Movimentos manifestam preocupação com novo presidente do Incra

Movimentos de luta pela democratização do acesso à terra, como o MST, manifestaram preocupração com a escolha do novo presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), escolhido pelo governo Bolsonaro, e esperam que ele atue em favor da reforma agrária. General que assume Funai era contratado de mineradora em conflito com indígenas no PA.

General no Incra - Foto: Agência Brasil

O general da reserva João Carlos Jesus Corrêa foi nomeado oficialmente nesta segunda-feira (11) para presidir o Incra. O anúncio havia sido feito pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) dois dias antes, pelas redes sociais.

O Incra, que antes estava ligado à Casa Civil, agora é subordinado ao Ministério da Agricultura, comandado por Tereza Cristina (DEM), conhecida liderança da bancada ruralista no Congresso Nacional. O órgão é responsável por realizar a reforma agrária, manter o cadastro nacional de imóveis rurais e administrar as terras públicas da União.

A nomeação foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União, na última sexta-feira (8). Ele já ocupou funções de comandante da 11ª Região Militar — sediada em Brasília — e de diretor de Controle de Efetivos e Movimentações do Exército. Em 2014, assumiu por curto período — e interinamente — o Comando Militar do Nordeste.

Jesus Corrêa é o oitavo general nomeado para postos estratégicos no governo. O presidente Jair Bolsonaro continua internado no hospital Albert Einstein, em São Paulo, onde se recupera de cirurgia há duas semanas.

Ao comentar a nomeação, o secretário especial de Assuntos Fundiários, Luiz Antônio Nabhan Garcia, disse que o novo presidente do Incra vai acabar com a “farra dos sem-terra” no órgão.

“Existe uma obrigatoriedade de mudar o Incra e tirar o seu viés ideológico e político, que tornou a instituição inviável”, disse Nabhan ao jornal O Estado de S. Paulo. “A farra dos sem-terra lá no Incra, pode ter certeza que acabou. Não haverá mais qualquer interferência do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) na instituição”, afirmou.

Em contrapartida, o MST e outros movimentos de luta pela democratização do acesso à terra manifestam preocupação com a escolha do novo presidente do Incra e esperam que ele atue em favor da reforma agrária.

"O general não precisa conversar. Ele precisa fazer. É isso que a gente espera. Se não avançar na reforma agrária, vai ser só mais um falastrão, como tantos outros que já passaram por essa cadeira. Se não fizer, o MST vai reagir com luta, como sempre”, disse Gilmar Mauro, dirigente nacional do MST, em entrevista à Rede Brasil Atual (RBA).

Mauro também afirmou que “foram os quase 400 anos de escravidão e mais de 500 anos de latifúndio” que criaram os sem-terra pelas sequelas da desigualdade social e do desemprego no campo. “Se ele [Jesus Corrêa], de fato, fizer a reforma agrária, não vamos precisar fazer ocupações de terras”, assegurou o dirigente em resposta às declarações do novo presidente do Incra sobre considerar como ilegal qualquer ocupação de terra no campo.

"Não gostamos de fazer lutas intensas no enfrentamento ao latifúndio, porque muitos morreram nessa batalha. Entretanto, foi a única linguagem que a classe dominante entendeu até hoje. Foi a única forma pela qual conseguimos o pouco de reforma agrária que existe no Brasil”, completou.

Povos indígenas

O general, de 64 anos, promete recusar o diálogo com entidades que não possuam identidade jurídica (CNPJ), como Organizações Não Governamentais (ONGs) e movimentos sociais. "A gente percebe esse jogo que está por trás, da dificuldade cada vez maior de reconhecer um direito constitucional”, analisa Ruben Siqueira, membro da coordenação nacional executiva da Comissão Pastoral da Terra (CPT), órgão ligado à Igreja Católica.

O governo Bolsonaro repassou para o Incra as atribuições relativas às demarcações de terras indígenas, que eram de responsabilidade da Fundação Nacional do Índio (Funai). "Não podemos esquecer, nós tivemos, não faz muito tempo, a militarização da questão agrária durante a ditadura. Significou a intimidação da luta pela terra e da luta pela defesa dos territórios indígenas”, afirmou Siqueira à RBA.

Segundo o representante da CPT, a militarização durante os anos de chumbo (1964-1985) também facilitou o acesso à terra pelas grandes empresas ligadas ao agronegócio. "Nos parece que a nomeação do general é uma atitude intimidatória e serve para refrear ou dificultar o acesso à terra e a defesa dos territórios indígenas, quando isso já está muito ruim".

Conforme recomendação do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão ligado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, o governo é solicitado a rever o conteúdo da Medida Provisória (MP) 870/19 e devolver à Funai as competências sob as terras tradicionalmente ocupadas por indígenas.