Marcelo Barros: “A independência do Brasil e as eleições de outubro”

Na América Latina, povos vizinhos nossos, como os da Bolívia e da Venezuela, nos dão lições de organização da sociedade civil e conquistam passos significativos no sentido de uma democracia mais participativa que sirva a todas as camadas da população. É o

Todo brasileiro ama o 07 de setembro, embora seja notório que a independência política que o Estado brasileiro conquistou de Portugal em 1822 ainda não se traduziu, concretamente, em maior independência social e econômica para todo o povo brasileiro. De fato, independência não é algo que se conquiste uma vez por todas, nem se dá como em histórias de fadas, nas quais um príncipe concede a liberdade para o povo. É um processo permanente, a ser construído coletivamente, como mutirão de solidariedade.Este projeto de um Brasil livre, com verdadeira independência, social, política, econômica e pluricultural ganha novo teor nestes dias de campanha eleitoral. Enquanto os discursos dos políticos continuam prometendo um Brasil mais irreal do que uma ilha da fantasia, o primeiro desafio destas eleições será superar a desilusão com a esperança traída e o descrédito que o atual modelo político provoca na maioria da população. As pesquisas falam dos prováveis vencedores, mas nenhuma investiga o projeto de país que cada candidato representa. Talvez, os pesquisadores pensem ser inútil insistir em projeto ou programa de país, já que governantes e parlamentares eleitos se comportam como meros executores de normas e projetos que virão do FMI e das multinacionais cujos interesses ditam a agenda e governam o país.


 


Para ser justo com o atual governo, julgo que devemos reconhecer que, em meio a contradições e inúmeros erros cometidos, a política externa tem progredido na direção de reconstruir a dignidade do nosso povo. Apesar das conseqüências de 500 anos de colonialismo e dos descalabros do neo-liberalismo que aprofundou entre nós todas as desigualdades sociais e econômicas, nos últimos anos, conseguimos dizer aos senhores da guerra e dos dólares que o Brasil pertence aos brasileiros e não está à venda. Entretanto, esta política inovadora, não terá eficácia enquanto o pagamento da dívida externa, paga injustamente com o sangue do nosso povo, continuar a cada ano significando uma soma não sei quantas vezes maior do que todo o montante de reais que o governo dispõe para investir no país.


 


O estilo de campanha que vemos na rua apesar de todas as mudanças cosméticas mal disfarça o custo embutido. Entretanto, espero firmemente que, nestas eleições, além de votar nas pessoas certas, (infelizmente ninguém sequer fala em partidos ou programas), a maioria do povo tome consciência de que o poder político dado aos eleitos é uma delegação do poder popular. A atual constituição brasileira já abre brechas para que, através dos movimentos sociais organizados e das representações de classe e de bairros, possamos exercer o direito de cobrar e, quando necessário, interferir na gestão da coisa pública. O povo brasileiro sempre foi desconsiderado e posto de lado no exercício da vida política. Por isso, os que exercem o poder só se incomodam em ter a maioria no legislativo para aprovar os projetos nos quais têm interesse. O resultado dessa obsessão tem sido as alianças espúrias e vergonhosas que levam tantas pessoas a desacreditar nos políticos e no exercício da coisa pública.


 


Na América Latina, povos vizinhos nossos, como os da Bolívia e da Venezuela, nos dão lições de organização da sociedade civil e conquistam passos significativos no sentido de uma democracia mais participativa que sirva a todas as camadas da população. É o que, no Brasil, querem os movimentos populares, ao promoverem o 12º Grito dos Excluídos que acontecerá neste 07 de setembro com o lema: “Na força da indignação, sementes de transformação”.


 


Em muitas cidades, por todo o país, as ruas principais serão tomadas não pelo trânsito de veículos e sim pela marcha dos movimentos sociais. Em si mesma esta marcha já é um sinal da disposição de uma caminhada em que juntos e como cidadãos assumamos  o compromisso de transformar o Brasil em um país mais justo e igualitário. Manifestações como o Grito dos Excluídos podem parecer imediatamente pouco eficazes. No entanto, encerram uma metodologia de educação popular, na qual todos somos, ao mesmo tempo, alunos e professores.


 



* Monge beneditino e autor de 26 livros.


 


Fonte: Adital