García promete ao Peru educação de qualidade; vai cumprir?

De Lima, Janina Moquillaza Sánchez*
O novo presidente do Peru, Alan García, assume pela segunda vez a presidência do país, e em seu discurso de posse já apresenta projetos de lei e decretos de emergência com o poder de, neste momento de grande insatisf

Em sua fala, por duas vezes o presidente prometeu em cinco anos acabar com o analfabetismo e melhorar a qualidade do ensino nas escolas públicas.  A idéia de que o Peru precisa investir mais em educação é um pensamento obrigatório, desde que em 2001 o PISA – Programm for International Student Assessment localizou o país em último lugar, o 41º de 41 países participantes nos exames de leitura e matemática realizados pela Unesco e a OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico: cinqüenta e quatro por cento dos que fizeram a prova não entenderam o que leram, e nenhum compreendeu tudo.



Com relação à educação de qualidade, neste país o critério para reflexão é basicamente quantitativo.  Qualidade é uma medida de produção que se refere a quantos produzem, quanto produzem, em quanto tempo e a qual custo; embora etimologicamente a palavra, de origem latina, signifique “de consideração social, civil e política”.



O ministro hoje nomeado, doutor em Educação, José Antonio Chang, é engenheiro industrial, como a maioria dos diretores de instituições educativas peruanas, reitor da Universidade particular San Martin de Porres e gerente central de desenvolvimento do Banco de la Nación. É acusado de ter vínculos com Oscar López Meneses, colaborador de Vladimiro Montesino, o mais cruel e corrupto ministro de Fujimori. 


 
Há anos a educação pública peruana gira em círculos; não se desenvolve, não evolui, não faz reflexões sobre os novos requisitos da globalização, da comunicação midiática, da gestão de conhecimentos.  Ignora os apelos e o sofrimento de pais e professores, os novos modelos de família, novos tipos de crimes, o elevado número de suicídios de crianças e adolescentes, a gravidez precoce, o tráfico de drogas nas escolas, o abuso sexual e moral por parte de professores que continuam na sala de aula após as denúncias dos alunos, o abuso de poder, nepotismo e autoritarismo dos diretores de instituições.



A educação de qualidade requer uma cultura de cidadania que a sustente.  O surgimento e a manutenção desse novo tipo de cultura, dependem fundamentalmente de investimento real na formação de pesquisadores que reflexionem sobre a realidade da educação, com pós-graduação strictu-sensu, condição acadêmica muito rara neste país. 



A produção científica de pós-graduação em educação nas universidades públicas peruanas se encontra quase que 100% paralisada há muitos anos. Tomemos como amostra a Universidade Nacional Mayor de San Marcos, de maior prestígio local e a mais antiga da América, fundada em 1551: em 2005, ela registrou dez defesas de mestrado, nenhuma de doutorado; em 2004, cinco de mestrado e nenhuma de doutorado; em 2003 cinco de mestrado e nenhuma de doutorado; em 2002 oito de mestrado e uma de doutorado; em 2001, quatro de mestrado, nenhuma de doutorado; e em 2000, duas de mestrado e uma de doutorado.  Por que não defenderam suas teses os demais, trinta a quarenta alunos que pagam com seus próprios recursos a mensalidade da universidade? Considerando o paradoxo, perguntei a um diretor da instituição como explicava o fenômeno e se teria uma solução.  Sua resposta foi:  “Isso é problema deles.”



Analisando algumas teses e projetos de pesquisa (todas pelo método quantitativo estatístico) do curso de pós-graduação dessa instituição, em nenhuma se encontra justamente o que faz uma educação de qualidade: a reflexão sobre o processo educacional sócio-político-econômico-cultural. Não se valoriza o discurso crítico, o argumento cidadão com preocupação democrática, não se faz pesquisa etnográfica: estudam-se realidades imaginadas.



 O mundo latinoamericano mudou muito. Mudou o perfil sociológico do desempenho da instituição universitária, como demonstra a qualidade dos cursos de pós-graduação do Brasil e do México.  No Peru, os intelectuais trabalham para fundações estrangeiras, principalmente americanas, ONGs, bancos e organismos internacionais. Eles não estão nas escolas nem nas universidades públicas, mas nas particulares. Publicam artigos no exterior e vendem livros envoltos em papel celofane nas elegantes e caras livrarias de Lima.  Há portanto uma importante lacuna de generosidade, colaboração, compreensão, humanidade, desafio a preencher para transformar a educação peruana em uma de qualidade e de inclusão.



* Doutora em educação, Universidade de San Marcos