Na educação, Bolsonaro visa atender interesses de membros da campanha

Ensino à distância para crianças, “voucher” da mensalidade nas universidades e privatização do ensino são as propostas de Bolsonaro, mas não para melhorar a educação no país e sim para beneficiar membros do seu próximo governo. O primeiro beneficiado essas mudanças será seu assessor econômico, Paulo Guedes, que é dono da Bozano Investimentos, investidora de oito empresas de educação e depois o ‘conselheiro’ de Bolsonaro, Stavros Xanthopoylos, que é o manda-chuva do ensino a distância.

Bolsonaro e Stavros Xanthopoylos - Reprodução

As propostas do presidente eleito Jair Bolsonaro têm sido duramente criticadas por especialistas e por entidades ligadas à área. Uma delas é criar a educação à distância para crianças a partir de seis anos como forma de “baratear o ensino no Brasil”, conforme disse o então presidenciável em evento no dia 7 de agosto. Neste mesmo dia, Bolsonaro afirmou que o ensino à distância também iria “combater o marxismo”.

No entanto, em locais onde a EaD é financiada pelo governo, como em alguns estados americanos, dados apontam que o modelo remoto não é necessariamente mais barato.

Estudo publicado pelo Centro Nacional de Política de Educação (NEPC), da Universidade do Colorado, mostra que, em 11 de 16 estados americanos, as escolas virtuais demandavam praticamente o mesmo volume de recursos das escolas físicas. A redução de custo, quando ocorria, era entre 5% e 8%.

Allan Kenji, pesquisador da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), criticou a proposta em entrevista à Folha de S. Paulo e disse que tirar a criança do contexto escolar para ensinar por métodos remotos vai deixar lacunas. "A escola não é só informação. O professor acompanha o desenvolvimento das crianças e faz um conjunto de mediações como figura referencial para elas", afirmou.

Além disso, Kenji apontou dificuldades na implementação do modelo porque o ensino a distância com crianças pressupõe ter um adulto em casa cuidando do menor, o que impactaria a força de trabalho no país.

O uso de vouchers nas universidades e para o ensino fundamental, de crianças acima de seis anos, funciona como uma bolsa para famílias de baixa renda escolherem a escola de seus filhos.

Porém, esse modelo já foi utilizado no Chile nos anos 80 e não funcionou, conforme explicou Julia Dietrich, especialista em educação da Universidade Federal do ABC.
"Não deu certo. Dentre as famílias mais pobres, as que tinham condição financeira um pouco mais favoráveis escolhiam as escolas melhores. O resto ficou com escolas de formação duvidosa, exatamente o que se critica no Fies", disse Dietrich.

Especialistas reiteram que o valor recebido por cada aluno seria insuficiente para custear sua graduação, a intenção era que o estudante recebesse cerca de R$ 800. Todavia, hoje o gasto por aluno no ensino superior gira em torno de R$ 9.700 ao ano.

Beneficiamento de membros da equipe

Além disso, a política de vouchers e o ensino a distância atende a interesses de membros da campanha de Bolsonaro que estão diretamente ligados ao segmento da educação. Isso significa que os modelos defendidos irão beneficiar os futuros integrantes do governo.

O mais conhecido deles é Paulos Guedes, seu “posto Ipiranga”. Guedes é investidor assíduo do setor educacional, principalmente do ensino a distância. Ele é dono da Bozano Investimentos, que atualmente tem oito empresas de educação investidas no portfólio de private equity e venture capital (que aplicam em empresas que captam recursos para expandir e eventualmente chegar à Bolsa).

Entre as investidas da Bozano estão uma empresa chamada Wide, que oferece soluções de EaD para companhias de educação, e a QMágico, uma plataforma online que conecta estudantes a professores. Dessa forma, ampliar o ensino a distância seria ampliar e melhorar os investimentos de Guedes.

Outro beneficiado com as propostas é Stavros Xanthopoylos, conselheiro de Bolsonaro na área de educação e cotado para comandar a pasta. Xanthopoylos passou parte de sua carreira na defesa do segmento de ensino a distância e hoje é diretor da Abed (Associação Brasileira de Educação a Distância), entidade que reúne empresas com atuação na área.

Escolas particulares oferecem "ajuda"

Nesta segunda (29), representante das escolas de ensino privado oferecem a Bolsonaro ajuda para montar programa.

A Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep) enviou ofício ao presidente eleito sugerindo participação do setor na montagem do programa de governo para a educação.