Bob Fernandes: Mídia faz cobertura ''vesga'' de eleições e CPIs

Para não dizer que tudo foi monótono no debate de três presidenciáveis nesta quarta-feira (13/9), é preciso destacar a participação do jornalista Bob Fernandes. Fugindo à linha repetitiva e previsível do programa, Bob questionou uma idéia absurda de He

Em outro momento, ainda melhor, pôs o candidato Geraldo Alckmin (PSDB) na parede, ao ''lembrá-lo'' de que o ex-presidente tucano Fernando Henrique Cardoso comprou votos de deputados para aprovar a emenda da reeleição.


 


Natural de Santos (SP), onde nasceu em 1955, Bob Fernandes é considerado um dos melhores repórteres – senão o melhor – de sua geração. Com larga experiência na cobertura política em Brasília, trabalhou por 15 anos com Mino Carta. Nesse período, fez mais de 150 matérias de capa para as semanais IstoÉ e a CartaCapital. Ao sair da Carta, em dezembro de 2005, mereceu até um editorial de Mino – que o chamava de ''Bob Capital''.


 


Trabalhou ainda em Veja, Tribuna da Bahia, Jornal do Brasil e Folha de S.Paulo, entre outros veículos. Fundou, neste ano, o ótimo site Terra Maganize. É seu contraponto à mídia brasileira, tão poderosa que, segundo Bob, ''cerca de 12 jornalistas conduzem a opinião pública a respeito da política nacional''.


 


Foi em Terra Magazine, por exemplo, que José Genoino deu seu primeiro depoimento público após se afastar da presidência do PT. Para o site, Bob fez também a bombástica entrevista com o governador paulista, Cláudio Lembo, espinafrando  a burguesia e ironizando seus aliados tucanos.


 


Um conselho: se você gosta de bom jornalismo, não perca os textos de Bob Fernandes. Antes, confira a entrevista que ele concedeu ao Vermelho, depois do debate entre presidenciáveis. O jornalista comenta a atuação ''vesga'' da mídia nesta eleição – que dá continuidade à cobertura da CPI. Também defendeu os debates eleitorais e disparou contra a reeleição. Confira.
 


A quem interessa um debate como este de hoje, sem polêmicas nem novidades, com tantas restrições impostas pelos candidatos e com discursos tão previsíveis?
Pode haver impacto dependendo da repercussão que a mídia dá no dia seguinte. O horário é ruim, mas sempre tem impacto na hora. O Portal Terra está aqui – certamente vai tratar disso amanhã. Assim como isso será tratado pela TV Gazeta novamente. É claro que isso tem um impacto. Agora, o ideal seria um horário mais cedo, para pegar a massa trabalhadora acordada. Mas sempre sou a favor do debate.


 


Do ponto de vista jornalístico, esta eleição é pouco atraente em termos de competitividade – de duelos mais chamativos?
Não, não. Eu acho engraçado: esse é o discurso da imprensa, que está sendo feito porque os candidatos, digamos, do establishment, tirando a Heloísa Helena, não estão à frente. Tanto é que ela disse que tem encontrado alegria, gente participando. Isso (a idéia de pouca competitividade) é um discurso, porque não está tendo segundo turno ainda. Se você tiver a possibilidade de segundo turno, vão dizer que (o pleito) está animadíssimo, está uma maravilha. Estão desconsiderando o povo. Dentro do universo de eleitores, há 50 milhões de pessoas – ou sei lá quantas – que estão escolhendo, por enquanto, um candidato (Lula). Como não é o candidato deles (da imprensa), estão dizendo que o povo não se interessa. Só que tem um povo que está feliz da vida e não quer mudar.


 


Essa tendência de continuidade não ocorre só na disputa presidencial. Há 17 governadores que tendem a se reeleger já no primeiro turno.
Porque a reeleição é um desastre, como o governador Mário Covas dizia à época (em que se votou a emenda). Foi uma criação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – e é óbvio que ela é um desastre. Eu, particularmente, sou parlamentarista. Concordo, e concordava à época, com o Covas. Eu me lembro de ele ter me dito no Palácio (dos Bandeirantes, sede do governo paulista) em conversas informais: ''Isso é um desastre''. Ele usou a palavra ''deslealdade''.


 


E Alckmin garantiu (ao responder a Bob no debate) que Covas jamais teria dito ''deslealdade''…
Usou a palavra ''deslealdade'', sim. Isso para não dizer que usou um amontoado de palavrões. Como ele (Covas) não está mais aqui, eu não vou… – entendeu? Ele acha que (a emenda da reeleição) foi uma coisa que o atingia, e é verdade. Ele estava se preparando para ser candidato a presidente da República e me disse: ''Isso vai ser um desastre''. E é. Porque o cara que entra está pensando em reeleição no primeiro dia. E a oposição faz uma oposição radical desde o primeiro dia para impedir a reeleição.
 


Qual é sua opinião sobre a cobertura da mídia nestas eleições?
Olha: essa é uma pergunta que tem uma resposta muito larga. Acho que a gente não vive um grande momento na imprensa. A cobertura começou nas CPIs do ano passado. Foram coberturas vesgas, visando a uma apuração vertical, acima de um único ente – que era o governo – e deixando de lado a verticalização da cobertura. Boa parte das pessoas que estavam ali interrogando não tinha condições – não resistiria a cinco minutos de interrogatório sobre sua vida pregressa. Então eu acho que começou errado lá atrás. Isso não é pra valer.


 


Como o Terra Magazine se contrapõe a esse modelo?
O Terra Maganize é uma revista absolutamente ampla, que comporta de tudo. Que reflete. Que tem hard news (notícias quentes, furos). Que tem análise. Que tem colunista. Na eleição, é outra coisa. É uma coisa mais complicada. Há uma série de regras que te amarram. Você só pode falar com um (candidato) e filmar se também falar com outros. Isso, para uma grande emissora, tudo bem. Mas para quem tem de fazer o day-by-day, é muito difícil falar com todos os candidatos.


 


É preciso mudar radicalmente essas regras?
Não, não é inventar nada. É fazer o bê-á-bá simples, que funcionou durantes anos. A gente fez isso na CartaCapital. É fazer o que tem de ser feito, sem se amarrar com nada. Não tem segredo. É querer, perceber e fazer.


 


De São Paulo,
André Cintra