Bolsonaro é visto como ameaça a protagonismo das mulheres pobres

O movimento Mulheres Unidas contra Jair Bolsonaro vem denunciando ao Brasil que o candidato do PSL à presidência da República representa o aprofundamento das desigualdades contra as mulheres. As mulheres mais pobres são historicamente as principais vítimas desse cenário. Pesquisa DataFolha de 20 de setembro constatou que o pior desempenho de Bolsonaro (PSL) se dá justamente entre mulheres da periferia, público que representa 28% do eleitorado.

Por Railídia Carvalho

Bolsonaro e Mourão - Reprodução

A pesquisa do Datafolha divulgou que é de 14% o percentual de mulheres que ganham até dois salários mínimos que vai votar em Bolsonaro. Entre as mulheres que ganham mais de cinco salários mínimos a intenção de voto sobre para 32%. Quando se mede o voto dos homens o percentual é de 36%.

“Ao contrário dos homens que se identificam com esse discurso da cultura machista, as mulheres não aceitam essa violência. Sabem que ela vai atingir o pobre e o preto", declarou ao Portal Vermelho Lucileide Mafra, presidenta da Federação das Trabalhadoras Domésticas da Região Amazônica.

Na opinião da sindicalista, esse segmento sentiu na pele o período que a vida mudou e a mulher mais pobre foi valorizada por políticas públicas como o Bolsa Família e os programas de distribuição de renda. "Elas parecem que acordaram e viram que Bolsonaro será continuidade de Michel Temer e é ameaça a esses programas que as beneficiaram”, explicou.

Bolsonaro é vinculado a Temer

Lucileide contou que está cursando faculdade e vê que houve uma diminuição do discurso da corrupção do PT à medida em que as pessoas foram perdendo os benefícios conseguidos nos governos de Lula e Dilma.

“O filho da trabalhadora doméstica que estava na faculdade ou da lavadeira vê o Brasil caminhar para um retrocesso. Antes só o filho do rico podia estar na universidade e é isso que Bolsonaro que trazer de volta. Ele votou com Temer em tudo, essa mãe sabe que ele é um ameaça à melhoria de vida do filho ou da filha”, completou a sindicalista.

Bolsonaro votou contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 66/2012, conhecida como a PEC das domésticas que ampliou direitos da classe trabalhadora, prevendo direito a seguro-desemprego, jornada de 8 horas e direito a FGTS, entre outros benefícios. Na ocasião da votação,  usou o argumento de que haveria demissão em massa das domésticas já que os patrões não poderia arcar com os direitos. "Argumento dos patrões que acham que a doméstica é de segunda classe e tem que ser explorada", criticou Lucileide.

Mulheres com voz própria

“Passamos dois anos reclamando da situação que o país está agora e não podemos aceitar um candidato que defende um programa para um pequeno grupo. Mais que isso, ele defende o massacre das mulheres mais pobres, assalariadas. Quando vota a favor da reforma trabalhista, a favor do congelamento dos recursos da saúde e da educação e dos cortes nos programas sociais está prejudicando essa mulher. Isso tem que contar na hora do voto”, enfatizou a dirigente.

A jornalista Eliane Brum em artigo publicado dia 24 de setembro no El País afirmou que essa rejeição das mulheres a Bolsonaro pode representar uma “força emergente” nas relações de poder no ambiente doméstico. “Como repórter que escuta gente há 30 anos, nunca escutei tantas mulheres discordarem de seus maridos, nas entrevistas que faço com famílias, como hoje. Inclusive no voto”.

Ela atribui essa mudança – ainda que não total – ao “crescimento do protagonismo das mulheres" também na esfera doméstica. Segundo Eliane, essa nova condição das mulheres é resultado de políticas como o Bolsa Família e o aumento real do salário mínimo, que trouxe benefícios a um grande número de trabalhadoras domésticas.

Mulher negra: voto decisivo

Outro dado destacado pela jornalista é o quanto é estratégico o voto da mulher negra nas eleições deste ano. Ela lembrou que a maior rejeição de Bolsonaro é entre as mais pobres. “Como as estatísticas mostram, a maioria das mulheres mais pobres do país é negra”.

“As mulheres que foram para a universidade pela primeira vez, as mulheres que passaram a ganhar um pouco mais, as mulheres que pela primeira vez tiveram direitos trabalhistas igualitários, como as domésticas. Talvez não seja coincidência que a criadora da página “Mulheres Unidas Contra Bolsonaro”, que por conta das ameaças hoje é citada apenas pelas iniciais, seja negra”, completou Eliane.

De acordo com ela, o voto da mulher negra aparecer como um voto decisivo não é um dado qualquer. “Há grande poder e significado nessa constatação. É bastante simbólico que seja esta a força que toda a repressão dos últimos anos do país, todos os direitos a menos, não conseguiu parar”.