Governo admite que reforma da Previdência tem menos de 100 votos hoje 

O Palácio do Planalto terá trabalho para aprovar a reforma da Previdência na Câmara dos Deputados. Nos bastidores, assessores do governo reconhecem que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) com as novas regras não tem nem cem votos sequer consolidados hoje. Como são necessários 308 votos favoráveis, a meta da gestão Jair Bolsonaro (PSL), segundo o jornal Valor Econômico, é conquistar o apoio de 360 parlamentares antes de pôr o texto para votação no plenário da Câmara.

Bolsonaro e Ônix

Isso garantiria margem grande de conforto, mas é considerado um sonho distante, já que contabilizaria apenas 19 defecções entre os partidos que não são de oposição. Nas contas do Palácio e da equipe econômica, haveria entre 180 e 200 deputados a favor da proposta: metade de votos firmes, que de fato apoiam o projeto, e a outra metade de votos que dependeriam de um “pacote de bondades”, como liberação de cargos e emendas. Como a oposição representa 130 votos, o governo precisaria ir atrás de cerca de 120 dos 180 “disponíveis”.

Nesta sexta-feira (22), o Painel da Folha relatou uma série de dificuldades no caminho do governo. Conforme a coluna, o primeiro aceno de Bolsonaro ao Congresso não adoçou líderes das legendas com as quais o presidente negocia.

Eles torceram o nariz para os termos que devem constar do decreto que vai nortear indicações para cargos públicos e dizem que o Planalto ainda trata a política como “patinho feio”. Reclamam que o governo diz combater o compadrio – mas, na prática, exerce o velho corporativismo. De acordo com deputados de partidos do Centrão, hoje as estruturas da Secretaria do Patrimônio da União e do Dnit nos estados estão tomadas por militares.

Para começar a melhorar a relação, a Casa Civil convocou assessores e secretários-executivos dos ministérios nesta quinta (21). Pauta: como melhorar as relações com o Congresso. Pediu-se que as pastas avisem quando houver viagens para redutos eleitorais de aliados. Os integrantes do Planalto também pediram para serem acionados quando sobrar assento em aviões da FAB, sinalizando que parlamentar preza por carona.

Mas os problemas não se resumem à relação cotidiana. Com líderes do Centrão pressionando por mudanças nas regras da seguridade dos militares, Bolsonaro sinalizou a parlamentares do PSL que poderá enviar o projeto em 15 dias, metade do tempo divulgado na quarta-feira. O calendário deve ser compartilhado numa reunião com os líderes partidários na terça-feira, a primeira para começar a vencer as resistências. Até agora, nenhum partido defendeu a proposta.

Na próxima semana, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, começará a receber os demais partidos para explicar o projeto. Ontem, foi a vez do PSL do presidente Bolsonaro. Na terça-feira, ele se encontrará com PR e PSDB. Depois do Carnaval, será a vez do próprio Bolsonaro receber as bancadas para reuniões, o que não ele não faz desde a época do governo de transição.

A reforma veio tão mais dura que o imaginado, e com uma base tão desarticulada, que parte dos deputados que pretendia ser relator já sinalizava ontem nos bastidores que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), poderia entregar a função de negociar as alterações para um parlamentar do PSL. Tudo para não ficar responsabilizado por uma eventual derrota.

No Planalto, o vice-presidente Hamilton Mourão já declarou acreditar que o governo teria 250 votos para a reforma. “Então, 60, 70 votos terão quer ser buscados”, contabilizou. A conta é considerada mais do que otimista por articuladores com vivência de Parlamento. “Não temos nem 100 votos”, admitiu uma fonte escalada para fazer a interlocução com deputados e senadores.

Líder do DEM, o deputado Elmar Nascimento (BA) disse que trabalhará contra as mudanças para os trabalhadores rurais e que o governo pode contabilizar até 400 votos no texto-base (o projeto principal), mas perderá nos pontos polêmicos quando eles forem votados por meio de destaques. “Convicto sobre a reforma eu sou, mas depende de qual reforma. Se não negociar direito vai sair desfigurada”, disse.

O líder do PR, deputado José Rocha (BA), reuniu-se com o ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil) na quarta-feira para relatar o grau de insatisfação dos deputados com o governo. O principal motivo era o início das demissões de aliados em cargos estaduais, principalmente no Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (Dnit).

Os sinais até agora são de que essa insatisfação vai se aprofundar: o governo pretende anunciar na semana que vem a criação de um “banco de talentos”, com o nome de técnicos credenciados para assumir cargos federais nos estados. Essa relação será apresentada aos parlamentares, que poderão indicar nomes para os respectivos cargos.

O governo quer agradar a base eleitoral de Bolsonaro, que cobra o fim do toma-lá-dá-cá, mas terá de simultaneamente lidar com o descontentamento de quem efetivamente vota. Segundo um dos articuladores governistas, a saída será intensificar o diálogo com líderes e dirigentes de partidos, prefeitos e governadores. Simultaneamente, o governo espera o apoio social, e a campanha favorável liderada pelos movimentos sociais de direita.

Para a oposição, o governo colocou as “maldades” como a redução no valor do benefício de prestação continuada (BPC) para idosos de baixa renda e mudanças na aposentadoria rural na proposta para fazer as concessões só em cima desses pontos e aprovar a parte central da reforma: idade mínima de aposentadoria, instituição de um regime de capitalização para os novos e transferir as regras da Constituição para lei complementar. A estratégia é não focar os ataques só nos pontos “sociais” para não ficar sem discurso quando as concessões ocorrerem.

Da Redação, com Folha de S.Paulo e Valor Econômico