Unificação dos movimentos é vital, diz François Houtart

Hugo Chávez, Evo Morales, Michelle Bachelet, Nestor Kirchner e Lula. O cenário eleitoral na América do Sul suscita muitos questionamentos sobre os rumos políticos do continente. As mobilizações como os levantes indígenas na Bolí

“A ascensão de partidos mais a esquerda ao poder cria um nome panorama, mas não muda as relações de forças sociais”, avalia o diretor do Centro Tricontinental (Cetri), que esteve em Recife (PE) para participar do II Fórum Social Brasileiro. Para ele, as experiências do PT e do partido sandinista na Nicarágua são o reflexo desse cenário. “Eles se transformaram em partidos eleitoreiros. Fizeram alianças complicadas e perderam o ideal revolucionário”, afirmou.

A solução para esse momento, em que os votos predominam sobre os objetivos dos partidos considerados de esquerda, seria trabalhar o campo político de forma plural e democrática. “Antes pensávamos em uma estrutura piramidal e autoritária, de apenas um partido. Mas hoje, para reconstruirmos o campo político precisamos de uma convergência das forças populares. Com a globalização, o sujeito histórico não é mais apenas o operário. Todos são afetados pela lei do capital e por instrumentos como a dívida externa: os camponeses, as mulheres, o ambiente”.

Houtart vê na articulação entre os movimentos sociais e os diversos partidos políticos o caminho necessário a ser seguido. “Temos que ver o campo político não só como algo a ser dominado, mas a sua diversidade. Podemos ter em cada partido uma parte do programa apresentado pelas forças sociais. Na Europa, por exemplo, temos o Partido Comunista, o Partido Socialista e o Partido Verde. Em cada um deles estão personalidades vinculadas a algum movimento de base”. Para ele, as passeatas contra a Organização Mundial do Comércio, que tiveram início em Seattle (1999) e chegaram a Hong Kong (2005), apontam para a unificação dessa resistência. “De maneira consciente, percebemos que temos todos o mesmo adversário. Agora precisamos de uma coerência entre todos os atores para construir coletivamente um projeto ético, que seja a referência da dignidade fundamental dos seres humanos”.

Pontos de vista –
Segundo Houtart, depois da última edição do Fórum Social Mundial, que ocorreu simultaneamente em Caracas (Venezuela) e em Bamako (Mali), há uma mudança na percepção da importância do campo político para as relações sociais. “Claro que temos a influência de um pensamento negativo frente à política, como ocorre com os zapatistas, no México. Esses movimentos acham que é possível mudar a sociedade sem tomar o poder. Essa perspectiva é falsa”, disse. Houtart cita o processo de erradicação do analfabetismo na Venezuela, que só foi possível a partir da iniciativa do governo.

“Se vissem o poder não como o único instrumento de mudanças, tudo bem. Toda a ação dos movimentos sociais é um fator importante de mudança também. Hoje, com a perspectiva da democracia representativa se embasar exclusivamente nas eleições, isso é compreensível. Mas não é possível dizer que o setor político não é importante para mudar a sociedade”, concluiu.