Hezbolá expõe sua linha em encontro mundial solidário

''Resistamos!'' Com esta palavra de ordem, foi aberto nesta quinta-feira (16), em Beirute, o Encontro Internacional de Apoio à Resistência Libanesa. A reunião com representações de todo o mundo ouviu, na sua abertura, uma exposição do segundo homem do Hez

Cerca de 400 representantes de partidos políticos, sindicatos, movimentos sociais e populares, associações culturais, intelectuais e artistas, religiosos e personalidades de diferentes áreas de todo o mundo participaram hoje do ato de abertura do Encontro, que teve lugar no Palácio da Unesco, na capital libanesa.


 


Iniciativa de uma frente que inclui Hezbolá e PC


 


Todos os paises do Oriente Médio enviaram representantes. Os presentes vêm de todos os continentes. Da América Latina há representações de Cuba, México e Brasil, cuja delegação esta a cargo de Jose Reinaldo Carvalho, secretário de Relações Internacionais do PCdoB e diretor do Bebrapaz, Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz.


 


O Encontro vai até o dia 19, com várias mesas de trabalho. Entre muitos temas em debate figura o das estratégias de resistência. Cogita-se, ao final, convocar para o próximo ano um tribunal que julgue os crimes de guerra dos Estados Unidos no Líbano e em todo o Oriente Médio, a exemplo do Tribunal Russel, realizado em vários países a propósito dos crimes de guerra no Iraque e que teve uma de suas edições realizada  no Brasil, sob os auspícios do Cebrapaz, em abril deste ano no Recife.


 


A julgar pelo ambiente de combatividade e unidade política predominante no ato de abertura, pela envergadura dos principais oradores e pela concepção unitária na organização do encontro, o evento de Beirute tende a marcar profundamente a luta política no Oriente Médio e sinalizar uma tendência para o comportamento dos movimentos antiimperialistas em todo o mundo, inclusive os fóruns antiglobalização. 


 


O encontro foi organizado e está sendo dirigido conjuntamente pelo Hezbolá, o Partido Comunista Libanês, a Tribuna da Unidade Nacional (Terceira Via, do ex-primeiro-ministro Salim el-Hoss), o Movimento do Povo e a Rede das Associações da Sociedade Civil. Conta ainda com o apoio da Corrente Patriótica Livre, do general Aoun, um líder nacionalista que se reintegra ao movimento de resistência.


 


Ponto alto: fala o número dois do Hezbolá


 


O ponto alto do ato de abertura foi o pronunciamento do segundo homem do Hezbolá, o vice-secretário-geral Naim Kassem, que falou em nome do partido e do seu secretário-geral, Hassan Nasrallah. Retórica inflamada, frases torrenciais, expressões contundentes, mas sem perder a serenidade, o líder do Partido do Povo de Deus fez uma calorosa e amistosa saudação a ''todos os que vieram dos quatro cantos do mundo para apoiar a resistência''.


 


Naim Kassem, após agradecer esse apoio, disse que a presença internacionalista é uma indicação de que a luta contra a injustiça, o hegemonismo e o terrorismo dos Estados Unidos têm respaldo em todo o mundo. E assegurou que a luta do povo libanês também tem um sentido e um alcance internacionais: ''A Resistência que movemos e nosso país também tem um sentido de libertação do ser humano sem limites geográficos''.


 


O discurso do dirigente libanês é uma peça digna de um estudo e reflexão. Muitas idéias nele contidas servem para desmistificar a imagem do Hezbolá como uma milícia terrorista inspirada no fundamentalismo islâmico. E ajudam a explicar o porquê desta força ter imposto, em julho-agosto deste ano, uma humilhante derrota ao supostamente invencível exército de Israel, quando este invadiu o Líbano.


 


As principais idéias desenvolvidas pelo dirigente do Hezbolá são antes de tudo políticas. Têm a ver com uma estratégia e uma tática de luta antiimperialista e de liberação nacional que, para ser vitoriosa, necessita de uma ampla e sólida unidade do povo, e passa necessariamente pela aliança entre as forcas políticas nacionais, inclusive o Partido Comunista.


 


Naim Kassem parte de uma justificativa para a luta armada de resistência: ''Fizemos a resistência para nos defender e nos libertar de Israel, um inimigo  cuja historia é uma historia de agressões e massacres contra os povos árabes e tem uma imagem que se confunde com a de outro inimigo dos povos, os EUA, que praticam o hegemonismo''. O representante de Nasrallah enche-se de brios e proclama : ''Ambos os inimigos serão derrotados. Nós os destruiremos''. E faz uma contundente crítica de alcance internacional: ''A ultima guerra de Israel contra o Líbano teve alcance internacional, foi administrada pelos Estados Unidos e contou com o silêncio da comunidade internacional''.


 


A segunda ordem de idéias exposta no discurso do dirigente do Hezbolá diz respeito ao caráter popular da resistência  e à unidade nacional das forças que se opõem à ocupação e à agressão. ''Muito se fala sobre o papel do Hezbolá nessa resistência. Posso falar apenas da coragem dos combatentes que foram capazes de derrotar o exército de Israel, um exército que diziam se invencível. A Resistência islâmica é uma extensão de toda a justa resistência no Líbano e na Palestina, a Resistência é a vontade do povo. E não é apenas a luta armada, são as convicções do povo. Em torno desta luta e destas convicções é que se fará o consenso nacional. O consenso nacional é a unidade da Resistência, em nome do Líbano, com toda a diversidade das forças que a integram. Estamos aqui reunidos para lançar uma mensagem com pontos em comum, e caminhos claros, contra a hegemonia política do imperialismo norte-americano e de Israel na região e no mundo''.


 


É com essa perspectiva que o líder do movimento xiita (a confissão religiosa da maioria dos libaneses) encara a luta internacional: “Lutamos contra a unipolaridade imposta pelos Estados Unidos, que representam para todos os povos o caos e todo tipo de sofrimentos, pois a hegemonia estadunidense é destrutiva''. Apesar de toda a capacidade de destruição do imperialismo, porém, o líder do Hezbolá não o considera invencível. Pelo contrário: “A política norte-americana começa a fracassar. Hoje esse imperialismo é perseguido por várias maldições – a maldição iraquiana, a maldição palestina, a maldição libanesa e até mesmo a maldição latino-americana''.


 


Finalmente, o que pode ter surpreendido a muitos, o número dois do Hezbolá tratou com transparência e naturalidade o tema religioso e suas relações com o fundamentalismo, o terrorismo e as relações entre o Islã e outras visões de mundo. ''Alguns de vocês aqui presentes têm preocupações com o islamismo, por causa de algumas coisas terríveis que têm acontecido. Existem grupos que se crêem intérpretes de Deus, que julgam possuir a chave do paraíso, mas na verdade não representam a verdadeira orientação islâmica. O movimento islâmico vai da direita à esquerda. Há os movimentos islâmicos certos e os errados, os justos e os injustos, os verdadeiros e os falsos. Podemos os reconhecer entre nós, árabes, pela pratica política. Faço um apelo para que não se deixem levar pelo que se fala de nós. Unamo-nos contra as injustiças independentemente das ideologias''.