Água privatizada, cara e torneira vazia

Como já demonstrei em artigos anteriores, a sociedade capitalista e sua classe dominante, a burguesia, se apropria do alheio recorrendo a 3 expedientes básicos: a mais-valia, as privatizações e a corrupção pura e simples.

Como o estado é um instrumento de dominação da classe dominante, seu aparato legislativo, executivo e judiciário cuidou de “legalizar” a exploração do homem pelo próprio homem, através da mais-valia, como Marx bem demonstrou.

Ao invés de roubo, de exploração, a mais-valia é apresentanda como sinônimo de capacidade empreendedora e de eficiência gerencial da iniciativa privada. Nos Estados Unidos já legalizaram a corrupção, inclusive reconhecendo o lobista como “profissional de mercado”. E as privatizações, ou seja, a transferência de vultosos patrimônios públicos a preços aviltados para o controle privado tem sido o objeto de desejo de 10 entre 10 representantes da burguesia.

Para que a sociedade não exploda em manifestações de protesto quando esse saque é praticado contra as empresas públicas, a direita tem usado uma tática que até o presente tem se revelado eficiente: dificulta seus investimentos; estrangula sua capacidade gerencial; reduz sua lucratividade até chegar em balanços contábeis negativos e grandes prejuízos financeiros. A partir desse ponto, com a empresa desmoralizada e a sociedade “convencida” da incapacidade do poder público de gerir aquele patrimônio, a “eficiente” iniciativa privada – que a todo tempo quebra bancos e empresas – se candidata a receber essa “massa falida” para recupera-la, desde que seja por um preço simbólico.

Essa campanha estava sendo feita contra a Petrobras, no governo FHC, quando Lula se elegeu e pôs fim a mais esse bote contra o patrimônio público. É a mesma campanha que agora retoma com toda força e através de todos os grandes meios de comunicação.

E foi essa campanha que direita fez no Amazonas para privatizar a Companhia de Aguas e Saneamento do Amazonas (COSAMA), no período em que Fernando Henrique Cardoso (PSDB) era presidente e Amazonino Mendes (PFL) era governador.

O grau de desgaste da empresa (mau gestão, corrupção, ineficiência, etc.) era tamanho que eu fui o único deputado estadual com assento naquela legislatura (2000) a votar contra a privatização da COSAMA, ou “colama”, como jogosamente era tratada pela imprensa e mesmo pelos parlamentares da base do governo.

Um ano antes da privatização o governo do estado informou a Assembleia Legislativa que a COSAMA possuía um patrimônio de 480 milhões de reais. O governo, então, separou a empresa em “Cosama de Manaus”, potencialmente lucrativa e livre de qualquer passivo trabalhista, e “Cosama do Interior”, sabidamente deficitária e herdeira de um passivo trabalhista de 600 milhões de reais.

A “Cosama de Manaus”, saneada e potencialmente lucrativa, foi vendida para o grupo francês Lyonnaise des Eaux por 193 milhões de reais; a “Cosama do Interior”, sabidamente deficitária e com passivo trabalhista de 600 milhões, alem das dívidas, continuou com o Estado, o que naturalmente só agravou a situação dos cofres públicos. Alguém conhece uma forma de expropriação mais descarada do que essa?

O grupo Lyonnaise des Eaux se comprometia a fazer investimentos da ordem de 480 milhões de reais para universalizar o serviço de água e esgoto na cidade de Manaus. Posteriormente repassou ao grupo Suez. Atualmente a Cosama de Manaus se encontra sob o controle do grupo Saneamento Ambiental Aguas do Brasil S.A. que controla outras 10 concessões no Brasil, dentre as quais Niterói (RJ).

A Câmara Municipal de Manaus realizou uma CPI em 2005 para avaliar a venda e o cumprimento das metas e conclui que houve subavaliação do preço e que a empresa não cumpriu as metas de universalizar o fornecimento de agua e tratamento de esgoto e tampouco fez o investimento de 480 milhões que havia se comprometido por contrato.
Ganhou de presente a repactuação do contrato em 2007, na gestão do então prefeito Serafim Correa (PSB)

Os investimentos nunca foram feitos e tampouco a universalização do serviço, o que levou o Instituto Trata Brasil a afirmar que “o que nos espanta é saber que grandes cidades, que irão receber os jogos do Mundial, ainda não conseguem abastecer a sua população com água tratada 24 horas por dia. É o que acontece nas cidades de Manaus, Cuiabá e Recife: além da rede de água não chegar a todas as residências, o abastecimento ainda é feito de forma intermitente, o que obriga seus moradores a usar a água de forma controlada… parece até ironia que uma cidade da região amazônica, que concentra 20% da água doce do planeta, sofra justamente com a falta de água”.

Quem teve que enfrentar o problema foi o povo de Manaus, que desembolsou algo como 600 milhões de reais para criar um sistema moderno de abastecimento de água (Proama) buscando atenuar o problema, que ainda não está inteiramente resolvido. Os recursos vieram do governo federal, através de empréstimos, uma vez que a concessão é privada, o que veda o poder público de fazer investimento a fundo perdido. Até nisso a atitude de privatização foi criminosa.

Em 2013 o custo da água no Brasil oscilava entre 4,18 (Rio Grande do Sul) e 1,62 (Maranhão) reais/m³. O Amazonas, que privatizou Manaus no ano 2000 e detem a maior reserva de água doce no mundo, praticava o 2º preço mais caro do país (3,75/m³), evidenciando o fracasso e engodo da “eficiência privatista”, tão decantada para iludir os incautos e justificar o discurso dos vigaristas.

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