Oren Ben-Dor: “Quem são os verdadeiros terroristas no Oriente Médio?”

O que exatamente está sendo defendido? Os cidadãos de Israel ou a natureza do estado Israelense? Artigo de Oren Ben-Dor, professor israelense Filosofia do Direito e Filosofia Política na Universidade de Southampton, Reino Unido

Enquanto seus cidadãos estão sendo mortos, Israel, mais uma vez, está causando mortes e destruição no Líbano. Israel tenta retratar este horror como necessário para sua autodefesa. De fato, pode ser que um observador qualquer veja os foguetes lançados nas cidades israelenses como Haifa e minha cidade natal, Nahariya, como justificativa deste argumento.


 


Enquanto os estados devem defender seus cidadãos, os estados que não cumprem este dever devem ser questionados e, se necessário, reformulados. Israel é um estado que, ao invés de defender seus cidadãos, coloca todos eles, judeus e não judeus, em perigo.


 


O que exatamente está sendo defendido pela violência em Gaza e no Líbano? Os cidadãos de Israel ou a natureza do estado israelense? Eu sugiro que seja o último. O estado de Israel é baseado em uma ideologia injusta que causa a perda da dignidade e o sofrimento daqueles que são classificados como não judeus por meio de critérios religiosos ou étnicos. Para esconder esta imoralidade original, Israel promove uma imagem de vítima. Provocar a violência, consciente ou inconscientemente, contra aqueles dos quais se deve defender é uma característica crucial da mentalidade de vítima. Ao perpetuar este ciclo trágico, Israel é um estado terrorista como nenhum outro.


 


Muitos dos que tentam esconder a imoralidade do estado israelense, o fazem desviando a atenção dos horrores da ocupação pós-1967 e falando sobre uma solução possível com a criação de dois estados, já que o apoio a um estado Palestino significa implicitamente o apoio à ideologia que existe por trás de um estado Judeu.


 


A própria criação de Israel dependeu de um ato de terrorismo. Em 1948, a maioria da população nativa não judia foi etnicamente varrida do território palestino que se tornou Israel. Esta ação foi planejada cuidadosamente. Sem ela, um estado com uma maioria e um caráter judeu jamais seria possível. Desde 1948, os “árabes israelenses”, os palestinos que evitaram serem expulsos, têm sofrido uma discriminação contínua. De fato, muitos foram deslocados internamente, aparentemente por “razões de segurança” mas, na realidade, para que judeus pudessem adquirir suas terras.


 


Evidentemente, a memória do Holocausto e o anseio judeu pela Eretz Israel não seriam suficientes para justificar a limpeza étnica e a etnocracia. Para evitar a desestabilização que resultaria de um questionamento ético, o estado de Israel deve esconder o problema central, alimentando a mentalidade de vítima entre os judeus israelenses.


 


Para sustentar esta mentalidade e para preservar uma impressão de vítima entre os estrangeiros, Israel deve criar as condições para a violência. Sempre que a possibilidade de violência contra ele diminui, Israel deve fazer o possível para regenerá-la: o mito de que é uma vítima em busca da paz que não possui “um parceiro pela paz”, é o fator chave para Israel esconder sua imoralidade original e continuada.


 


A bem sucedida campanha de Israel para silenciar as críticas em relação ao desalojamento inicial e contínuo dos palestinos nativos, faz com que eles não tenham nenhuma opção senão recorrer à resistência violenta. No rastro da eleição do Hamas – o único partido que, na opinião dos palestinos, ainda não desistiu de sua causa – a população palestina de Gaza e da Cisjordânia foi sujeita à uma campanha israelense de fome, humilhação e violência.


 


A falsa “retirada” de Gaza, e seu subseqüente bloqueio, propiciaram uma série de atos de violência que, até agora, incluem o lançamento de foguetes Kasem pelos palestinos, a captura de um soldado israelense e a quase reocupação israelense de Gaza. O que testemunhamos é mais ódio, mais violência pelos palestinos, mais humilhação e punição coletiva pelos israelenses – tudo isso reforços úteis para a mentalidade de vítima israelense e o status de vaca sagrada do estado de Israel.


 


A verdade é que, por meios eticamente aceitáveis, a divisão da Palestina jamais poderia ter ocorrido. O estado de Israel foi criado com terrorismo e precisa do terrorismo para encobrir sua imoralidade fundamental. Sempre que existe um vislumbre de estabilidade, o estado ordena um assassinato planejado, como o que ocorreu em Sidon e que antecedeu a atual crise do Líbano, sabendo muito bem que isso não traz segurança, mas apenas mais violência. A unilateralidade de Israel e o ciclo de violência alimentam um ao outro.


 


Entre a violência e, apesar do discurso convencional que esconde a raiz desta violência, a realidade nos faz parar para pensar. Quanto mais nós silenciarmos sua voz, mais violentamente a realidade deverá falar.


 


Em hebreu, a palavra “elem” (um silêncio estupefato que resulta da opressão ou do choque) é etimologicamente ligada à palavra “almut” (violência). O silêncio em relação à imoralidade original do estado de Israel, faz com que sejamos todos cúmplices na reprodução do terrorismo que ameaça tornar-se uma catástrofe que poderá destruir o mundo.