Aumenta abismo econômico entre pobres e ricos nos EUA

Os ganhos reais para um trabalhador típico de jornada completa foram mais baixos em 2005 que em 1973, e os salários reais para um trabalhador típico só subiram 9% desde 1979, enquanto que a produtividade se elevou 67% no mesmo período, demonstram os dados

O demógrafo David Johnson, responsável pela divisão sobre estatísticas econômicas e de habitação do Escritório do Censo, reconheceu em coletiva de imprensa que os dados refletem “um aumento na desigualdade” entre as camadas de rendas diferentes da sociedade.


 


A concentração de riqueza é o resultado mais notável da economia estadunidense durante a década de 1990 e os primeiros anos deste novo século, no qual os mais ricos foram quase os únicos a gozar do chamado “auge econômico”, enquanto que a grande maioria obteve pouco ou nenhum fruto da prosperidade, de acordo com o que se vê em vários estudos e relatórios com dados oficiais recentes.


 


Renda média diminuiu


 


Hoje, salários e pagamentos formam a menor parte do Produto Interno Bruto (PIB), desde que o governo começou a registrar esses dados em 1947, e as unidades empresariais alcançaram a parte maior do PIB desde os anos 60, informou esta semana o jornal americano The New York Times.


 


E mesmo com a informação, divulgada na última terça-feira, de que a renda média dos lares aumentou em 2005, esse foi um aumento em lares cujos chefes de família têm mais de 65 anos de idade, enquanto que para as famílias de trabalhadores, a renda média na verdade diminuiu 0,5%, de acordo com análise realizada pelo Instituto de Políticas Econômicas (EPI, na sigla em inglês). Os dados do censo revelam também que, embora o valor médio da renda tenha aumentado, isso se atribui muito não a aumentos salariais, mas sim a mais horas extras ou mais pessoas empregadas por lar.


 


Com isso, segundo outras análises, a renda média por hora para os trabalhadores americanos caiu 2% desde 2003 em termos reais. Mais ainda, o governo federal anunciou que houve um aumento de quase um milhão de trabalhadores no total de pessoas sem seguro saúde me 2005, em comparação com o ano de 2004, elevando o total de estadunidenses sem seguro de saúde a 46,6 milhões.


 


Embora não tenha se registrado um aumento da taxa oficial de pobreza, o Centro de Prioridades Orçamentárias e Políticas (CBPP em inglês), assinalou que os pobres agora são mais pobres, já que o total pelo qual se considera que o rendimento de alguém está abaixo da linha da pobreza foi o mais alto jamais registrado.


 


Mas a EPI e a CBPP, entre outros organismos, assinalam que o mais notável de tudo isso é que está ocorrendo no quarto ano de uma recuperação econômica. Pela primeira vez, assinala a CBPP, a pobreza foi mais alta e o rendimento médio mais baixo, no quarto ano de uma recuperação, que no momento negativo mais intenso da última recessão.


 


Renda real menor que em 1973


 


A central sindical AFL-CIO indicou que o rendimento real para um trabalhador médio de jornada completa foi mais baixo em 2005 que em 1973 e que os salários reais para um trabalhador médio só aumentaram 9% desde 1979, enquanto a produtividade se elevou 67% em relação ao mesmo período. Por sua vez, em 2005 existem 5 milhões de pobres a mais que em 2000, número que inclui um milhão de crianças a mais.


 


Obviamente, alguém está usufruindo da recuperação econômica e os analistas indicam que isso fica claro quando se avalia a crescente desigualdade na distribuição da renda. A parte da renda nacional concentrada em 20% dos lares mais ricos é agora de 50,4%, a maior desde 1967. A renda dos lares situados na faixa média é de 14,6% enquanto que para aqueles que formam a faixa de 20% dos mais pobres, a parte no bolo da riqueza nacional cai para 3,5%, índice jamais registrado, segundo o EPI.


 


Não supreende, então, que os Estados Unidos registrem a maior desigualdade de renda no mundo desenvolvido, em comparação com outros 19 países membros da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Segundo a análise do EPI em seu anuário “The State of Working America 2006-2007”, em 2004 cerca de 16,9% da renda total ficou concentrada em só 1% dos lares mais ricos, os quais ficaram com 34,4% do valor líquido total e 42,2% de todos os bens financeiros líqüidos do país.


 


Para 1% dos lares mais ricos, a renda média era de 15 milhões de dólares. Para os lares da faixa mediana, a renda média era de US$ 81 mil. Cerca de 30% dos lares americanos contavam com um valor líquido abaixo de 10 mil dólares, enquanto 17% tinham um valor líquido de zero ou negativo.


 


Outros dados oferecidos pelo relatório do EPI incluem que, enquanto a riqueza média do 1% mais rico cresceu 3% ao ano (1,25 milhões), para a parcela situada nos 20% dos mais pobres, a renda média encolheu de menos US$ 8,7 mil para menos US$ 11,4 mil. A disparidade continua uma tendência histórica, observa a EPI, ao indicar que em princípio dos anos 1960 a parcela de 1% dos mais ricos tinha 125 vezes mais riqueza que o lar médio, enquanto em 2004 a diferença aumentou para 190 vezes mais.


 


Migrantes acusados


 


Comparados com 19 países desenvolvidos, os EUA contam com uma maior desigualdade de renda, maiores taxas de pobreza, um sistema de saúde caro e pouco efetivo e gente que trabalha mais horas e goza menos dias de descanso, conclui a EPI.


 


A financeira Goldman & Sachs informou recentemente para o New York Times, sem nenhuma timidez, que “a contribuição mais importante para as altas margens de lucros durante os últimos 5 anos foi a redução da participação dos trabalhadores na renda nacional”.


 


“Essa economia cresce apenas para os de cima”, declarou hoje John Sweeney, presidente da AFL-CIO. “As tendências econômicas profundas conduziram as famílias trabalhadoras a seu ponto de clivagem. Os trabalhadores não estão compartilhando da riqueza que ajudaram a gerar e a recuperação da economia de nossa nação não serviu de modo algum para recuperar a renda dos trabalhadores”, observou.


 


Da mesma forma que no México, alguns economistas oferecem outras explicações do motivo de a prosperidade não ser repartida, apesar das cifras macroeconômicas indicarem crescimento, incluídos o impacto da competição globalizada, o livre comércio, a tecnologia e outros aspectos menores. Nos EUA, alguns acusam os migrantes pelo arrocho dos níveis salariais.


 


Tempestade perfeita


 


Entretanto, as políticas que privilegiam os interesses empresariais e as camadas mais ricas — desde redução de impostos, incentivos econômicos, livre comércio e a quase anulação dos direitos trabalhistas — contribuem para desigualdade ser cada vez maior, observam sindicatos e outros críticos da política econômica estadunidense.


 


Sweeney anunciou que a central sindical está lançando sua maior campanha para as eleições legislativas, tentanto convertê-las em um referendo das políticas econômicas de Bush e objetivando acabar com a maioria republicana. “Parece que está sendo gerada a tempestade perfeita, que poderia muito bem varrer o controle republicano do Congresso nesse próximo outono (primavera no hemisfério sul e época de tempestades e furacões no hemisfério norte)”, afirmou o dirigente.


 


Mas, o poder dos sindicatos e organizações dos trabalhadores está, há décadas, no fundo do poço. A taxa de sindicalização do setor privado caiu hoje para apenas 7,8% dos trabalhadores, quando há 20 anos era mais de 15% e acima de 30% nos anos 1950.


 


Trabalhadores com pouco poder de resistência contra políticas econômicas baseadas na fé quase divina no chamado “mercado livre”, mas que na verdade são pretextos para sugar as riquezas de baixo para cima, com a privatização crescente e estável de serviços e programas de assistência governamentais, com o impacto da “globalização” empresarial, o mais importante é que seguem sendo supreendentes os resultados de tudo isso em algo tão velho e conhecido: os ricos ficam cada vez mais ricos e os pobres, cada vez mais pobres.