lancet.


 


A estimativa foi feita depois de analisados dados de 13 países, inclusive do Brasil, divulgados entre 1989 e 2003. Eles sugerem que cerca de 19 milhões de abortos em condições inadequadas são realizados no mundo todo a cada ano, entre práticas clandestinas e legalizadas.


 


A pesquisa, financiada pela Fundação Hewlett – que é favorável ao aborto -, diz que, por outro lado, as complicações resultantes de abortos que levem o paciente a necessitar de hospitalização são raras nos países desenvolvidos. O caso brasileiro, diz o estudo, é representativo das duas tendências na América Latina que os pesquisadores acreditam esconder desdobramentos positivos.


 


A primeira delas seria o aumento do número de internações, que poderiam sinalizar que mais mulheres estão buscando tratamento depois de abortos. Isso não só reduz o número de mortes como, acreditam os pesquisadores, mostra que o aborto já não é tão estigmatizado. Outra tendência seria o uso generalizado de medicamentos abortivos. Médicos alertam para os riscos desse método


 


Os pesquisadores do instituto nova-iorquino dizem, porém, que a maioria das mulheres que o testaram vão parar no hospital não tendo abortado completamente, o que, segundo os cientistas “pode ser simplesmente tratado com aspiração”, se feito em tempo. “O Brasil é um dos países na região com algumas provas dos dois tipos de progresso. Mas se acredita amplamente que essas condições se dêem em boa parte do continente”, diz o estudo.


 


Legalização
Para a responsável pela pesquisa, Susheela Singh, os dados mostram que “o impacto dos abortos sem segurança sobre a saúde é grande”. Ainda segundo ela, “a forma mais eficaz de eliminar esta causa altamente evitável de doenças maternas e mortes seria fazer de serviços legais e seguros de aborto algo disponível e acessível”. “Um segundo objetivo, de alcance mais imediato, é evitar casos de gravidez indesejada por meio do melhor uso de métodos anticoncepcionais”, afirmou Susheela.


 


Marge Berer, editora da publicação Reproductive Health Matters, também escreveu artigo na revista Lancet, afirmando que o estudo pinta um quadro sombrio. “Quando restrições legais ao aborto são reduzidas, a porcentagem de mortes diminui muito”, disse. Qualquer procedimento para pôr fim a uma gravidez indesejada praticado por indivíduos que não têm as habilidades necessárias – ou em um ambiente que não atende aos padrões médicos básicos – não é considerado seguro pela Organização Mundial da Saúde (OMS).


 


Já Paul Tully, secretário-geral da Sociedade para a Proteção dos Fetos, disse que as descobertas de Singh são suposições baseadas em estimativas. Tully também contestou a idéia de que a liberalização das leis do aborto leva a uma redução nas mortes e ferimentos entre gestantes. Segundo ele, dados confiáveis da Polônia, que impôs novas restrições legais ao aborto em meados da década de 90, indicam uma melhoria na saúde da mãe e do bebê, contradizendo essa tese.