Everaldo Augusto: O sindicalismo mundial e a fundação da CIS

Confira o artigo de Everaldo Augusto, um dos delegados presentes ao congresso fundador da CIS (Confederação Internacional Sindical). A nova entidade do sindicalismo mundial já nasce permeada de polêmicas.

Sindicalismo internacional


CIS, unidade pela metade e ao largo da globalização


 


Por Everaldo Augusto*


 


Neste mês de novembro o mapa sindical mundial sofreu uma mudança significativa. A CMT (Confederação Mundial do Trabalho), fundada em 1920, de orientação cristã, e a CIOSL (Confederação Internacional de Sindicatos Livres), criada em 1949 como instrumento da guerra fria pró-Inglaterra, de orientação liberal, se fundiram e criaram a CIS (Confederação Internacional Sindical), que pretende se colocar como representação unitária, plural e democrática dos trabalhadores em âmbito mundial.


 


Para o velho sindicalismo burocrático, vinculado aos interesses dos organismos internacionais do capital e defensor do plurisindicalismo, este fato já está dado, restando apenas às outras correntes de pensamento aderirem à CIS. Para outros, de matiz esquerdista, mas sedentos em serem reconhecidos pelos primeiros como força secundária, a unidade internacional dos trabalhadores tomou novos e promissores rumos a partir do Congresso fundador da CIS. Para aqueles de origem na esquerda, mas que estão se aproximando agora deste campo das antigas CIOSL/CMT, a fusão foi apenas um primeiro passo rumo à unidade, outros passos serão necessários, portanto.


 


Contudo, para uma parte significativa do movimento sindical independente, classista ou alinhado à FSM (Federação Sindical Mundial), entidade que representa sindicatos de orientação nacionalista, anti-imperialista e comunistas, a questão da unidade, da pluralidade ideológica e da democracia continuam em aberto, em busca de solução. Para estes sindicatos, democracia, pluralidade e unidade, continuam sendo problemas candentes dos trabalhadores, fundamentais para uma resposta de conjunto da classe diante da ofensiva do capital contra os direitos sociais e trabalhistas e essencial para se contrapor à guerra e conquistar a paz no mundo.


 


Congreso da CIS
Cerca de 2 mil delegados de todos os continentes se reuniram em Viena, capital da Áustria, de 1º a 03 de novembro, no Congresso de fundação da nova Central sindical internacional. Ali estavam, do lado da CMT, 144 organizações, que reivindicavam representar 17 milhões de filiados, e do lado da CIOSL, 241 organizações, 215 confederações, que reivindicavam representar cerca de 150 milhões de filiados.


 


Pelo que se vê, foi um Congresso de porte, não só pelos números apresentados, mas também pela representação em si. Estavam ali sindicatos de todos os continentes, com diferentes práticas sindicais, com diferenciado grau de organização e de formas de abordagem dos problemas dos trabalhadores. Foi também um importante evento internacional, sobretudo, pelo contexto em que estava sendo realizado. Contexto, no qual, a globalização neoliberal já demonstrou o seu caráter nocivo para os povos, que provoca pobreza e exclusão social de um lado e concentração extrema da riqueza do outro lado, cuja característica principal é a onda regressiva e destrutiva contra o trabalho em escala mundial.


 


Ainda que o Congresso tivesse por finalidade fundar a nova Central, seria natural, diante desse contexto político, econômico e social, como seria natural em qualquer outro evento internacional da mesma natureza e no mesmo contexto, que fosse aberto um debate acirrado sobre as saídas, do ponto de vista dos trabalhadores, para enfrentar e derrotar as estratégias dos oligopólios em âmbito mundial e dos governos locais. Assim como seria natural também, o Congresso apresentar alternativas para a construção de um novo modelo econômico, social e político, baseado no desenvolvimento, na distribuição de riqueza, na valorização do trabalho e no aprofundamento da democracia.


 


Infelizmente, pode-se dizer, ou como já era esperado, como diriam os céticos, tal debate não ocorreu, salvo em alguns discursos, sobretudo de delegados da América Latina ou da África. A orientação geral do Congresso foi se limitar a fazer um diagnóstico superficial, baseado na adjetivação da mundialização do capital e de levantar premissas genéricas sobre trabalho decente e contra a pobreza. Não se discutiu a origem da degradação do trabalho e não se apresentou um plano de ação concreto para as Centrais e Confederações implementarem em cada país. Desse ponto de vista, os delegados voltaram desarmados para seus locais de origem, o que é grave, já que cada vez mais a situação política exige respostas globais dos trabalhadores frente a ofensiva do capital. Resta a expectativa que estas e outras questões sejam analisadas na próxima reunião do Conselho de setenta membros aprovado pelo Congresso, onde algumas Centrais proporão medidas concretas, como a realização de um dia mundial de protesto e luta pelos direitos sociais.


 


Não há, contudo, nenhuma garantia que este Conselho tomará medias desta natureza devido à correlação de forças nele existente, onde permanece a hegemonia política-ideológica da antiga CIOSL, agora piorada com a chegada da turma da CMT, que alguns consideram ainda mais à direita.


 


“Unidade pela metade”


Se não houve a discussão sobre a plataforma de ação comum, pois o debate sobre a globalização deu-se apenas em painéis com duas mesas formadas por sindicalistas europeus e americanos, ongs e representantes de organismos multilaterias como a OMC e OIT, a unidade tão aclamada pelos oradores oficiais também deixou a desejar. Mesmo que, durante e após o Congresso, representantes da nova Central tenham se esforçado em apresentar a fusão como significado de unidade, é inegável que a ausência da FSM e de organizações sindicais da China, do Vietnã e outras Centrais da Ásia, assim como de diversas outras Centrais independentes das Américas e de outros continentes era algo notável sem grande esforço.


 


Prevaleceu em boa parte dos delegados, em particular, entre aqueles das Centrais e Confederações mais à esquerda, a idéia que a unidade ali apresentada estava pela metade. “Não se pode omitir a existência de outro campo importante do movimento sindical que não estava ali presente”, diziam eles nas conversas paralelas. Independente de críticas à FSM, diversos sindicalistas europeus, berço na nova Central, admitiam que a unidade apresentada ali apresentada era apenas “o primeiro passo” e que o modo excessivamente formal do Congresso fundador da CIS, será substituído, no futuro, por um processo de explicitação de divergências.


 


A novidade apresentada no Congresso da CIS foi a filiação de oito Centrais sindicais independentes, ex-filiadas ou aliadas da FSM, dentre elas merecem destaque a CGT Francesa, a CUT Colômbia e a CAT, Argentina. A esse respeito foi dito ainda em plenário por Emílio Gablagio, ex-secretário geral da CES (Confederação Européia de Sindicatos), que a CGTP Portugal, CGTP Peru e PIT-CNT Uruguai estão em vias de conversação para aderirem à CIS.


 


O sítio da nova Central (www.ituc-cis.org) informa que a CIS representa 168 milhões de trabalhadores, de 154 paises, agrupados em 306 organizações sindicais. Guy Ryder, inglês, profissional sindical, que começou a carreira como assessor do departamento internacional do TUC (Trade Union Congress), ex-secretário geral da CIOSL, será o novo secretário-geral da CIS. A presidente será a australiana Sharan Burrow, esta uma sindicalista de origem. 


 


* Everaldo Augusto é da executiva nacional da CUT e da CSC. Foi delegado ao Congresso fundador da CIS