ONU, Vaticano e árabes repudiam pena de morte contra Hussein

O ex-presidente do Iraque, Saddam Hussein, foi condenado neste domingo (5/11) à morte por enforcamento pelo tribunal instalado pelos ocupantes anglo-americanos. Diversos países e organizações protestaram contra a pena, afirmando que o tribunal carece de l

O Vaticano, através do cardeal Renato Raffaele Martino, presidente do Conselho pontifical Justiça e Paz, lamentou a condenação à morte — uma sentença que significa, segundo ele, que o Iraque ainda está ''no estágio do olho por olho, dente por dente''.


 


''Na minha opinião, punir um crime com outro crime, é o mesmo que matar para se vingar'', resumiu o cardeal.


 


Se Saddam Hussein tivesse confiado à Corte Penal Internacional, ''não teria sido condenado à pena capital'', uma vez que esta condenação não está prevista nos estatutos da CPI, destacou o cardeal Martino.


 


''O Iraque faz parte destes países que não fizeram a escolha civilizada de abolir a pena de morte. Hoje, a sociedade moderna dispõe de todos os meios para tornar inofensivo aquele que cometeu um crime, sem recorrer à pena capital'', lamentou o cardeal.


 


Nos Estados Unidos, que vive campanha eleitoral que pode desalojar os republicanos da liderança das duas casas do parlamento (Representantes e Senado), o chefe da Casa Branca, George W. Bush, afirmou que a condenação à morte do ex-presidente Saddam Hussein é uma ''grande conquista'' para o Iraque e de uma ''etapa'' no caminho da democracia.


 


Em Berlim, a chanceler alemã Angela Merkel felicitou-se com o resultado do julgamento feito pelo tribunal instalado pela ocupação anglo-americana, lembrando, no entanto, que existe no seio da União Européia ''um ceticismo e uma rejeição à aplicação da pena de morte'', pronunciada contra o ex-presidente iraquiano.


 


A presidência da UE recordou em comunicado a posição ''contra a pena de morte. ''A UE se opõe à pena capital em todos os casos e toda a circunstância, e conclama a que não seja aplicada neste caso'', destacou.


 


Antes, a presidência finlandesa da União Européia (UE) havia pedido em comunicado ao Iraque que não aplicasse a pena de morte pronunciada contra o ex-presidente.


 


''Nos últimos anos, a UE condenou sistematicamente as violações extremamente graves dos direitos humanos e do direito humanitário internacional cometidas pelo 'regime' de Saddam Hussein'', alegou.


 


O governo britânico — uma dos mais fiéis aliados da ocupação perpetrada pelos americanos contra o Iraque, foi o primeiro a reagir. ''Estou satisfeita com o fato de que Saddam Hussein e os outros acusados terem sido apresentados à justiça, para responder por seus crimes'', declarou a ministra britânica das Relações Exteriores, Margaret Beckett, alguns minutos após o anúncio do veredicto em Bagdá.


 


''Crimes hediondos foram praticados durante o regime de Saddam Hussein. É justo que os que foram acusados de ter cometido tais crimes contra o povo iraquiano sejam julgados pela justiça iraquiana'', trovejou.


 


A França declarou ''tomar nota da sentença decretada pela justiça iraquiana'', mas lembrou a posição francesa e européia em favor da abolição da pena de morte e disse esperar que o anúncio do veredicto ''não provoque novas tensões'' no Iraque.


 


O chefe do governo italiano, Romano Prodi, considerou que a condenação de Hussein refletia ''o julgamento de toda a comunidade internacional'' sobre este ''ditador'', mas ressaltou a necessidade de promover ''uma reflexão sobre a pena de morte''.


 


Considerando que ''como qualquer dirigente político, Hussein deve responder de seus atos'', o chefe do governo espanhol, José Luis Rodriguez Zapatero, também lembrou que a União Européia (UE) é contra a pena de morte.


 


A Suécia teve a mesma reação: ao mesmo tempo que lamentou que o Iraque não tenha ''decidido abolir a pena de morte'', o ministro das Relações Exteriores, Carl Bildt, considerou ''satisfatório e importante que os que carregam a maior responsabilidade por crimes contra a humanidade sejam agora responsáveis por seus atos''.


 


Em Bagdá, a organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch (HRW), questionou a imparcialidade do processo. E considerou que o julgamento do ex-presidente iraquiano Hussein, pela execução de 148 xiitas de Dujail nos anos 80, ''fracassou no momento de estabelecer a verdade dos fatos e, consequentemente, desperdiçou uma oportunidade de fazer justiça às vítimas''.


 


O julgamento fracassou no momento de fazer um relatório indiscutível dos fatos e da responsabilidade do ocorrido, declarou Richard Dicker, responsável da justiça internacional da HRW.


 


Em Genebra, Louise Arbour, alta comissária para os direitos humanos na ONU, lançou um apelo para que as autoridades iraquianas respeitem ''plenamente o direito de apelação das pessoas condenadas pelo Alto Tribunal Penal iraquiano'', referindo-se a Saddam Hussein e os demais acusados.


 


Em comunicado, Arbour pediu ainda a ''moratória'' da pena de morte decretada a Hussein e seus dois principais colaboradores.


 


Segundo Arbour, um processo de apelação crível é uma parte essencial das garantias para um julgamento justo e igualitário. ''Isto é particularmente importante para esta instância (o Alto Tribunal Penal), onde foi decretada a pena de morte'', acrescentou.


 


''Os que foram condenados devem se beneficiar de todas as possibilidades de recurso e, independentemente do resultado da apelação, espero que o governo pronunciará uma moratória para as execuções'', insistiu.


 


Na Nigéria, a mais alta instituição islâmica também questionou a imparcialidade do tribunal. Saddam Hussein ''era uma personalidade temível, mas ele tinha o direito de ter um julgamento justo para que a justiça seja realmente feita'', declarou o secretário-geral do Conselho supremo nigeriano dos assuntos islâmicos.


 


Irã e Kuwait, países que viveram guerras contra o Iraque governado por Hussein, demonstraram ''satisfação''.


 


Antes mesmo do anúncio do veredicto, Teerã considerou que a execução seria ''a pena mínima'' merecida pelo ex-presidente iraquiano. No Kuwait, ocupado pelo exército iraquiano há 16 anos, a mídia americana afirmou que o anúncio do veredicto ''provocou cenas de alegria nas ruas''.


 


Em Bagdá, o primeiro-ministro Nuri al-Maliki considerou a condenação um marco ''do fim de um período negro'', mas o presidente Jalal Talabani, em visita a Paris, não quis comentar o veredicto, sob o cínico argumento de ''evitar qualquer ingerência'' no poder judiciário — uma vez que os condenados ainda podem recorrer da sentença, mas chamou o pretenso julgamento de ''justo''.


 


Talabani mudou o principal juiz do que ele chama de ''julgamento justo'' há cerca de 45 dias, sob a alegação de que o juiz anterior seria ''condescendente'' com Hussein. A China não fez comentário sobre o caso, afirmando que não debaterá assuntos internos iraquianos.


 


Hussein foi condenado à morte por enforcamento neste domingo pelo Alto tribunal penal iraquiano, instalado pelas forças de ocupação anglo-americanas. O pretenso julgamento, ilegal do ponto de vista da Lei Internacional, acusou o ex-presidente do Iraque de ter agido a favor da suposta execução de 148 moradores xiitas da aldeia de Dujail nos anos 80, em represália a um suposto ataque contra o comboio em que estava.


 


Outras duas condenações à morte foram pronunciadas, uma delas contra o meio-irmão de Saddam Hussein, Barzan al-Tikriti, e a outra contra o ex-presidente do tribunal revolucionário, Awad Ahmed al-Bandar. O ex-vice-presidente Taha Yassin Ramadan, foi condenado à prisão perpétua.