Quando dezembro passar

Dessas conversas que a gente ouve no elevador quase sem querer, no breve transcurso da garagem ao sétimo andar da Prefeitura:

– Ah! Dezembro é o mês que mais gosto.

– Pra mim é horrível.

– Por que, menina?

– Porque é só tristeza.

– Tristeza!? Diga isso não, que coisa! É Natal, minha filha, a gente sonha com todas as coisas boas que deseja pro ano que vem.

– Esse é o meu problema. Já não tenho mais com que sonhar.

Deu apenas para ver de relance que a pessimista tinha feições joviais, bonita nos seus prováveis quarenta anos, mas de olhar triste. A outra, entre vinte e vinte e cinco anos, irradiando entusiasmo. A porta do elevador se abriu para nossos afazeres, o diálogo entre as duas findou partido.

Entre um despacho e outro, e durante a primeira reunião do dia, aquelas palavras não saíram da mente, recorrentes: “Já não tenho mais com que sonhar”.

Como se pode renunciar aos desejos mais caros, assim tão jovem? Que sonhos terão se frustrado na curta vida daquela criatura? Será um momento, ou uma definitiva sentença de morte em vida? Por que tamanha infelicidade? Que será para ela, afinal, a felicidade?

Em meio a uma inquietude solidária e um vago desejo de reencontrá-la para, quem sabe, uma palavra de apoio e estímulo, a resposta parece surgir no belo poema A felicidade de Adalberto Monteiro:

E não dura uma tarde.

A felicidade às vezes está à nossa volta
E à procura dela,
Saímos pelo mundo dando voltas.

A felicidade talvez nem exista,
Talvez seja somente,
O nome de uma menina, de uma cidade.

A felicidade
É um trem que a gente espera, espera,
Ela atrasa, às vezes ela vem,
Às vezes nunca vem.

Não, moça triste, jamais renuncie ao sagrado ato de sonhar, nem condene todas as esperanças ao doloroso fracasso de um sonho. Quando esse seu melancólico dezembro passar, você verá que “a felicidade às vezes está à nossa volta”, como diz o poeta. E é preciso vivê-la.

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