Brasil: o caldeirão da política na apolítica.

O resultado político em termos de representação na eleição 2018 demonstra o quanto o momento é acintoso. Personagens políticos que turvam noções de realidade e afrontam o senso de responsabilidade, inteligência e coexistência com a democracia, são majoritariamente os vencedores em nível de legislativo e executivo, incluindo a presidência.

Por André Lemos*

democracia x ditadura

No horizonte institucional, a plataforma da jurisdição é de normatização, os beligerantes vitoriosos buscam publicitar moderação e a oposição analisa o rearranjo da resistência. Neste meandro o centro político esgarçou-se, a centro-esquerda busca furar a “bolha” institucional e a direita plaina em/com sua extremidade.

A história demonstra o quanto o poder é dominado pelo capital, e quanto mais financeirizado mais avesso à democracia, motivo pelo o qual a dimensão do pessimismo em um sistema político justo é crescente. E o que torna a análise dialética ainda mais exigida, pois é através dela que é possível não só enxergar, mas atuar sobre as contradições.

O perfil do voto pode ser a primeira das contradições a se ressaltar, foram 30% de abstenções no segundo turno, e embora o apoliticismo e o antipetismo estejam no entorno do espírito do eleitorado, existe também o caráter crítico e o descrédito ao que parte deste eleitorado considerou uma falsa realidade, demonstrando entre outros fatores uma crise de representatividade.

Este quadro foi fortemente influenciado pela mídia hegemônica, entre outros mecanismos dos consórcios financeiros, que moldaram mentes e corações com o objetivo de cercear a soberania nacional, a integração latino-americana, o bloco econômico dos emergentes e a consciência coletiva da luta por uma sociedade justa.

A inversão entre oposição e situação ocorre com o golpe-2016, porém arregimentado e legitimado em 2018. E por não ser uma zona de conforto onde tudo é estático e inerte pesará a capacidade administrativa, o controle dos conflitos de interesses e a manutenção da mentira (no âmbito da pós-verdade) em confronto com o quadro social de direitos degradados.

No, outro lado, a pauta do campo democrático almejando o desenvolvimento econômico e social propõe-se estar em movimento e tem como entes políticos prioritários a recomposição político-partidária de oposição, a unidade dos movimentos sociais, a organização do diálogo e do debate, e o combate à manipulação midiática e do fake news.

Sendo a síntese do diverso a maioria, a governança futura não representa nem o diverso e nem a maioria. O momento é de aprofundar nos trabalhos com a realidade concreta, e empunhar a convicção por transformação desde já, sendo ela na luta das massas, nas ideias e na institucionalidade com o princípio que a autocrítica é e sempre será necessária.

A tão falada “bolha” política precisa ser reconhecida, e começa com a entendimento que muitos discursos que falam para dentro, ao público parecem falsas polêmicas, mistifica a política, e possui uma linguagem que mais confunde do que contribui. Seus frutos, e dialeticamente suas raízes, são o hegemonismo, o exclusivismo e o pragmatismo exacerbado.

É crucial ir para as ruas, conversar no trabalho, na escola, no bairro, dialogar com a cultura popular sem a sombra dos vícios criados pelas bolhas. Reconectar com a aura crítica no seio da população, tratar de como funciona a sociedade, o neoliberalismo, e o espólio que o povo e o Brasil estão sofrendo. E sim, é possível uma realidade e dias melhores, já houve experiências.


*André Lemos é cientista social especializado em economia do trabalho e sindicalismo; e em sociologia política e cultura.

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