Trump corta verba à ONU destinada a alunos palestinos

Donald Trump cancelou fundos destinados à UNRWA, agência da ONU para refugiados palestinos forçados a abandonarem seus lares após a tomada de território por Israel; manobra pretende pressionar Estado palestino

Trump contra refugiados palestinos - Carlos Latuff

O calendário escolar começou na quarta-feira (29) nos 700 colégios da UNRWA, a agência da ONU aos refugiados palestinos, apesar da ameaça de corte financeiro dos Estados Unidos, segundo informa o El País. Os 500 mil alunos que têm aula em Gaza e na Cisjordânia e nos países da diáspora só tinham garantida a continuidade das aulas até o fim de agosto. A Administração do presidente Donald Trump cancelou todas suas contribuições à UNRWA, como confirmou na sexta-feira (31) o Departamento de Estado, com o objetivo de pressionar o Estado da Palestina diplomaticamente e enfraquecer a sua resistência à crescente ofensiva de Israel sobre Jerusalém e em Gaza.

Em Gaza os estudantes não receberão o material escolar que oito em cada dez famílias não podem pagar. Para reduzir o orçamento devido a falta de investimento, a agência da ONU instaurou pela primeira vez três turnos diários de aulas. Após cortar em janeiro um sexto de sua contribuição anual de 350 milhões de dólares (1,42 bilhão de reais), os EUA decidiram suprimir a entrega do restante dos fundos, que significam um terço do orçamento com o qual a UNRWA oferece serviços de educação, saúde e sociais a mais de cinco milhões de refugiados palestinos. 

A UNRWA foi criada pelas Nações Unidas após a guerra entre países árabes e Israel, que venceu e expulsou milhares de famílias palestinas das terras ocupadas, forçando-as a abandonarem seus lares e tornarem-se refugiados. Esse episódio ficou conhecido pelos palestinos e seus descendentes como "Nakba" ("Catástrofe"), e para Israel representou a fundação de seu Estado. Até hoje os sobreviventes desse deslocamento maciço e seus descendentes lutam pelo seu direito ao retorno.

O retorno de mais de cinco milhões de refugiados palestinos ao território hoje anexado por Israel representaria uma guinada demográfica para Estado judeu, o que significaria também alternância das forças políticas dentro de um Estado que se diz étnico, e não plurinacional. Por essa razão, os governantes israelenses se negaram historicamente a aceitar o direito de retorno, um obstáculo para as negociações de paz.

A decisão de cancelar os fundos à UNRWA foi adotada em agosto pelo conselheiro especial e genro do presidente, Jared Kushner, responsável pelo chamado plano de paz de Trump ao Oriente Médio, e o secretário de Estado, Mike Pompeo. Durante seu mandato, Trump vem dando sinais claros de seu apoio ao governo sionista israelense; além disso, os EUA são aliados históricos de Israel, que possui um forte lobby no Pentágono. 

O corte de verbas para a UNRWA não é o primeira- e provavelmente nem a última- das ofensivas de Washington contra a Palestina para beneficiar Israel. No começo desse ano, Trump reconheceu Jerusalém como capital israelense, ainda que a decisão seja ilegal segundo as resoluções da ONU, uma vez que o estatuto da Cidade Santa não pode mudar sem uma negociação entre Israel e Palestina. 

A estratégia dos EUA é pressionar a Palestina para que esta anule seu boicote aos contatos com os mediadores norte-americanos, decisão tomada pelo líder Mahmoud Abbas após a decisão de Trump sobre Jerusalém, por motivos óbvios: os EUA tem lado, e estão do lado de Israel. Portanto, não podem mediar um acordo de paz na região.

O buraco é ainda mais fundo. Além do lobby israelense, para os EUA é interessante ficar ao lado de Israel contra o crescimento de outra potência no Oriente Médio: o Irã, aliado estratégico da Rússia. Washington não quer perder sua influência no Oriente Médio, região rica em petróleo.