Mumia Abu-Jamal: “Os Estados Unidos da tortura”

O jornalista americano Múmia Abu-Jamal preso, no corredor da morte, desde 1982, acusado falsamente de matar um policial branco da Filadélfia que espancava seu irmão, analisa "Os Estados Unidos da tortura".

Abu-Jamal teve um julgamento viciado, deformado pela fraude e a mentira, sendo sentenciado à morte por suas idéias políticas. Militou na organização revolucionária "Panteras Negras" na sua juventude. Trabalhou como jornalista em programas de rádio, onde ganhou dos ouvintes o nome de "a voz dos que não têm voz", criticando o racismo e a brutalidade policial.

Durante vários anos, desde a ocupação dos Estados Unidos ao Iraque (e a instalação do governo títere iraquiano), o povo norte-americano tem escutado uma enormidade de promessas de paz. Eventos que serviriam supostamente para pacificar o povo como várias eleições, redação de uma “constituição”, prisão de Sadam Hussein, cada um supostamente para conduzir aos coros angelicais da paz e à igualmente celestial aparição da “democracia”.

De fato, estes atos têm levado a mais, não a menos, descontentamento; e a violência está estrangulando o país inteiro.

O comportamento do poder ocupante (os Estados Unidos) tem contribuído para chegar a esta situação aterradora, em grande parte devido à maneira como dezenas de milhares de iraquianos têm sido tratados quando caem nas garras dos norte-americanos.

Um recente livro sobre prisões dos Estados Unidos e – sim – sobre tortura no Iraque, Afeganistão e aqui, em casa, afirma que o governo norte-americano alimenta o nacionalismo e a resistência contra a ocupação com a sua ignorância, seu racismo e com a forma como trata os iraquianos detidos.

Basta só mencionar o tristemente célebre centro de tortura Abu Ghraib para, só com a menção desse nome, contar centenas de histórias. Mas o novo livro do escritor e ativista Kristian Williams, “Métodos Norte-americanos: Tortura e Lógica da Dominação”, (South End Press, Cambridge, MA., publicado nestes dias de maio de 2006), nos diz como outros povos foram tratados em outras partes desse país, em outros países, e aqui, nos Estados Unidos, para nos mostrar o quanto é central a tortura para o modo de vida norte-americano.

Naturalmente, se você é afro-americano ou nativo destas terras, esta idéia dificilmente lhe é nova. Mas, como a maioria dos olhos estão centrados na aterradora guerra contra o Iraque, Williams escreve: “Tortura é a técnica do império; o império é a estrutura ideológica e a infra-estrutura política da tortura.”

Williams sustenta que a tortura é um instrumento de dominação do estado e é usada para que, neste caso, os iraquianos saibam do poder absoluto dos Estados Unidos.

Ele menciona um relativamente pequeno, mas eloqüente, exemplo: a entrevista da revista “Guardian” com Huda al-Azawi, mulher iraquiana que, com toda sua família, esteve presa em Abu Ghraib, onde trabalhou recolhendo lixo. Disse Huda Al-Azawi:

"Como eu podia falar um pouquinho de inglês, me deram o trabalho de limpar latas de lixo. Nunca havia comida suficiente para nós e um dia, encontrei uma mulher velha que tinha desmaiado de fome. Os norte-americanos sempre comiam muita comida quente. Achei algo para comer em um pacote jogado numa lata de lixo; o dei à velha mulher. Os americanos me descobriram e me jogaram, como castigo, numa cela de um metro quadrado. Durante quatro horas espalharam água fria em todo meu corpo".

A senhora al-Azawi esteve incomunicável por 157 dias.

Repito, este é um caso relativamente pequeno, mas reflete como são tratadas as pessoas comuns que caem nas mãos dos norte-americanos. Pessoas têm sido forçadas a fazer coisas muito desagradáveis, mataram pessoas a golpes, humilharam e violentaram sexualmente a outras.

Porém, se não houvesse fotografias, quem escreveria sobre isso na grande mídia?

A ocupação de um país é um assunto de poder, de violência massiva, e de terror do país ocupante contra o povo invadido.

Williams afirma que tortura, seja em Abu Ghraib, na Unidade 2 da Estação de Polícia de Chicago, ou em qualquer instituição do estado, é uma arma para criar terror; e silêncio.

Escreve Williams:

“Tortura … não é incidental ao poder do estado; é característica desse poder. A tortura não representa uma falha do sistema; tortura é o sistema.” [p. 3]

E, claro, esta forma de tratar as pessoas não ocorreu… simplesmente.

Veio dos escalões mais altos do governo – da Casa Branca, do chamado Departamento de Justiça, do Departamento de Defesa. Todos enviaram as mesmas mensagens à tropa: “tudo está permitido”, “façam o que têm que fazer”, etc., etc..

Que tudo isso, em verdade, nunca dá resultados positivos quase não tem importância.

Em dezembro de 2003, o Presidente George W. Bush (ou aqueles que escrevem seus discursos) proclamou, em mensagem à nação: “as câmaras de tortura e a polícia secreta desapareceram para sempre.” [p. 7]

Hoje, à sombra das lembranças de Abu Ghraib, encontramos prisões secretas mandadas pelo governo títere e muitos policiais controlando todas as cidades.

A tortura e o terror só trocaram de administrador.

http://www.mumia.org/freedom.now

Fonte: sítio da CUT (www.cut.org.br)