Jairo Nicolau questiona vigência da cláusula de barreira

Quem foi eleito em 1º de outubro ” tomará posse e gozará de plenos direitos para cumprir o seu mandato”, opina, questionando a “clausula de barreira”, o professor Jairo Nicolau. Pesquisador do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro

A opinião está no artigo A cláusula de Barreira em 2006, publicado originalmente no jornal O Globo. Embora ele date de antes da eleição (em 24/08/2006), o Vermelho o reproduz agora devido ao debate suscitado após o 1º de outubro pela dupla e controvertida “cláusula de barreira”.



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O jornalista anunciou na televisão: partidos que não receberem pelo menos 5% dos votos para a Câmara dos Deputados nas eleições de 2006 não terão representantes em Brasília. Militantes dos pequenos partidos repetem: está em vigor uma lei que não permitirá que os deputados eleitos tomem posse. Na realidade, a lei sobre o assunto não é clara, o que tem dado margem a interpretações equivocadas, como as repetidas pelo jornalista e as propagadas pelos militantes. O esclarecimento desse tópico antes das eleições é fundamental para orientação dos dirigentes partidários e eleitores. De outro modo, poderemos ter uma enorme controvérsia jurídica após as eleições, com graves conseqüências para a legitimidade do pleito.



Muitos paises exigem que os partidos obtenham uma votação mínima para eleger
representantes à Câmara dos Deputados (cláusula de barreira). Na Alemanha, por  exemplo, um partido necessita receber 5% do votos, na Suécia 4%, e em Israel 1,5%.Nesses paises, o primeiro movimento durante a contagem dos votos é observar se os partidos atingiram o patamar exigido. Caso isso não aconteça, seu votos são desconsiderados para efeito de distribuição das cadeiras; ou seja, esses votos funcionam na pratica como votos anulados. É importante frisar esse ponto: os votos recebidos pelos partidos que não ultrapassam a cláusula de barreira não são contabilizados para a distribuição de cadeiras.


 


A Lei Partidária de 1995 diz que os partidos brasileiros terão direito a funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legislativas para as quais tenham elegido representante, caso obtenham 5% dos votos (excluídos brancos e nulos) distribuídos em, pelo menos nove Estados, com um mínimo 2% em cada um deles. A lei estabeleceu ainda estágios intermediários: entre 1995 e janeiro de 1999, todo partido com registro definitivo  teve garantido o funcionamento parlamentar; entre fevereiro de 1999 e a proclamação dos resultados das eleições de 2006 (que deve ocorrer em outubro desse ano) o funcionamento parlamentar estava condicionado à obtenção de 1% dos votos para Câmara dos Deputados e à eleição de deputados em cinco estados. Portanto, eis que na terceira eleição (2006) depois da promulgação da lei é chegada a hora da entrada em vigor da regra dos 5%.


 


Mas afinal o que é o funcionamento parlamentar? Seria proibir que os deputados eleitos por legendas que não obtiveram o patamar mínimo de votos fiquem de fora da Câmara dos Deputados? Não. Por duas razões. A primeira é que a lei fala casas legislativas para os quais tenham elegido representantes. Ou seja, reconhece que os votos desses partidos serão contados e os deputados que concorrem por eles serão eleitos. A segunda é que nas duas últimas legislaturas, em que a regra de 1% esteve em vigor, nenhum partido deixou de funcionar. Por exemplo o Prona, não cumpriu a exigência de eleger deputados em cinco estados, mas garantiu seu funcionamento sem problemas. Na legislatura anterior, o mesmo aconteceu com o PV.


 


Mas afinal o que é o funcionamento parlamentar? Não tenho a mínima idéia. Alguns dizem que os partidos perderiam o direito a uma série de benefícios no interior da Câmara dos Deputados e Assembéias Legislativas: participação nas comissões, indicação de voto nas votações nominais, ausência de benefícios materiais e assessoria especial. Nesse cenário, não restaria outra opção aos deputados eleitos pelos partidos que não cumpriram as exigências a não ser migrarem para os partidos maiores. Do contrário, ficariam como deputados-zumbis, almas sem plenos direitos legislativos, condenadas a vagar pelos corredores do Legislativo. Ainda que essa seja uma interpretação possível, ela não tem nenhuma base legal.


 


Não existe lei regulando a matéria, nem o regimento interno da Câmara dos Deputados faz referência à regra dos 5%. Qualquer decisão sobre o assunto, após o dia das eleições será um desrepeito a vontade do eleitor expressa nas urnas. Casuísmo, como se chamava outrora.


 


Os legisladores inventaram uma figura estranha, a de funcionamento parlamentar. Tiveram tempo, e não regularam a matéria. Nas duas ultimas legislaturas ela foi ignorada. Portanto, quem for eleito tomará posse e gozará de plenos direitos para cumprir o seu mandato. Só é possível terminar sugerindo ao jornalista que mude a sua fala e aos militantes que façam as suas campanhas.


 


Fonte: http://jaironicolau.iuperj.br