Para líder da Revolução Cubana, luta pela paz no Brasil ''começou bem''

O trabalho do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Luta pela Paz) "está começando, mas começou bem", superando o "complexo das cidades-Estado". A opinião é de Orlando Fundora López, uma das lendas vivas da Revolu&

Fundora López já esteve várias vezes no Brasil ­ Rio de Janeiro, Porto Alegre, São Paulo ­ e lembra que em sua primeira visita esteve com Oscar Niemeyer.

Com 79 anos, Fundora é, com Fidel Castro, um dos fundadores do Movimento 26 de Julho, que iniciou a guerrilha na Sierra Maestra. Antes, dirigiu uma histórica greve geral dos bancários cubanos. Por seis vezes foi preso pela ditadura de Batista. Vitoriosa a Revolução, fundou também a Rádio Havana e a agência de notícias Prensa Latina. Hoje, percorre o planeta engajado na lula pela paz.
 
Depois do seminário, na quinta-feira (18), ele preside em Brasília uma reunião do Comité Executivo do CMP. "Vieram delegações importantes", diz ele, embora lamentando outras tantas ausências, que atribui a dificuldades nas comunicações. Fundora menciona em especial a intervenção do participante iraquiano.
 
"Eu conheço bem o Brasil"
 
"O trabalho do Cebrapaz é muito importante. Eu conheço bem o Brasil; o Brasil é como a Grécia, com as suas cidades-Estado. Tivemos no passado movimentos pela paz no Rio, depois em São Paulo, depois um bastante importante importante em Porto Alegre, mas nenhum logrou sair da sua cidade-Estado. Enquanto o Cebrapaz já tem várias filiais em muitos lugares", observa o militante cubano.
 
O entrevistador observa que o Cebrapaz, lançado em dezembro de 2004, está apenas começando. "Está começando, mas começou bem", responde Fundora. E elogia "o trabalho dos companheiros, sobretudo de Socorro Gomes, uma pessoa com muita força, convicção, profundidade ideológica (a deputada federal Socorro Gomes (PCdoB-PA) é a presidente do Cebrapaz)".
 
"O imperialismo se sente com mãos livres"
 
Fundora traça um cenário preocupante do cenário internacional. "Creio que a humanidade nunca esteve tão ameaçada e agredida pela guerra como agora. Em comparação com a chamada Guerra Fria, quando havia um mundo bipolar, naquele mundo vivíamos uma paz que era a paz do terror mundial. Ninguém queria aquilo; mas é indiscutível que naquele tempo o imperialismo norte-americano não podia fazer as coisas que está fazendo agora", comenta.
 
"Hoje o imperialismo se sente praticamente com as mãos livres. Os únicos pólos que poderiam frear um pouco a sua ação ­ a Comunidade Européia, o Japão um pouco ­ se associaram com o imperialismo", diz o militante cubano. Ele cita a tentativa americano-européia de impedir o ingresso de Cuba no novo Conselho de Direitos Humanos da ONU ­ derrotada, pois a Ilha teve os votos de 137 países, ou três quartos do total.
 
"A colaboração européia [com os EUA] é algo espalhafatoso. Se houvesse ali um Charles de Gaulle, um Daniel Mitterrand, um Willy Brandt, quem sabe a Europa não se entregaria como se entregou. Pode-se recordar o caso da Iugoslávia. Ele mostra que a Otan já não é mais, como se dizia, o escudo, mas a espada, que envia tropas", diz ainda.
 
Como seguir a rota das agressões

"Por isso eu creio que a humanidade nunca correu tantos riscos", avalia o veterano revolucionário. Ele aponta a lógica dos belicistas do século 21: "É muito fácil seguir o
itinerário das agressões:  basta acompanhar a rota do petróleo ­ do Afeganistão ao Iraque, ameaças à Síria e agora ao Irã", indica.
 
"O ato terrorista contra as torres gêmeas [no 11 de Setembro de 2001] foi uma coisa atroz, porém merece mais análise. Os milhares que morreram ali eram praticamente todos trabalhadores, muitos deles estrangeiros. Quando aquilo ocorreu, George W. Bush registrava o seu índice mais baixo de popularidade; logo, deixou o seu bunker, para dizer o quê? Que é preciso iniciar uma cruzada. O que mostra a sua cultura enciclopédica, mas é também a atitude de quem se declara o presidente da guerra. No dia seguinte, Fidel já dizia que o terrorismo não se combate com a guerra, o terrorismo não se combate com o terror", analisa Fundora.
 
Prepotência numa "guerra de erros"
 
"Jogaram a culpa em Osama Bin Laden, um velho amigo da família Bush. Atacaram o Afeganistão, um país em pedaços, devido à guerra, e que depois dos bombardeios foi convertido em pó. Eu pergunto: e se Bin Laden estivesse na França, ou na Inglaterra, o que fariam os EUA?", indaga o presidente do CMP.
 
"E o que surgiu daí?", prossegue. "Um governo que governa, quando muito, um pedaço de Kabul. O resto ficou com os senhores da guerra. O negócio da papoula [insumo da heroína] converteu o Afeganistão de novo no que sempre foi", conclui.
 
"Aí começaram as mentiras e calúnias contra o Iraque. Era preciso salvar o mundo de Saddam Houssein, esse assassino. Mas foi a Saddam Houssein que os EUA forneceram todas as armas do mundo, durante os oito anos da guerra contra o Irã", argumenta.
 
"Um dos erros desta guerra de erros veio da prepotência ianque. Pensavam que o povo ia ficar paralisado, paraplégico, não ia reagir. O problema é que Bush não conhece nada de nada, sobretudo de história", dispara Fundora, recordando episódios de resistência na Mesopotâmia, desde os tempos de Alexandre o Grande. "É mesmo uma incultura enciclopédica", ressalta, novamente sobre Bush.
 
Indagado sobre a legitimidade da resistência armada contra a ocupação do Iraque, o veterano revolucionário é enfático: "Todo indivíduo que luta pela independência está lutando pela paz. Nós não somos pacifistas, somos combatentes pela paz", assinala.
 
De Brasília,
Bernardo Joffily