Programa eleitoral de cultura: superar dificuldades e aprofundar mudanças

O programa eleitoral de cultura para a reeleição do presidente Lula deve garantir a superação das dificuldades encontradas nesse primeiro governo, e o aprofundamento das mudanças. Para Juca Ferreira, secretário exec

Manoel Rangel, diretor da Agência Nacional de Cinema, que participou com Juca Ferreira, da discussão do tema "Pontos para um programa eleitoral de cultura: sintetizando reflexões", na mesa de encerramento das atividades do Seminário Nacional de Cultura e Desenvolvimento promovido pelo Instituto Maurício Grabois (IMG), em Brasília, neste final de semana, disse que "o programa de cultura para o próximo governo brasileiro deve partir dos avanços obtidos na estruturação da gestão do ministro Gilberto Gil".

O presidente do PCdoB, Renato Rabelo, que prestigiou o encerramento dos dois dias de discussão, no sábado (20), elogiou o trabalho realizado pelo MinC e reafirmou a idéia central discutida durante os dois dias do evento, de que a cultura deve fazer parte como eixo central do plano de desenvolvimento do País.

O evento, que recebeu o nome do ator Francisco Milani, reuniu artistas, gestores públicos e ativistas culturais ligados ao IMG "para dar seqüência à construção de uma corrente de opinião e atuação nos movimentos culturais e no meio artístico e cultural", explicou Adalberto Monteiro, presidente do IMG.

Carta de navegação

Juca Ferreira elogiou a iniciativa do IMG de propor a discussão sobre programa eleitoral. Ele considera "um esforço fundamental porque sem ele, a gente perde a carta de navegação", destacando o risco de ficar refém dos marqueteiros, "sem se diferenciar qualitativamente a ponto de representar elemento de transformação e mudança da realidade".

Ele fez uma avaliação da trajetória da cultura nesse governo, destacando os avanços e reconhecendo as limitações. Ao final, sugeriu "somar tudo para ser capaz de fazer programa não só que garanta Lula em um segundo mandato, mas que seja superação das dificuldades e a definição mais clara das tarefas do Estado, dentro das possibilidades reais".

Segundo ele, "hoje não há dúvidas que é necessário recompor o Estado brasileiro, recolocá-lo no cenário social com funções claras, insubstituível e intransferíveis". O modelo neoliberal, implantado pelos tucanos nos últimos 12 anos, foi duramente criticado pelos palestrantes.

Juca Ferreira também aponta para a necessidade de "discutir que tipo de desenvolvimento esse governo deve representar – se apenas desenvolvimento de aumento de circulação de mercadoria e de ampliação do parque industrial, ou desenvolvimento voltado para população brasileira, que garanta participação soberana do Brasil nos fóruns internacionais, que garanta construção de igualdade, de inclusão de parcela de brasileiros que até hoje não foram incorporados no desenvolvimento e que tem a ver com educação e cultura".

Tridimensional

Nenhum dos assessores de Gilberto Gil deixou de citá-lo ao destacar os avanços produzidos na área de cultura nessa gestão. Juca Ferreira lembrou a grande mudança realizada pelo MinC ao estabelecer a tridimensionalidade da cultura – trabalhada sob o ponto de vista simbólico, econômico e cidadão.

"A cultura é economia, que gera emprego e renda", destacou Juca, lembrando que "nenhuma nação sobreviverá no mundo globalizado se não for capaz de criar seus signos, sua própria imagem, que gera uma economia poderosa".

Para falar da cultura como direito de cidadania, Juca diz que depois que tomou conhecimento das poucas estatísticas que existe sobre cultura, ficou ainda mais radical. Ele cita como exemplos os dados de que menos de 8% dos brasileiros vão ao cinema; a tiragem de livros é de cinco mil para uma população de 200 milhões de habitantes. Para ele, "é um escândalo. O povo brasileiro tem enorme capacidade de produção cultural, mas não podemos aceitar que a cultura popular seja alternativa, o povo tem que ter direito a tudo, não aceitamos com esse "guetamento".

Juca também destacou a produção simbólica, "que é a mais tradicional – a substância do trabalho do Minc.

Duas frentes

Manoel Rangel, diretor da Agência Nacional de Cinema (Ancine), também fez avaliação do resultado da eleição do presidente Lula, destacando "a tensão permanente que esse governo viveu desde o primeiro momento e vive hoje entre o caminho de execução do programa efetivo das correntes que dirigem o Estado brasileiro e a ruptura com o programa anterior – 12 anos de aplicação do projeto neoliberal, que representou o desmanche do Estado e a inserção subordinada".

Para Rangel, um dos aspectos que deve ser considerado na construção do programa eleitoral de cultura é trabalhar com projeto que rompa os limites da cultura em direção a duas frentes operacionais do Estado brasileiro – educação e telecomunicações.

Ele lembra que a educação é o lugar institucional da disseminação da cultura, ponto de partida de sensibilização em larga escala. Por isso, propõe ocupar escolas e universidades como pólos de produção e difusão artística e cultural. "Promover o reencontro de educação e cultura no Brasil", afirmou.

A segunda frente de atuação deve ser na área da comunicação. Segundo Rangel "é preciso deixar de lado o raciocínio torto que se desenvolveu no Estado brasileiro das telecomunicação como infra-estrutura. Ela faz parte da circulação da cultura e produção de informação; é lugar de cultura, informação e entretenimento", explica ele.

"O que faz uma pessoa ficar parada em frente a TV não é o fato da imagem vir em ondas, por cabo de fibra ótica ou satélite. O que faz ela estar ali é o conteúdo, seja dramaturgia, informação ou entretenimento. É fundamental para esse conceito de política cultural, como alma de projeto de desenvolvimento nacional, romper o limite entre cultura e telecomunicação", enfatiza.

Ações práticas

Rangel falou longamente sobre as ações práticas que devem fazer parte do programa eleitoral de cultura, destacando a elaboração e aprovação do Plano Nacional de Cultura como diretriz do Estado brasileiro para o desenvolvimento cultural. "O Plano, que deve ser aprovado pelo Congresso Nacional, abre a possibilidade de ter uma força absolutamente transformadora e operação permanente – de pautar a estratégia do desenvolvimento cultural brasileiro nos próximos anos", avalia.

Outra grande luta do setor cultural, entre as ações enumeradas por Rangel como parte do programa eleitoral, é a questão do financiamento da cultura. O primeiro passo é a elevação para pelo menos 1% do orçamento da União para o setor da cultura. "Essa é uma batalha que tem sido conduzida já nesse governo como sinalização concreta para programa cultural para o próximo período".

Rangel citou ainda a necessidade de revisão das leis de incentivo à cultura, para fazer prevalecer a lógica pública, dentro da valoração e perspectiva de auto-sustentabilidade certos setores; criação de financiadora que permita alavancar a economia da cultura; construção de forte rede pública de rádio e TV no Brasil para romper a lógica monopolística dos meios de comunicação do Brasil e adoção de políticas setoriais – livro, cinema, artesanato, artes plásticas etc –, para criar política de difusão, além da mera produção, e se adequar no conjunto da cadeia econômica.

Para Rangel, "é preciso assumir controle nacional na esfera de distribuição de bens culturais para não viver a situação de gerar e produzir riqueza e não ter essas riquezas alimentando um ciclo de desenvolvimento de produção cultural no território nacional".

De Brasília

Márcia Xavier