Corte Suprema americana anula tribunais criados por Bush

Numa veemente censura às táticas adotadas pelo presidente George W. Bush, a Suprema Corte dos Estados Unidos determinou nesta quinta-feira que é ilegal o sistema de tribunais militares montado para julgar os prisioneiros de Guantâ

"Concluímos que a comissão militar reunida para julgar (Salim Ahmed) Hamdan não tem poder para prosseguir porque sua estrutura e seus procedimentos violam" o acordo internacional a respeito do tratamento de prisioneiros de guerra, assim como o Código Uniforme de Justiça Militar, escreveu o juiz Paul Stevens em nome da maioria da corte.

A decisão é um claro revés para a administração Bush, e foi emitida no caso impetrado por Hamdan, que era o suposto motorista de Osama bin Laden no Afeganistão. Hamdan é um dos 450 suspeitos estrangeiros de terrorismo detidos ilegalmente na ilegal base naval norte-americana de Guantânamo, em Cuba, e foi seqüestrado em novembro de 2001.

Na Casa Branca, Bush disse que ainda não havia lido a decisão toda e que consultaria o Congresso para dar a autoridade adequada aos tribunais militares. "Levamos as conclusões a sério", evadiu-se.

A decisão, tomada no último dia do mandato da Corte, ocorreu depois das mortes de três prisioneiros de Guantânamo, este mês, e da crescente pressão doméstica e internacional sobre Bush para que ele acabe com o campo de prisioneiros.

Um dos advogados de Hamdan, o tenente-comandante Charles Swift, elogiou a decisão do tribunal. "Só queremos um julgamento justo", disse ele diante da Suprema Corte. "Sim, é uma censura ao processo."

Anthony Romero, da União Americana de Liberdades Civis, disse que "a Corte Suprema deixou claro que o braço executivo não tem um cheque em branco na sua 'guerra contra o terror', e não pode atropelar o sistema legal da nação."

Stevens, 86, o juiz que há mais tempo está na corte e um oposicionista do governo atual, disse que as comissões militares não foram expressamente autorizadas por nenhum ato do Congresso. Mas, ao ler parte da decisão, ele disse que Bush pode pedir aos parlamentares a autoridade necessária.

Em seu texto de 73 páginas, Stevens afirma que "as regras especificadas para o julgamento de Hamdan são ilegais". Segundo ele, o sistema precisa incorporar "as proteções judiciais mais básicas que já foram reconhecidas pelas leis internacionais". Uma dessas proteções é o direito de o réu estar presente durante os procedimentos.

Votaram junto com Stevens os outros juízes que são oposição moderada às práticas neoconservadoras americanas, David Souter, Ruth Bader Ginsburg e Stephen Breyer, além do conservador Anthony Kennedy.

Os direitistas pró-republicanos — os juízes Antonin Scalia, Clarence Thomas e Samuel Alito, nomeado por Bush — votaram contra. O nono integrante do tribunal, o juiz John Roberts, também nomeado por Bush, não votou por ter participado de um painel que já tratou do caso de Hamdan antes.

Decisão favorece Estado de direito

A decisão da Corte Suprema americana de invalidar o julgamento de um prisioneiro no campo de concentração da base ilegal de Guantânamo é uma “vitória para o Estado de direito e os direitos humanos”, expressou nesta quinta-feira a Anistia Internacional.

"O presidente Bush deveria adotar a decisão como ponto de partida para harmonizar suas políticas de detenções na ‘guerra contra o terrorismo’ com a legislação americana e internacional”, declarou a organização.

Marco legal

A decisão, considerada pela Anistia como um marco na Justiça do país, beneficia o suposto motorista de Osama bin Laden, Salim Ahmed Hamdan, que pedia a anulação de seu julgamento.

Em nota, a Anistia Internacional pediu que a atual administração cancele os julgamentos já agendados, abandone a rotina de detenções secretas e feche o campo de concentração da base militar ilegal situada em Cuba.

“A administração americana deve fazer com que todos os detentos de Guantânamo sejam libertados ou trazidos a julgamento em tribunais civis nos Estados Unidos”, exigiu o pesquisador da organização de direitos humanos Rob Freer.