Emir Sader: O Estado em debate no 2º turno

Por Emir Sader*
Mais além das árvores do debate político, alguns temas fundamentais foram sendo incluídos na campanha eleitoral. Os gastos do governo é um deles, demarcando diferenças entre o Estado mínimo da plataforma liberal de Alckmin e a melhoria

Outros deles: a acentuação do privilégio das políticas de integração regional – Mercosul, Comunidade Sul-Americana de Nações, alianças Sul/Sul, como as com a Índia e a África do Sul, o Grupo dos 20 – da parte de Lula e o foco na Alca, nos tratados de livre comércio, antes de tudo com os EUA, bem como na prioridade das relações políticas e comerciais com os paises do centro do capitalismo por Alckmin.
O fortalecimento de políticas reguladoras por parte do Estado por Lula e a extensão do papel do mercado por Alckmin.



Todo o debate se faz no marco da hegemonia de idéias levadas a cabo – na teoria e na prática – pelo liberalismo político e econômico. Este consolidou-se com um poder aparentemente incontrolável de influência. A combinação entre o esgotamento do ciclo expansivo do segundo pós-guerra, havia tido no Estado uma alavanca importante e que desembocou – aqui na América Latina – em processos de inflação descontrolada, ao mesmo tempo do fim da URSS – que aparecia como o mais modelo mais radical de economia estatizada -, promoveram a condenação do Estado. Este se tornou o vilão de tudo: responsável pela inflação, pelo declínio do crescimento, pela suposta ineficácia das empresas estatais, pela má prestação de serviços à população, pela burocracia, até mesmo pela corrupção.



A conseqüência? Estado mínimo, menos Estado e mais mercado, mais privatização, mais programas privados de saúde e de educação, etc., etc., cantilena que povoou os discursos e os artigos da imprensa nestas duas ou três décadas.



De repente, o candidato que começou pregando um “choque de gestão” – que implicaria basicamente maior retração do Estado -, que segue o processo de privatizações do seu governo em São Paulo – agora centrado na Nossa Caixa -, passa à defensiva e se propõe a assinar um documento em que se compromete a não privatizar mais. Contradiz declarações reiteradas de seus principais assessores econômicos – entre eles notoriamente Luiz Carlos Mendonça de Barros – de que a meta é a privatização da Petrobrás, medida a favor da qual reiterou sua adesão o ex-presidente FHC.



Privatização passou a ser uma palavra feia. O governo que havia promovido a venda de ações da Petrobrás, que chegou a mudar o nome da empresa para Petrobrax, para tirar-lhe o caráter de estatal no nome e preparar sua “globalização” – eufemismo para privatização – passa a ser repudiado pelo candidato do mesmo bloco que governou durante 8 anos.



O que teria mudado para que o Estado passe a ser reivindicado até mesmo pelo candidato do bloco conservador? É que os sucessos do governo Lula têm a ver com políticas que fortalecem a presença da esfera pública – como as políticas de assistência social, de educação, de cultura, entre outras. Da mesma forma que a política externa – o fator de maior diferenciação entre os governos FCH e Lula – se assenta nos processos de integração regional e de alianças inter-governamentais com países do sul do mundo, onde o Estado e não o mercado – como seria o caso dos tratados de livre comércio, como a Alca – é o grande protagonista.



Essa é a maior novidade ideológica dos debates políticos da campanha eleitoral que se aproxima do seu final.



* Professor da UERJ; artigo tomado do Blog do Emir