Riqueza do cerrado pode desaparecer em Minas
Formação vegetal perdeu mais área (92, 5 mil hectares) em Minas, entre 2003 e 2005, do que a mata atlântica
Publicado 11/09/2006 15:31 | Editado 04/03/2020 16:52
Segunda maior formação vegetal brasileira, o cerrado, que ocupa 2 milhões de quilômetros quadrados no país, um quarto do território nacional e 32% de Minas Gerais, e tem seu dia comemorado nesta segunda-feira, perdeu quase quatro vezes mais áreas no estado que a mata atlântica, entre os anos de 2003 e 2005. Os dados são do Mapeamento e inventário da flora nativa e dos reflorestamentos de Minas Gerais, elaborado pela Universidade Florestal de Lavras (Ufla) e pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF). Foram devastados 92,5 mil hectares de cerrado, enquanto a mata atlântica, que é protegida por lei federal, perdeu 23,67 mil hectares.
O número é equivalente a 0,28% da área total do território mineiro. Pode parecer pouco, mas pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) alerta que se nenhuma medida for tomada para proteger o cerrado, ele vai desaparecer em 30 anos. São cerca de 11 mil espécies de plantas, um absurdo de riqueza biológica que só existe no Brasil. Temos um potencial pouco conhecido e estamos, literalmente, cortando-o pela raiz antes de usá-lo , diz o professor do Departamento de Zoologia do Instituto de Ciências Biológicas da UnB, Jader Marinho Filho.
Apesar do desmatamento ilegal de árvores para fazer lenha e carvão, por parte de siderúrgicas mineiras, na Serra do Cipó, na Grande BH, na contramão da destruição um projeto tenta preservar as espécies e alertar para o uso consciente do cerrado. O projeto é desenvolvido por meio de um viveiro, com mudas de frutos como jatobá, cagaita, araticum, que vão recompor matas ciliares e combater a braquiara.
Os números do desmatamento não assustam quem conhece a voracidade com que siderúrgicas mineiras avançam sobre esse bioma, promovendo o corte de árvores e golpes para encobrir a origem ilícita do carvão, matéria-prima obtida com sua queima. Recente investigação da Superintendência do Ibama na Bahia e da Polícia Federal (PF) revela que empresas mineiras de siderurgia, depois dos danos causados no estado, estendem a destruição para cidades do Oeste baiano, como Bom Jesus da Lapa, Vitória da Conquista, Brumado, Barreiras e Jaborandi.
Numa única investida da PF foi identificado o envolvimento de pelo menos 19 siderúrgicas de Sete Lagoas, que atuam no estado vizinho, desmatando, transportando ilegalmente o carvão e fraudando notas fiscais para acobertar o material. Levantamento preliminar indica que 15 mil metros cúbicos de matas da Bahia o equivalente a 2 mil campos de futebol são destruídos diariamente para alimentar os fornos de gusa. A dívida das empresas com o Ibama (BA) referente a multas aplicadas desde 1998 chega a R$ 18 milhões.
E pior: toda essa devastação ocorre com a conivência de funcionários de órgãos públicos, encarregados exatamente da preservação da biodiversidade. Ocorrências da PF e da Polícia Civil relacionam funcionários do Ibama e de órgãos ambientais responsáveis pela gestão florestal nos estados de Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo com as fraudes e o desmatamento ilegal. Foram presos na Bahia dois servidores federais este ano. “Uma já saiu e outro será exonerado”, diz o coordenador de Controle e Fiscalização do Ibama baiano, Alberto Gonçalves da Silva. Em Minas, nos dois últimos anos, o IEF instaurou 30 processos administrativos para apurar envolvimento de servidores com a chamada máfia do carvão .
Cinco pessoas foram exoneradas. A questão da devastação do cerrado não está ligada somente à siderurgia, mas também à expansão agrícola, à pecuária extensiva e à falta de implantação dos 20% de reserva legal. “Ainda temos muito o que melhorar, mas, em comparação à realidade de Minas Gerais há 10 anos, quando tínhamos de 200 mil a 400 mil hectares de desmatamento por ano, avançamos muito”, avalia o diretor-geral do IEF, Humberto Candeias.
Fonte: Portal UAI