“Gilberto Gil fez o Ministério da Cultura existir”, diz Boal

Em entrevista a Eduardo Carvalho, da Agência Carta Maior, o dramaturgo Augusto Boal expressa seu ponto de vista sobre diversos temas da área de cultura. Faz, por exemplo, um balanço do ministério Gil e das perspectivas em relação ao segundo manda

Qual avaliação você tem da administração do Gil frente ao Ministério da Cultura durante este primeiro mandato do Lula?
O Gil finalmente fez com que o Ministério da Cultura passasse a existir. Antes, o MinC era uma organização burocrática que só existia no papel. Eu me lembro, por exemplo, de um fato ocorrido há cinco anos, que ilustra esta questão: em um quartel em São Paulo, havia a obrigatoriedade de um vigia ficar em uma torre sem fazer nada, só olhando. Um belo dia, o vigia teve a brilhante idéia de colocar um boneco com a farda em seu lugar e deixou-o lá com espingarda e tudo e desceu, com roupas de civil, para tratar da vida.


 


O Ministério da Cultura, até a entrada do Gil, funcionava como aquele vigia, ou seja, não tinha ninguém lá, só figurativamente, nada se fazia, ou muito pouco se fazia. E o Gil veio e revelou-se uma surpresa maravilhosa, pois muitos achavam que ele não ia dar certo, mesmo sendo o grande compositor e cantor que é, muitos julgavam que ele não teria o mesmo brilho em uma função administrativa.


 


Em termos de projetos e programas, o que você destacaria na atuação do Gil no Minc?
Além dos Pontos de Cultura, que, a meu ver, foi a ação mais importante, eu destacaria a mudança que se observa no cenário do cinema nacional. Passamos a ver filmes baianos, pernambucanos, etc. Uma verdadeira descentralização no eixo da produção cultural. Agora, eu gostaria de ver também filmes do Amazonas, do Tocantins, do Mato Grosso, do Ceará, do Piauí, etc. Mas o simples fato de já termos visto boas produções nordestinas já é um enorme avanço.


 


Para não ficar num discurso apenas laudatório, acho que faltou uma atenção especial à Serra da Capivara, no Piauí. Trata-se de um inestimável patrimônio da humanidade que se encontra sem recursos de preservação e estudo. Torço para que, neste segundo mandato do Lula, e do Gil, pois espero que ele continue, uma atenção especial seja dada ao Parque Nacional da Serra da Capivara e ao Museu do Homem Americano.


 


Quais suas perspectivas para o segundo mandato do Lula?
Bem, o Lula já prometeu, logo depois de reeleito, portanto não é promessa de campanha, que este mandato será muito melhor do que o primeiro. Acho que o primeiro, só com a bolsa família e outros programas sociais que ele implantou, já representou um passo gigantesco se pensarmos que 11 milhões de famílias, traduzidas num montante de 40 milhões de indivíduos, passaram a comer.


 


Isso é algo inestimável! Agora ele promete que será muito melhor. Isso deve significar que haverá mais desenvolvimento, mais cultura, mais reforma agrária, mais de tudo aquilo que estamos há tanto tempo esperando.


 


Você julga que, no primeiro mandato, ele não teve condições de atender a estas demandas que promete contemplar agora no segundo?
No primeiro mandato ele teve condições de arrumar a casa, seja no campo da cultura, das relações exteriores, da educação, da Polícia Federal, do Ministério da Justiça, da economia. Agora, como a casa está arrumada, a expectativa é a de que o avanço seja mais rápido e contemple questões que ainda não foram cabalmente resolvidas.


 


Se você fosse recebido pelo presidente Lula em audiência e pudesse apresentar uma pauta mínima de reivindicações pontuais, quais seriam?
Na cultura, que o Gil permaneça e multiplique sua ação – se possível com mais recursos. No campo da Relações Exteriores, que continue a aproximação com a África, com a Ásia e com a América Latina. Que se faça a reforma agrária com urgência e que se preste atenção especial ao caso da Serra da Capivara. São tantas coisas urgentes!