Emprego na indústria cresce com aumento do consumo

Por André Barrocal na Agência Carta Maior*
A evolução do emprego industrial pode ser explicada pelo bom momento de áreas como refino de petróleo e, sobretudo, nas empresas do setor de alimentos, que estão fabricando mais para atender à compra crescente

A atividade das empresas industriais anda tímida este ano, com vendas estáveis e aumento moderado da produção, mas a criação de empregos mostra resultados considerados surpreendentes. O número de vagas subiu em agosto pela nona vez seguida. Desde janeiro, cresceu 2,55%, índice tido como “bastante expressivo” e principal destaque neste ano pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).



Consumo doméstico cresce forte



A evolução do emprego industrial pode ser explicada, segundo a CNI, pelo bom momento de áreas específicas, como refino de petróleo, produção de minérios e, sobretudo, de empresas de bens de consumo, especialmente alimentos, que estão fabricando mais para atender à compra crescente das famílias.



“O consumo doméstico está crescendo num ritmo bastante forte”, disse o economista-chefe da CNI, Flavio Castelo Branco, ao divulgar, nesta terça-feira (3), um boletim mensal sobre a atividade industrial. Segundo ele, o ritmo deve persistir até o fim do ano, pois se trata de época em que tradicionalmente as compras avançam, e não há sinais contrários.



Outra explicação é um certo otimismo empresarial sobre o futuro. Com boas perspectivas à vista, as indústrias estão substituindo funcionários temporários por efetivos (economizam com horas extras, que custam mais) e resistindo à idéia de demitir – inclusive porque cortar implica despesas com direitos trabalhistas.
“Se a economia desacelerar, vai chegar a ter demissão, mas não acredito. Mas também não haverá contratação forte no futuro”, afirmou Paulo Mol, também economista da CNI.



Consumo, salário mínimo e inflação



O aumento do consumo das famílias tem sido um fator importante para o país este ano, segundo cálculos que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) faz sobre a economia. Até junho, o IBGE registrara onze trimestres seguidos (desde o último de 2003) de compras em expansão, quando se compara com o período anterior.



As compras têm sido impulsionadas pelo aumento da renda real da população. De um lado, colaborou para isso o reajuste do salário mínimo em abril, o maior em 25 anos, elevando o poder de compra de quem recebe benefícios da Previdência Social, por exemplo. De outro, a inflação baixa, que enriquece o poder de compra de assalariados e beneficiados do bolsa-família


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Salários crescem há três anos



Em 2006, o total de salários pagos no Brasil deve crescer pelo terceiro ano seguido, o que não ocorre desde 1997. Em 2005, a massa salarial subiu 8%, segundo pesquisa anual do ministério do Trabalho. Em 2006, até agosto, avançou 6,2%, de acordo com o Banco Central (BC).



Outros estímulos ao consumo familiar este ano são o crédito consignado, empréstimo quitado com prestações descontadas do contracheque do tomador, e o dólar barato, que estimula a importação de eletrodomésticos e veículos, por exemplo. De janeiro a agosto, os bancos despejaram R$ 12 bilhões a mais na economia, via consignado. Até setembro, as importações subiram 20%, e o carro-chefe foram bens de consumo, com alta de 42%, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC).



Dólar e exportações



O dólar baixo facilitador do consumo de importados tem reflexos negativos, no entanto, sobre empresas exportadoras. O faturamento da indústria este ano, incluindo as vendas feitas no mercado interno, está praticamente igual à de 2005. Até agosto, teve ligeiro recuo de 0,08%, quando se faz a conta descontando efeitos típicos do calendário, a chamada sazonalidade.



O principal motivo do faturamento estável foi o preço do dólar, que caiu 14% até agosto, reduzindo o ganho dos exportadores – na hora de trocar o dólar das exportações por reais, receberam menos. A menor receita de exportações tem peso significativo no caixa das indústrias. De cada quatro reais que elas vendem, um vem do exterior, segundo a CNI.



A queda do faturamento das exportações levou certos segmentos industriais a dispensar funcionários ou a não contratar. Isso ocorreu com empresas de vestuário, calçados e móveis, por exemplo. Mas a estagnação ou a diminuição de empregos nestas áreas foi insuficiente, pelo menos até agora, para impedir que, na média, os postos de trabalho na indústria crescessem 2,55% entre janeiro e agosto.



Por causa da estabilidade nas vendas, a elevação do emprego industrial é tida como “surpreendente”. Ainda mais porque o total de horas trabalhadas pelos funcionários na indústria, um indicador da produção física de mercadorias, cresceu menos que o número de vagas. De acordo com Paulo Mol, esse é um fenômeno novo – contratar é uma coisa que empresário faz por último, só quando tem certeza de que a economia irá bem mesmo. Para entender o fenômeno, a CNI fará uma pesquisa específica.



Juros reais



O aumento do consumo das famílias cresce e tem compensado, do ponto de vista industrial, a perda de lucro com exportações, mas essa compensação continua sendo contida pelos juros altos do Banco Central. O juro cai desde setembro de 2005, mas só porque a inflação também recua. A parte do juro destinada a dar lucro limpo ao sistema financeiro (juro real) segue em torno de 10% ao ano, afetando produção e consumo – deixando a economia andando de “lado”, segundo a CNI.



“O juro impede o investimento na produção, é melhor para a empresa deixar o dinheiro numa aplicação financeira”, afirmou o presidente da Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais (Abamec), Edmilson Loureiro de Lyra. “Os juros caem há um ano, mas ainda continuam em patamar elevado. E as taxas ativas [praticadas pelos bancos em empréstimos ao consumidor] também, o que gera um grande comprometimento da renda das pessoas”, disse Castelo Branco, da CNI.



* Intertítulos do Vermelho